Não há nada de extraordinário no facto de, uma vez escutado o estampido seco do tiro, um ser humano desate a correr ao encontro da própria infância
É verdade que o segredo de um homem é a sua infância. E que todos nós, mas todos, de forma mais declarada ou clandestina, no modo mais dolente, sobressaltado ou jubiloso, vivemos ainda em torno à mina que foi a nossa infância. Vivemos a céu aberto como garimpeiros depois dos aluviões, percorrendo infatigáveis galerias escavadas no escuro, estacionando lá longe, junto a um qualquer curso de água. E não há outra razão para isso, a não ser a convicção, que a dado momento da vida emerge, de que esta nossa amálgama pode ser afinal o esconderijo de onde se extrai o ouro. Mete-se-nos na cabeça, e daí não saímos, que se nos pusermos a roer a pedra encontraremos metais preciosos, brilhos de galáxias, faíscas, nomes intactos e mais uma dúzia de pensamentos assim. Por isso, não há nada de extraordinário no facto de, uma vez escutado o estampido seco do tiro, um ser humano desate a correr ao encontro da própria infância. Porém, devo dizer, que conheci um homem que não fez apenas isso. Conheci alguém que, ouvindo a detonação que todos ouvem, ousou correr ao encontro da infância do mundo.
Para chegar ao sítio onde ele vivia era preciso apanhar um comboio até Bolonha, mudar para um regional lento até Rimini e tomar um autocarro que parecia um carrossel contornando a serra. O autocarro prosseguia ainda para localidades que depois haveria de visitar em sua companhia, Sant’Ágata, Novafeltria e, sobretudo, San Leo, que surge referido no “Purgatório”, de Dante. Era, por isso, necessário descer a meio do percurso, quando se alcançava o metro 629 de altitude, numa anónima estrada de montanha, um perfeito nenhures.
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