Tudo indica que a luta política no ano que começa em setembro vai dar prioridade à redução de impostos, às classes médias, à sociedade civil, à liberdade económica.
São boas notícias para os portugueses e para Portugal. Talvez ajude a compensar as más notícias que infelizmente já aí estão por causa dos aprendizes de feiticeiro que dirigem o Ministério da Habitação.
E A IRLANDA TÃO LONGE…
No final de julho foi divulgado um estudo segundo o qual Portugal perdeu num ano 128 000 trabalhadores com ensino superior tendo aumentado os empregos menos qualificados.
As causas são várias, mas segundo analistas do BPI a mais importante/provável é a emigração de talento jovem.
Uma outra notícia, esta do francês “Le Figaro”, revela que a Irlanda vai acumular até 2026 excedentes orçamentais de 65 milhares de milhões de Euros (no mesmo período Portugal terá um défice de 5 milhares de milhões).
Também aqui as causas são várias, mas entre elas avulta o facto de na Irlanda a taxa de IRC ser 12,5%, cerca de metade da França e cerca de 40% do que paga em Portugal uma grande empresa (que é 31,5%, a mais alta do Mundo).
E, como causa e efeito do excedente, acresce que a dívida pública irlandesa no final de 2022 era apenas de 44% do PIB e está em queda sustentada e acentuada, e em Portugal está em 113%, ou seja, quase três vezes mais.
Estas são más notícias para Portugal.
Em Portugal, a emigração dos mais qualificados e inovadores vai diminuindo de modo acumulativo a capacidade de aumentar a produtividade da economia, reduz o potencial de desenvolvimento económico, diminui a pressão contra as políticas antiliberais e estatizantes que vêm sobretudo dos que mais têm a perder com elas.
Na Irlanda, a existência de fortes excedentes orçamentais permite também manter e reforçar políticas tributárias agressivas que cumulativamente vão reduzindo os impostos e tornando mais atrativa a instalação de empresas, deixando mais dinheiro na economia, atraindo imigrantes mais qualificados, gerando o conhecido efeito propulsor de que falava Samuelson.
No nosso caso, a história será naturalmente a oposta: redução da produtividade na economia, aumento da subsidiodependência, aumento crescente da punção fiscal sobre a sociedade, reforço da emigração dos mais qualificados.
Ao contrário da Irlanda, somos um dos países europeus com maior carga fiscal per capita, um dos sete com a maior taxa em IRS máxima (“top rate”), creio que um dos dois que a começa a aplicar mais baixo na pirâmide dos rendimentos, e o que tem taxa de IRC mais elevada no Mundo.
Somos um país de pobres e em que o salário médio está mais perto do salário mínimo, mesmo antes de impostos, e por isso um dos países comparativamente com mais fortes políticas redistributivas, mesmo que se não contabilize a saúde, escola e até habitação financiada com impostos e que beneficiam sobretudo os que não pagam ou pagam menos.
Por causa disso (ou apesar disso, como preferirem) já temos um PIB per capita que é só 31% da Irlanda e isso vai piorar, e um coeficiente de Gini (que mede a desigualdade) quase 20% pior do que o da Irlanda.
Ou seja, somos fiscalmente um Estado falhado, com farroncas de sermos um país justo.
IMPOSTOS E ADN DO PSD
É neste contexto que deve ser analisada a opção do PSD em colocar o desagravamento fiscal como prioridade, como ficou claro ontem no Pontal.
Registe-se desde logo que Montenegro, embora tivesse começado mole e frouxo, fez uma excelente intervenção sobretudo porque se sentia que acreditava no choque fiscal que propôs.
E as propostas são:
- uma verdadeira alternativa à opção estatizante e subsídio-dependente que se instalou em Portugal,
- manifestamente orientadas para as classes médias (as famílias que ganham menos de 78000 euros por ano, ou seja 2800 euros por mês, se for um casal que trabalhe),
- essenciais para os jovens para reter talento em Portugal,
- e para motivar políticas de bónus, essenciais para o aumento da produtividade nas empresas e no Estado.
Fico contente, desde logo porque há anos que venho defendendo esta estratégia para o País e para a oposição não socialista.
Há anos que tenho para mim de forma clara que a construção de uma alternativa pelo PSD não é um “PS mais aguado”, como Costa percebeu há anos que o seu partido não ganharia se fosse um “PSD com mais piripiri”.
