Longevidade

O trabalho não é tudo para as novas gerações

A possibilidade de trabalhar à distância é um dos benefícios que os trabalhadores mais jovens valorizam
A possibilidade de trabalhar à distância é um dos benefícios que os trabalhadores mais jovens valorizam
Oli Scarff/AFP/Getty Images

Debate. Entrar no mercado de trabalho e constituir família são desafios que se enfrentam no início da vida adulta. Jovens buscam equilíbrio, com prioridade para o bem-estar e a saúde mental. Número de filhos é menor e parentalidade mais tardia

O tema da conciliação entre a vida pessoal e a vertente profissional tem estado em cima da mesa nos últimos anos. Há quase cinco, quando uma pandemia nos fechou em casa, as fronteiras entre as duas dimensões diluíram-se para uma fatia significativa da população, através do teletrabalho. Agora, a procura por um equilíbrio faz parte do dia a dia, assumindo particular importância para as gerações mais jovens.

Os portugueses trabalham mais de 39 horas por semana, um valor acima da média europeia. “Continuamos a organizar mal o trabalho”, considera Pedro Mota Soares. Isto porque trabalhamos mais horas, mas “com uma produtividade inferior”, apontou o antigo ministro da Solidariedade, Emprego e Segurança Social na mais recente edição das Conversas Sem Fim, que decorreu no Edifício Impresa, dedicada às idades entre os 21 e os 40 anos.

A satisfação com o trabalho é um dos aspetos mais valorizados por estas faixas etárias. “Quando temos felicidade no trabalho as pessoas são mais produtivas”, defende Joana Lopes, diretora de recursos humanos da PHC Software, empresa que em 2021 foi considerada a mais feliz para se trabalhar pelo estudo “Happiness Works”. Medidas como a happy friday, em que os trabalhadores podem tirar uma sexta-feira por mês para usufruto pessoal, são exemplo da preocupação da organização com o bem-estar.

Esta “cultura” assenta na ideia de que as pessoas não são um número e precisam de ser ouvidas. Além da remuneração, benefícios como permitir trabalho híbrido ou remoto ou dispor de ginásio contribuem para “reter os jovens” e motivá-los, no âmbito do chamado “salário emocional”.

Fatores que podem fazer a diferença quando já não esperam um “emprego para a vida”, como acontecia há algumas décadas, recorda Domingos Lopes. “É preciso ter consciência que o mercado de trabalho é aberto a nível europeu e mundial. Se os jovens não têm as expectativas satisfeitas em Portugal, têm respostas lá fora”, explica o presidente do Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP).

No futuro, o caminho deverá continuar no sentido da flexibilidade, como provam as conclusões do projeto-piloto da semana de quatro dias, implementado em 41 empresas do país e que abrangeu mais de mil trabalhadores. Mais de metade das organizações (52,4%) irão manter o modelo, devido a melhorias operacionais e de desempenho dos funcionários, assim como da sua satisfação, nomeadamente com o tempo livre e a saúde mental e física.

A base da família

Os desafios no trabalho no início da vida adulta têm impacto no foro pessoal. Em média, os portugueses saem de casa dos pais por volta dos 29 anos: a (falta de) estabilidade financeira e ter ou não habitação própria são dois aspetos determinantes para a decisão de ter filhos, por muitos adiada. “Estamos a ter cada vez menos filhos e a começar a tê-los cada vez mais tarde”, retrata Susana Tavares. A professora do ISCTE sublinha: “40% das mulheres em idade fértil em Portugal não têm filhos.”

E as que têm deparam-se com uma penalização, no contexto da existente desigualdade de género no mercado de trabalho. “Continuamos a ser um país que tem discriminação salarial entre homens e mulheres”, observa a docente. Além do salário, persiste uma distinção ao nível dos cargos de liderança, com impacto que se prolonga ao longo da vida. O “fosso salarial” entre os dois géneros agrava-se “depois do nascimento do primeiro filho” e “vai-se alargando ao longo do tempo”, aumentando a probabilidade de dificuldades económicas na fase mais avançada da vida.

Para precaver o futuro, o tema da poupança deve ser abordado desde cedo, dado que a literacia financeira é fundamental para tomar melhores decisões. “O tema da poupança é uma preocupação cada vez mais evidente por parte das famílias”, enquadra Miguel Rijo. No entanto, o caminho a percorrer ainda é longo: os portugueses são os segundos piores da União Europeia em termos de conhecimentos financeiros, somente atrás dos romenos, mostra um estudo realizado pela Comissão Europeia divulgado em fevereiro. É necessário “despertar a consciência”, segundo o diretor de seguros no Doutor Finanças, para que se perceba que para poupar “não é preciso muito dinheiro”: pode ser apenas um euro por dia. O importante é pensar no amanhã, por exemplo através de um Plano Poupança Reforma. O início da vida ativa, quando ocorre a entrada no mundo do trabalho, é um bom momento para começar ou reforçar o planeamento para a longevidade.

FRASES das conversas sem fim

“Há uns anos, um jovem queria um emprego para a vida, hoje em dia ninguém tem essa perspetiva”

Domingos Lopes
Presidente do IEFP


“Nunca se nasceu tão pouco em Portugal como neste momento está a acontecer”

Susana Tavares
Professora do ISCTE


“Não é o número de horas, mas a qualidade do tempo que trabalhamos”

Joana Lopes
Diretora de recursos humanos da PHC Software

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