Contrariando Luís Aguiar-Conraria, porque ganha o PS?
Por má-fé ou puro viés ideológico, muitos recusam ver os méritos da governação dos últimos anos. Felizmente, a generalidade dos eleitores não sofre desses males
Por má-fé ou puro viés ideológico, muitos recusam ver os méritos da governação dos últimos anos. Felizmente, a generalidade dos eleitores não sofre desses males
Mestre em Guerra da Informação pela Academia Militar e especialista em Gestão de Crise Mediática
Num curioso artigo de opinião, Luís Aguiar-Conraria questiona como é possível o PS ser o partido político com maiores probabilidades de ganhar as próximas eleições legislativas. Na sua análise a essa pergunta académica, encontra uma explicação muito simples: a crise generalizada é uma criação mediática!
Como os “eleitores votam com a barriga e não há governo que resista a um grande apertar de cinto”, logo, se o PS (que governa) resiste, é porque não houve apertar de cinto. Mais um pouco e a crise não passou de “fake news”.
A análise de duas variáveis em específico - a habitação e a inflação - levam o autor a concluir que o eleitorado “com medo do futuro prefere manter o Governo que lhe tem garantido o conforto de uma situação financeira estável”. Confesso que sou leitor assíduo e aprecio muito o estilo de Luís Aguiar-Conraria, mas este artigo merece contestação.
Logo à partida porque ignora em absoluto - tal como o ignoram um conjunto de comentadores e do eleitorado do espectro político-ideológico mais à direita - qualquer mérito da governação do PS nos últimos anos. Sucede que essa governação teve o mérito de atuar de forma incisiva em vários setores que muito impactam a vida das pessoas e em momentos determinantes da evolução da economia nacional, aqui se recordando apenas alguns:
• Redução temporária do Imposto sobre Produtos Petrolíferos e Energéticos (ISP) para compensar receita de IVA;
• Redução do IVA da eletricidade de 13% para 6% no primeiro escalão de consumo;
• Apoio extraordinário aos beneficiários da tarifa social da energia;
• Apoio às indústrias intensivas em gás;
• Permissão de transição para o mercado regulado do gás;
• Mecanismo ibérico de ajuste dos custos de produção de energia elétrica;
• Complemento excecional a pensionistas, equivalente a 50% do valor mensal da pensão;
• Apoio excecional de 125€ por adulto com rendimentos mensais até 2.700€;
• Apoio excecional a crianças e jovens no valor de 50€ por cada dependente;
• Apoio extraordinário de 240 euros dirigido às famílias mais vulneráveis, abrangendo cerca de um milhão de agregados;
• Apoio extraordinário de 30€/mês aos agregados vulneráveis e complemento de 15€/mês a todas crianças e jovens beneficiárias do abono de família até ao 4.º escalão;
• Redução do IVA para 0% relativo a um cabaz alimentar de bens essenciais, durante seis meses;
• Apoio às famílias mais vulneráveis ao aumento dos preços de bens alimentares;
• Estabelecimento de acordo com o setor da produção e distribuição, para diminuir e estabilizar os preços, atenuando as despesas das famílias com a alimentação;
• Apoio à produção agrícola, ajudando diretamente os produtores – num montante de 140 milhões de euros - a fazer face ao aumento dos custos de produção;
• Aumento extraordinário na Administração Pública, correspondendo a uma atualização adicional de 1%, valor que vai além dos pressupostos do Acordo de Rendimentos;
• Aumento do subsídio de alimentação em 15,4% o que equivale a cerca de 18€ por mês para todos os trabalhadores da Administração Pública, com impacto também no setor privado pelo alargamento da base de incidência da isenção de IRS;
• Limitação a 2% do aumento máximo das rendas das habitações e das rendas comerciais para 2023;
• Fixação da prestação do crédito habitação, medida temporária e extraordinária que possibilita congelar a prestação mensal paga aos bancos, durante dois anos;
• Bonificação temporária de juros;
• Renegociação dos créditos à habitação, através da reavaliação periódica da taxa de esforço das famílias.
A reposição de rendimentos, o apoio às famílias mais vulneráveis e o apoio a vários setores da economia ficarão como marca dos governos liderados por António Costa. Isto sem colocar em causa as contas públicas certas, a redução da dívida pública e o crescimento económico apesar de vários apesares.
Sim, não é difícil aceitar que nem tudo correu da melhor forma na governação do PS nos últimos governos. Existem áreas onde não foram vencidas as debilidades existentes, seja pela gestão feita dos dossiers, seja pelo agravar de condições estruturais pré-existentes. Mas, os méritos existem e é por isso mesmo que muitos eleitores continuam a entender que o PS é o partido mais bem preparado para continuar a ter responsabilidade governativas. E esse entendimento deve-se não só ao posicionamento ideológico próprio que PS tem sabido manter estável, mantendo uma coerência com os seus princípios programáticos, mas também às provas dadas na governação.
Nesta lógica aguiar-conrariana, surge fora da equação a possibilidade de o eleitorado fazer uma avaliação positiva dos seus governantes. Vai-se a ver e o país tem estado em piloto automático nos últimos anos, gerido ao sabor dos ventos e da corrente…
Este tipo de lógica só encontra respaldo numa de duas hipóteses: má-fé ou puro viés ideológico. Nos seus sucessivos artigos Luís Aguiar-Conraria demostra que não pode, felizmente, ser acusado da primeira.
Já os eleitores, esses fazem a sua própria avaliação da governação sem qualquer tipo de filtro. É essa, porventura, a verdadeira explicação para a possível vitória do PS e que tanto custa admitir ao distinto comentador.
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