E foi preciso coragem para avançar: A herança cultural do cavaquismo, o medo de perder votos, a barragem antiliberal da Esquerda que domina os media e o espaço público, a ortodoxia europeia, a falta de capacidade política e de visão que vem afetando o PSD, tudo se conjugava contra esta opção.
Mas o PSD andava afinal a adiar há anos o que era inevitável: apostar – de acordo com o seu ADN original – em ser o partido da sociedade civil, dos self made men, das classes médias em processo de ascensão social, dos jovens.
Hoje o PSD tem concorrência no mercado eleitoral: a IL para a libertação da sociedade civil e o Chega para a também tradicional vertente conservadora e bonapartista do PSD.
Mas o PSD tem grandes trunfos: o sistema eleitoral que favorece os partidos-líderes de cada bloco (PS e PSD), a implantação territorial, a moderação, a convicção nos eleitores do que só o PSD pode liderar a alternativa.
A concorrência vem também do PS, que com Medina quer ser um partido mais “centrista”, a apostar nas classes médias e que vai fazer um Orçamento para o ano eleitoral de 2024 centrado na redução do IRS.
Ou seja, este ano a luta política far-se-á mais no terreno da liberdade, das classes médias, da sociedade civil, dos milhões que pagam um Estado omnipresente, omnívoro e despesista e a favor dos que vêm sendo tratados como metecos, pagando sempre mais impostos.
Isso são boas notícias para Portugal e para os portugueses. Não será ainda a Irlanda, mas pelo menos não será mais a ilusória teoria de que os “criadores de pobreza” são preferíveis aos “criadores de riqueza”.
A grande questão talvez seja então esta: Os portugueses vão seguir a palavra evangélica (“haverá maior alegria no céu por um pecador que se arrepende, do que por noventa e nove justos que não necessitam de arrependimento”)? E, se seguirem, vão mesmo acreditar que o PS (sim, esse que vai ser liderado provavelmente por Pedro Nuno Santos...) se arrependeu?
APRENDIZES E PACOTE HABITAÇÃO
Outros temas essenciais são a Educação, a Saúde (de que falei na passada semana) e a Habitação, que está pendente da decisão do Presidente da República sobre o pacote legislativo que o PS aprovou na Assembleia da República e a dúvida sobre se e em que termos exerce o seu direito de veto.
Os sinais da economia real em relação ao pacote “Mais Habitação” são evidentes e demonstram que a visão estatizante da esquerda socialista, longe de resolver os problemas só os complica.
Sinal disso são:
- As licenças para alojamento local aumentaram de modo exponencial este ano, com os proprietários a se anteciparem à entrada em vigor da Lei, com crescimentos superiores a 100% em 8 distritos (225% em Santarém e 166% em Setúbal), e superiores a 50% em outros 7 distritos;
- A oferta de arrendamento habitacional baixou e com isso subiram os preços e aumentou a carestia;
- O pedido de licenças para construção habitacional caiu 12,3% no 1º trimestre de 2023 em comparação com o ano anterior.
Tudo isto é óbvio:
- proibir o alojamento local vai fazer voltar em força o clandestino;
- limitar o aumento das rendas a 2% vai gerar carestia de oferta e soluções jurídicas para contornar a lei;
- saber-se que um mercado passa a estar controlado pelo Estado afasta investidores para outro tipo de aplicação.
Se alguém tiver dúvidas, leia o artigo do Professor Fernando Alexandre, no Observador de 31 de julho, “Habitação: crise, problemas e soluções”.
Na forma clara que lhe é habitual, demonstra que a crise da habitação vem do lado da oferta insuficiente perante o aumento da procura e por isso um arsenal de medidas que diminui a propensão ao investimento privado tem o efeito oposto ao pretendido.
Como ele afirma, e demonstra com o exemplo de Braga onde reside, “resolver o problema da habitação através do aumento da sua oferta contribui para o crescimento da economia, cria emprego e gera receita fiscal”.
O problema está também na fragilidade das empresas de construção e no receio dos promotores se endividarem para construção para classe média pois o crédito para habitação não flui com a segurança do passado.
Ou seja, na área da Habitação do Governo impera a “síndrome do aprendiz de feiticeiro”, que atingiu Pedro Nuno Santos e contagiou a sua pupila, Marina Gonçalves.
