Opinião

No lugar do outro

27 janeiro 2023 0:07

O princípio de que cada um só pode representar em palco aquilo que é na vida real redundaria num evidente absurdo

27 janeiro 2023 0:07

Holly Woodlawn, que tinha vindo à boleia desde Miami; Candy Darling, que nunca perdia o juízo; Sugar Plum Fairy, que procurava nas ruas alimento para o corpo e para o espírito; Jackie Curtis, que por um dia julgou ser James Dean; Little Joe, que não fazia nada de graça. No início dos anos 70, um grupo de pessoas com nome e rosto viveu o estrelato, mesmo que efémero, pela mão de Andy Warhol, contrariando a marginalidade que em princípio seria o seu destino. Essas figuras foram imortalizadas numa canção de melodia suave, acompanhada por um coro viciante e por um baixo ondulante. Passaram mais de 50 anos desde que Lou Reed escreveu, compôs e gravou ‘Walk on the Wild Side’, mas a força da sua música não se desvaneceu. É um caso que demonstra que histórias reais, de pessoas concretas, podem ganhar uma presença impressionante na cultura popular. A arte é capaz de dar voz aos que vivem nas margens e assim ajudar a abrir as nossas consciências. E, no entanto, passados tantos anos, as pessoas trans continuam a viver em circunstâncias de grande invisibilidade social, o que tem por consequência uma diminuição da empatia, da capacidade de cada um se colocar no lugar de um outro.