Uma criança não pediu para nascer israelita ou palestiniana, judia ou muçulmana, ou árabe ou cristã. Uma criança não escolheu a sua geopolítica
É preciso começar pelas vítimas. Se nos pomos a discutir geopolítica sem perceber que é de pessoas que estamos a falar, arriscamo-nos a perder a nossa humanidade. E é preciso começar pelas vítimas, porque são as suas vozes que não se vão ouvir mais e as suas escolhas que já não podem mais ser feitas. O mínimo que podemos fazer é reafirmar que nada pode jamais justificar o assassínio, tortura e sequestro de civis inocentes e desarmados, incluindo idosos, mulheres, famílias inteiras, turistas estrangeiros, trabalhadores migrantes e aqueles de entre os mais vulneráveis aos quais nem os pretextos mais retorcidos alguma vez serviriam para atribuir qualquer culpabilidade — as crianças. Esta é uma linha inultrapassável. Uma criança não pediu para nascer israelita ou palestiniana, judia ou muçulmana, ou árabe ou cristã. Uma criança não escolheu a sua geopolítica, não tomou parte das decisões dos adultos que criaram Estados e traçaram fronteiras, não pode por definição ter “culpa” no que quer que o seu assassino decida que é a motivação do seu assassínio. Não há nenhuma razão histórica, política ou outra que possa servir ao assassino para ignorar a diferença entre o bem e o mal no ato de assassinar uma criança.
Em segundo lugar, é preciso designar e descrever os perpetradores, quem eles são e como são. O Hamas é uma organização terrorista que nem muito longinquamente tem qualquer coisa a ver com a justa causa da libertação do povo palestiniano. A própria razão de ser do Hamas é a opressão dos palestinianos, como já fazem na Faixa de Gaza, e, se o Hamas realizasse o seu sonho fanático de expulsar todos os judeus do território entre o Jordão e o Mediterrâneo, a sua causa continuaria a ser a da opressão dos palestinianos — os cristãos, as mulheres, os muçulmanos de escolas de pensamento diferentes das suas, os seculares, os não religiosos, as pessoas LGBT, todos os que se lhes opusessem. Presos por Israel, reféns do Hamas — eis a tragédia de Gaza.
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