Em maio deste ano, Portugal descia cinco lugares no ranking europeu dos Direitos das pessoas Lésbicas, Gays, Bissexuais, Trans e Intersexo (LGBTI). Sete meses depois, não há novidades: o nosso país passou todo o ano de 2022 sem plano político para a proteção das pessoas LGBTI
Em maio deste ano, Portugal descia cinco lugares no ranking europeu dos Direitos das pessoas Lésbicas, Gays, Bissexuais, Trans e Intersexo (LGBTI). Na lista de razões para esta queda de 4.º para 9.º lugar estava a expiração do Plano de Ação do Governo para esta área específica de intervenção. Sete meses depois, não há novidades: o nosso país passou todo o ano de 2022 sem plano político para a proteção das pessoas LGBTI.
Numa configuração parlamentar de maioria absoluta, é quase impossível não se desejar que o processo de reforço da igualdade e direitos LGBTI seja precisamente o contrário ao da estagnação que vivemos atualmente. Mas é perigoso deixar na mão de apenas um partido qualquer agenda parlamentar que implique Direitos Humanos: a luta intrapartidária que promove avanços legislativos nos grandes partidos é dura para as deputadas e deputados que carregam, há anos, o desígnio da igualdade nas suas costas, e que nem sempre conseguem mover as montanhas de resistência interna; os avanços preocupantes e usurpadores do espaço democrático por parte da extrema-direita implantam o medo dos danos reputacionais sobre as minorias e os partidos que as defendem, principalmente se esses forem os partidos que querem continuar no poder; e o papel fiscalizador da Assembleia da República perde necessariamente força neste cenário, o que é tudo menos inócuo sempre e quando o Governo se esquecer do seu papel de direção política, diplomacia e ação eficaz em matéria de igualdade e combate à discriminação.
Falta ultrapassar a tentação de construir Direitos Humanos aos solavancos da agenda mediática
Desde janeiro deste ano já deram entrada na Assembleia da República várias propostas determinantes para o reforço dos direitos e da proteção das pessoas LGBTI em Portugal. Da proposta de proibição e criminalização das chamadas “práticas de conversão” – que visam a repressão da orientação sexual, da identidade de género ou da expressão de género –, aos projetos de lei sobre a autodeterminação de género nas escolas portuguesas – já avalizados pelo Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida –, às próprias propostas no âmbito do Orçamento do Estado 2023, destinadas ao reforço das verbas alocadas à formação e capacitação, melhorias de procedimentos administrativos e respostas integradas de apoio às vítimas LGBTI.
Mas falta agendar, discutir, aprovar e garantir a implementação da maioria destas propostas – e apresentar tantas outras há anos reivindicadas pela sociedade civil; falta transpor os contextos de igualdade na lei para uma realidade de não-discriminação na prática; falta estrutura e pensamento em resposta ao quão desconexas e ainda pouco integradas têm sido estas propostas; falta financiamento; e falta ultrapassar a tentação de construir Direitos Humanos aos solavancos da agenda mediática, que tantas vezes traz as pessoas LGBTI às luzes da ribalta, não pela afirmação positiva das suas identidades e vivências, mas pelo isolamento, violência, insultos e silenciamentos a que são sujeitas.
Nesta configuração parlamentar de maioria absoluta, serão, justamente, os partidos afastados do poder governamental aqueles que terão maior capacidade de serem agentes impulsionadores dos direitos das pessoas LGBTI, dando voz e corpo às suas propostas eleitorais nesta área, garantindo o voto de um PS historicamente pró Direitos Humanos, constituindo-se como o motor de constância e evolução que está (ranking dixit) ameaçado, e cumprindo o seu papel de agentes fiscalizadores da ação do Governo – a começar pelo Plano de Ação para o Combate à Discriminação em razão da Orientação Sexual, Identidade e Expressão de Género, e Características Sexuais (2022-2025), que continua sem ver a luz do dia.
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