A Ministra, do alto dos seus tenros 35 anos, em que desde a licenciatura sempre esteve em full time na política, atua de acordo com o modelo clássico dos afetados pela síndrome: “o aprendiz tende a achar incrível algo que acabou de aprender, como se fosse uma grande descoberta, algo exclusivo, limitado a um seleto grupo. Ele também acredita que, a partir daqueles primeiros e rasos conhecimentos, está apto para aplicar com destreza os conceitos, ferramentas e estratégias da área, ignorando a sua própria falta de habilidade”.
Como é evidente tudo isto acaba a ser pago pelos que se pretendia apoiar. Felizmente, apesar de tudo, que ela não é ministra na área da produção das armas nucleares…
O ELOGIO
De partida para férias, o meu elogio vai para as entidades autárquicas e outras que construíram – como lembra a revista “Evasões” do Diário de Notícias – “ecovias, ciclovias, ecopistas, trilhos, passadiços, pistas e rotas”.
Seja como for, esta é uma revolução serena que melhora a qualidade de vida dos habitantes e ajuda muito a atrair turismo de qualidade.
Muito usufruo de trilhos na Serra da Estrela, embora infelizmente nesse caso a opção do Parque Natural não seja fazer muitos trilhos acessíveis para quem não conheça a Serra.
LER É O MELHOR REMÉDIO
O Professor Jorge Fernandes sugeriu há dias no Observador livros para férias e entre eles uma obra de Javier Cercas, que eu desconhecia, de imediato comprei e comecei compulsivamente a ler.
Trata-se de “O Impostor” (Assírio & Alvim), um “romance sem ficção” que conta a vida de Enric Marco, um catalão que se fez passar durante décadas por sobrevivente do campo de concentração nazi de Flossenburg e presidiu à Associação espanhola dos presos de Mauthausen, recebeu toda a atenção e honras até ser esmascarado já com 84 anos.
O livro está esgotado em português, mas a edição espanhola não.
A mentira, a impostura, o exagero, a mitomania, a fantasia neurótica, fazem boa literatura.
Por isso sugiro também dois clássicos que algo têm em comum com a obra de Javier Cercas: “D. Quixote de la Mancha” de Cervantes (Editora D. Quixote) e “Peregrinação” de Fernão Mendes Pinto, na adaptação de Aquilino Ribeiro (Bertrand) ou numa edição completa.
A PERGUNTA SEM RESPOSTA
Teve pouco destaque o facto da Cimeira da Amazônia, que reuniu os países que a partilham, ter fracassado. O Presidente Lula exigiu apoios dos países ricos para salvar a Amazónia, mas recusa dar garantias ambientais no Acordo de Comércio Mercosul/EU, que rotulou de “colonialismo verde”, pois pretende ter o direito de autorizar extração de petróleo e desmatação para as necessidades dos povos indígenas.
E os dados oficiais revelam que “entre agosto de 2022 e abril de 2023, a Amazônia já perdeu 5.936 km². É o maior valor da série histórica para esse período, superando em 20% o que foi registrado entre agosto de 2021 e abril de 2022” e na área do Cerrado “nos primeiros quatro meses de 2023 foram devastados 2.133 km2, um valor 17% maior que o registrado no mesmo período do ano passado e 48% maior que a média histórica”.
A pergunta é talvez óbvia: onde estão as manchetes, as reportagens, os comentários que – e muito bem – estigmatizavam Bolsonaro”?
E já agora uma outra: no mundo do ambiente também se aplica o provérbio “mais vale cair em graça, do que ser engraçado”?
A LOUCURA MANSA
São tantos os temas que por vezes nos perdemos. No início da JMJ soube-se que o “Manual do Peregrino” propunha que os jovens fizessem penitência e durante um ano não comessem carne para compensar as emissões dos aviões que os trouxeram a Lisboa.
Um artigo de Rui d’Orey Branco e Filipe Domingues no DN da passada 6ª feira explica que se escolhesse uma dieta vegetariana, por exemplo, “um peregrino vindo da Argentina precisaria de 3881 dias (dez anos) para compensar as emissões desse voo”.
O problema deste tipo de propostas não é que se opte por ser vegetariano, como é evidente e que isso seja mau para diminuir emissões de carbono.
A loucura é a boa consciência que estas opções geram e que ajudam a nada fazer para além disso, além de se achar que assim se pode resolver o problema.
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