Opinião

Seguir em frente

Seguir em frente

Francisco Rodrigues dos Santos

Presidente do CDS-PP

A História da democracia ensina-nos que o CDS é maior do que qualquer resultado eleitoral. O seu lugar é insubstituível e indelegável - conquistado sob cerco e debaixo de fogo. É o de âncora da direita no regime, o de fronteira de todos os extremismos, o reduto dos valores da tradição cristã europeia, o de um partido de compromisso e de governo.

Numa corrida de obstáculos compete-nos saltar as barreiras quando elas aparecem, e ganhar nova confiança ao lembrarmo-nos daquelas que já ultrapassámos. O CDS precisa de seguir em frente. Um passo ao lado significará a escritura do seu epitáfio. Mais do que ajustes de contas com a gestão política cessante, impõe-se a projecção de um futuro que não seja uma sombra dos equívocos do passado.

Para atingir esse desiderato, o CDS terá, desde logo, de reencontrar-se consigo próprio, em vez de continuar a insistir em transformar-se em algo que nunca foi, sob pena de lhe vermos amputada a alma e razão de ser. Não ganha nada - só perde e corre o risco de perecer – se for ou ambicionar ser um sucedâneo de outro partido ou um produto de contrafação. Ficou demonstrado que o contorcionismo para agradar a franjas eleitorais alternativas, apesar de ter merecido o seu aplauso, não logrou – como seria expectável - o seu voto. A apologia do utilitarismo, a redução da substância à estética, a versão ”hollywoodesca” da função política, o marketing em detrimento da agenda, as meias-tintas, o fascínio pela modernidade, a procura inglória de agradar a todos à medida que se aliena toda a gente: são técnicas que até podem servir o modelo de partidos que ambicionam para si o epíteto cinzentão de “catch-all party”. Mas não servem a vocação maioritária do CDS que, para crescer, terá obrigatoriamente que prezar o institucionalismo, a par de políticas definidas, responsáveis, harmónicas e coerentes.

Convirá, depois, que o CDS assuma um sistema de valores constantes e orientadores – que funcione como chave de leitura da realidade - acreditando que a adesão aos princípios que propalam faz da pessoa e da sociedade melhores, em permanente aperfeiçoamento. Este regresso ao perfil de partido estável e previsível é fundamental para se reconciliar com as suas bases sociais de apoio. Nesse sentido, corresponderá à afirmação matricial de um partido doutrinário – que procura compreender as pessoas, em vez de mudá-las, e acompanhar a evolução da sociedade, em vez de querer transformá-la radicalmente impondo-lhe ideias pré-concebidas.

Por último, exigir-se-á que o CDS adopte um punhado de causas consequentes e razões agregadoras, convertendo-se num partido com rosto visível, guarnecido, munido de respostas pertinentes. Do CDS esperam-se propostas, não apenas uma chuva de protesto e de críticas. Competir-lhe-á demonstrar aos eleitores a utilidade que se retira de um voto no CDS. Se cair na tentação de renunciar à sua identidade, ninguém o identifica. Se não o identificam, torna-se indiferente. Sendo indiferente, torna-se inútil. Uma vez inútil, é legítimo presumir que os eleitores não votarão em si. Em face deste perigo, há um único rumo seguro: procurar estar certo, rejeitando concessões, sem temer fazer ou dizer aquilo em que acredita. Este é o caminho para, nos próximos anos, merecer e conquistar a confiança do povo.

Para se reinventar, o CDS terá ainda que implementar o quadro estratégico dos 3 R´s.

Renovar-se: abrir espaço a uma nova vaga de protagonistas de todas as idades, que concilie a novidade com a experiência, recriando um elo intergeracional composto por gente nova, por nova gente e por figuras vetustas da história do partido. Conquanto, não é crível que o CDS possa relançar-se fingindo que muda alguma coisa, para no final de contas ficar tudo rigorosamente na mesma. Ou, por outras palavras, testar soluções de amanhã com as sobras das de ontem.

Restruturar-se: reafirmar um novo compromisso com os militantes do partido, alargando a malha territorial e a sua rede de autarcas, descentralizando e partilhando poderes e competências com as estruturas de base e intermédias. O CDS sempre foi designado por “um partido de quadros”, que se destacou por possuir um friso credível de protagonistas de âmbito local e nacional com “mundo” e profissão, não dependentes da política, da assessoria, da teia do aparelho. Essa essência não se pode perder. O partido tem que combater e resistir à funcionalização. A contento de tornar a sua imagem mais impactante, atractiva e actual, o CDS deve executar um “rebranding” total, a par de uma ampla inovação nas formas de comunicar interna e externamente.

