8 mil milhões, e agora?
Este novo mapa demográfico, que se desenha com os oito mil milhões de habitantes no mundo, obriga a um pensamento global, pois o planeta é o mesmo para todos
Demógrafa e professora na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa
Este novo mapa demográfico, que se desenha com os oito mil milhões de habitantes no mundo, obriga a um pensamento global, pois o planeta é o mesmo para todos
Nunca existiram tantas pessoas vivas em simultâneo como na actualidade. São o dobro em relação a 1974 e oito vezes mais do que no início do século XIX. Com impactos e desafios vários — sociais, ambientais e culturais, entre outros —, a razão desta evolução é, no essencial, a redução da mortalidade à escala global.
A população vive, em média, mais anos do que no passado não muito longínquo: a esperança de vida à nascença no mundo é, sexos reunidos, de 71,0 anos, enquanto em meados do século passado era de 46,5 anos. Uma boa notícia, portanto, muito em resultado da diminuição da mortalidade infantil. Acresce ainda que o número de nascimentos continua elevado: todos os dias nascem, em média, 367 mil crianças, em larga maioria (90,9%) nos países menos desenvolvidos.
Como o número de nascimentos persiste superior ao número de óbitos, a população do mundo continua a aumentar. Contudo, esse aumento não se distribui de forma igual. Acontece fundamentalmente nas regiões em desenvolvimento e, muito em especial, nos territórios muito pouco desenvolvidos, como na África Subsariana. Em contrapartida, existe uma parte do mundo onde o aumento da população tem sido muito mais tímido, o que se traduz na sua perda de protagonismo demográfico. Por exemplo, a Europa equivale hoje a 9,4% da população mundial, menos de metade do que representava em 1950 (22,0%). E, nesta Europa, são já muitos os países com populações em declínio pela via ‘natural’, como é o caso de Portugal, onde o número de óbitos é claramente superior ao de nascimentos.
Não sabemos qual o volume máximo de habitantes que o planeta suporta, carga demográfica limite que não é só função do número de pessoas, mas também de outros factores, como estilos de vida, consumos, sistemas de produção alimentar ou repartição de recursos. Contudo, é certo que a Terra é finita e também parece claro que o planeta já não seria suportável se o consumo de todos os habitantes fosse igual ao dos países mais ricos. Assim, com este número de oito mil milhões de pessoas, o qual se espera vir a ser ainda maior no futuro próximo, a desaceleração do crescimento da população mundial — que está a acontecer — é também uma boa notícia, para levar a sério por todos. Mas não parece estar a ser assim para alguns!
Há uma parte do mundo, do lado dos países desenvolvidos, que parece reclamar para si a necessidade de aumentar a sua população através do incremento da fecundidade e dos nascimentos. Porém, tal resposta — além de não se saldar num imediato acréscimo significativo de nascimentos, nomeadamente por as mulheres que vão chegando às idades reprodutivas serem, nessas regiões, cada vez em menor número — esquece algo de essencial: os níveis de fecundidade, inferiores ao limiar de substituição de gerações, de 2,1 filhos por mulher, não se explicam por um qualquer acaso ou circunstância particular. São resultado do desenvolvimento social.
Logo, se a preocupação destas regiões é genuinamente com o seu crescimento demográfico, para mitigar a sua perda de protagonismo demográfico à escala mundial a demografia tem uma resposta para o imediato: o reforço da imigração, em particular nas idades jovens e activas, das regiões com maior crescimento — que são, no essencial, as mais pobres — para as de menor crescimento populacional — as mais ricas. Por outro lado, a via para o maior equilíbrio demográfico futuro entre as várias regiões do mundo está, não em fazer aumentar a população de uma parte do planeta, mas em promover a desaceleração do crescimento da população onde ela mais aumenta, através do desenvolvimento social dos territórios ainda muito pouco desenvolvidos.
Este novo mapa demográfico, que se desenha com os oito mil milhões de habitantes no mundo, obriga a um pensamento global, pois o planeta é o mesmo para todos. Como tal, as estratégias demográficas contraditórias, para o que se passa ‘lá’ e o que se passa ‘cá’, não podem ter lugar.
A autora escreve de acordo com a antiga ortografia.
Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: clubeexpresso@expresso.impresa.pt
Assine e junte-se ao novo fórum de comentários
Conheça a opinião de outros assinantes do Expresso e as respostas dos nossos jornalistas. Exclusivo para assinantes