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Opinião

Fazer chichi ‘à menina’ e outras questões civilizacionais

Os Sitzpinkler espalharam-se por toda a Europa. Uma questão de higiene ou algo mais prosaico?

Há uns oito anos, trouxe a esta coluna o estranho caso de um inquilino alemão que tinha processado o senhorio devido ao direito que tinha de fazer o seu chichi de pé no apartamento em que vivia. O senhorio alegava que as gotas de urina que acabavam por salpicar o chão estragavam o mármore. A outra parte argumentava que estar na vertical era a “posição natural” de um homem. Ganhou o processo. Nesse longínquo 2015, vivíamos tempos ingénuos. Trump ainda não chegara ao poder, o wokismo ainda não se tornara um sistema de valores, o antiwokismo ainda não decretara a guerra cultural para salvar a sociedade ocidental, não se imaginava que Jordan Peterson, um académico defensor dos direitos masculinos, viria duas vezes no mesmo ano a Portugal e esgotaria dois Campos Pequenos com uma plateia de jovens adultos, ou que o primeiro-ministro britânico pudesse estar neste preciso momento a colocar na imprensa local a ideia de que está a pensar instituir um Ministério dos Homens para se focar nas dificuldades da masculinidade. Fui reler o texto que escrevi e tem uma certa candura da época. Praticamente, só falo de questões de higiene (na casa de banho), de saúde masculina (parece que é melhor sentado) e de respeito pelo outro (não deixar os eventuais salpicos). Porque é que na Alemanha se criou este movimento que visa obrigar os homens a sentarem-se na sanita e — vou usar uma expressão de risco — fazer chichi ‘à menina’? Umas das questões mais intrigantes é o facto de a língua alemã poder em si criar essa possibilidade ao conseguir conjugar várias ações num só termo. Sitzpinkler é aquele que se senta para fazer o seu pipizinho. Ao contrário do Stehpinkler, que é aquele que o continua a fazer de pé. A possibilidade de a linguagem moldar o real é a tese há muito defendida na Filosofia da Comunicação — só os japoneses têm uma palavra similar (suwari-shon), e eles também são de se sentarem —, mas também temos de contar com a personalidade dos povos. Desde há vários anos que se comercializa na Alemanha um aparelho chamado Spuk (o fantasma da casa de banho) que se coloca no assento da sanita e que “ralha” quando alguém o levanta ou “pede” com autoridade que o indivíduo se sente. Há até com a voz de Angela Merkel e outros chanceleres. Não me estou a ver a aceitar a ordem do António Costa para me sentar na sanita para fazer uma mija, desculpem o desabafo.

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