Reposicionar-se: aproveitar a oportunidade de representar o advento da direita popular e não envergonhada em Portugal, cujo arco constitucional não oferece soluções de bom senso a quem não seja socialista, e queira desafiar o “establishment”, as elites das esquerdas “gourmet”, suas utopias e máquinas de propaganda. O módico do “centrismo” é, essencialmente, um vector de acção. Isto é, um método processual em busca dos valores da moderação, da tolerância, do equilíbrio e da ponderação. A raiz do CDS só pode ser à direita, porque é lá que sua consequência posicional existe, e que a maioria dos seus eleitores têm morada – é com eles que deve partir à conquista do espaço do centro, sob pena de querer tomar o centro sem o seu povo do seu lado.

No interior do partido, é porventura oportuno recordar as regras de convivência entre as diferentes sensibilidades ou visões, de modo a impedir crises precedidas de discussões fracturantes de identidade - que sempre subtraíram mais do que somaram. O CDS é a Casa cuja trave-mestra é o humanismo personalista de inspiração cristã – aberto, actual e não confessional. O tronco comum é, portanto, a democracia cristã, onde as visões mais conservadoras e mais liberais não estão no mesmo plano daquela, embora estejam sujeitas a uma abordagem integrativa em torno e dentro dela. Assim, mesmo com uma participação activamente definidora, estão impedidos de desvirtuar o referencial comum do partido. Se assim não fosse, fomentaríamos os antagonismos e teríamos correntes que conflituariam no plano conceptual, o que hipotecaria qualquer chance de o CDS se afigurar como partido claro e doutrinariamente definido - sendo essa a sua principal vantagem competitiva face aos demais adversários no campo do centro-direita.

Quando um cidadão vota no CDS, espera que o CDS seja o CDS. É, creio, uma expectativa razoável. Então, incumbe ao CDS apresentar um projecto aspiracional e uma ideia de país. O CDS deve ser o partido da verdadeira mudança da política a partir dos valores portugueses e de convicções firmes. O que concentra a sua acção ao serviço prioritário da pessoa, numa orientação familiar, apostando na sua dignidade, preservando a sua liberdade e protegendo a cultura perene, enquadrada por uma visão patriótica.

É, pois, missão do CDS dirigir-se ao povo não socialista, o qual sem o CDS fica sem voz nem representação política. E, pior do que isso, não é nem social nem culturalmente respeitado pelo “centrão” e pela esquerda urbana. Os que não desejam ser escravos do trabalho, da administração tributária, da regulamentação e da burocracia. Os que querem ter tempo para se dedicarem a si e à sua família. Os que reconhecem a necessidade da existência do Estado como Estado-Garante e Estado Regulador, mas não como Estado-Patrão ou Estado Estrangulador. Os que querem escolher a escola onde estudam e o hospital onde são tratados. Os que acreditam na igualdade de oportunidades, no valor do mérito e no elevador social. Os que ambicionam maior liberdade económica para criar valor, captar investimento, gerar emprego e pagar bons salários. Os que não se revêm numa espécie de absolutismo dos mercados e que advogam um justo equilíbrio entre capital e trabalho. Os agricultores, o povo esquecido do mundo rural e os renegados do centralismo. Os católicos, os movimentos de defesa da vida, os que se empenham em prol dos outros. Os portugueses que defendem a Língua Portuguesa sem a mutilação do Acordo Ortográfico e sentem orgulho pátrio sem complexos. Os que preferem a soberania nacional aos iberismos e aos federalismos. Os militares e os membros das forças de seguranças, cuja condição deve ser valorizada e reconhecida. Os antigos combatentes cujo serviço a Portugal não pode ser vilipendiado no ocaso da sua vida. Os que acreditam na liberdade de expressão e na urbanidade, que não querem polícias de linguagem e de comportamentos. Os que reivindicam viver num país onde a justiça seja célere e forte com os fortes. Os que não alinham nas novas ideologias totalitárias e engenharias sociais. Os jovens que querem casar, ter filhos, construir uma família e conquistar uma habitação condigna. Os que defendem um ambientalismo autêntico, a ruralidade, o conservacionismo, e que não os confundem com o animalismo e com outras concepções radicais excêntricas ao modo de vida das pessoas. Os que valorizam as tradições portuguesas e que as entendem defender contra modas e preconceitos. Os que progridem pelo seu esforço e capacidade, e se repugnam com a corrupção, o nepotismo e o clientelismo. Os mais débeis, frágeis e explorados da sociedade, que carecem de protecção através de medidas sociais e de uma justa distribuição da riqueza.

Se o CDS não servir para representar estas pessoas, então a dúvida minará os portugueses sobre para que servirá. Agora, impõe-se que um “novo partido antigo” renasça no próximo Congresso - que se orgulhe de si, que não peça autorização para ser como é, que encare a mudança do mundo e adapte a intervenção. Enquanto houver estrada para andar, o desígnio do CDS é o de lutar - não é o de fugir. É o de seguir em frente! Mesmo que todos os outros batam em retirada e capitulem às mãos das conveniências. O CDS seguirá em frente, sem recuar um milímetro na autenticidade das suas ideias. Deve-o a si mesmo. Mas acima de tudo, deve-o a Portugal!

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