Legislativas 2019

Chega. “Agora estou a rir-me mas o Benfica também já perdeu aos 90”: a incerteza de um homem só

7 outubro 2019 2:22

Marta Gonçalves

Marta Gonçalves

Texto

Jornalista

José Fernandes

José Fernandes

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Fotojornalista

josé fernandes

Contenção foi o mais pedido a noite toda. Mas era pedida com felicidade, todos sabiam o que podia acontecer dentro de algumas horas. Entre coca-cola e vinho branco foi-se esperando. “Não há motivo para alarmismo, estamos aqui para reforçar a democracia”, garantia o líder de “um partido com estas características”. E à medida que a eleição parecia quase certa, a promessa: se elegermos, vamos celebrar para as escadas da Assembleia da República. E André Ventura foi

7 outubro 2019 2:22

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José Fernandes

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Um homem de pólo rosa caminhava no longo corredor que liga a sala de imprensa e a sala dos convidados. Ia para frente e regressava. Ia e voltava. Empoleirada ao ombro, trazia uma bandeira branca com a estampa “Chega” - era das poucas que se viam pelo Novotel, em Lisboa, onde esteve montada a sede de campanha. O homem que andava para a frente para trás era a personificação da noite do Chega: a dúvida, a ansiedade da incerteza, a contenção de quem sabe que aquilo que mais quer pode acontecer mas que também pode escapar.

A meio da noite, o homem parou. Saiu do corredor. A meio da noite, um festejo. Parecia um golo, não o era. “Conseguimos 50 mil votos, conseguimos a subvenção”, ouve-se. A noite já acabara nas sedes de outros partidos e no Chega ainda prometia demorar mais um pouco. E tornava-se cada vez mais certa a eleição de um deputado pelo círculo de Lisboa, a estreia de André Ventura no Parlamento. Confirmou-se.

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“Há 15 dias diziam que não tínhamos hipótese alguma, há uma semana a hipótese era quase zero, ontem diziam que o perigo estava a chegar. Hoje o Chega é o partido pequeno mais votado de Portugal”, dizia André Ventura depois de horas de ansiedade e poucos minutos após a confirmação da sua eleição.

A incerteza durou até ao último minuto. Só quando se soube o resultado de todas as freguesias de Lisboa é que os festejos se fizeram ouvir. Até então houve de tudo: a felicidade inicial das projeções, a calma de quem espera e a ânsia (muita) de quem está quase a alcançar o objetivo mas ainda assim tão perto de o perder. Ventura sorria mas temia: “Agora estou a rir-me mas o Benfica também já perdeu aos 90”.

Enquanto se partilhavam telemóveis para acompanhar os resultados, as pernas abanavam em desespero, as pessoas bufavam como quem já perdeu a paciência. “Enquanto há vida há esperança”, dizia o homem de casaco creme enquanto revirava os olhos. Queriam mais que tudo o fim da incerteza.

“Eu tive seis filhas, seis partos. Este aqui, esta noite, é o sétimo”, comentava uma das apoiantes já quando a vitória estava garantida e os festejos se preparavam para seguir em direção à Assembleia da República - ou melhor, só até às escadarias porque durante a madrugada de domingo o Parlamento está de portas fechadas.

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O serão foi de prudência. Pediu-se “cautela e contenção” bem mais que uma vez. Ninguém queria falar antes de estar confirmado - “temos de esperar”, dizia Ventura. E na segunda de três vezes que falou aos jornalistas, quis descansar aqueles que o criticaram: “Não há razão para alarmismos. “Estamos aqui para reforçar a democracia”.

“Amanhã [segunda-feira] a imprensa toda vai dizer que o extremo voltou ao Parlamento, que voltaram os fantasmas de há 45 anos. Olhem para quem está aqui hoje, que está aqui para dizer: chega de tanta corrupção e chega de tanta impunidade”, voltava a insistir já com a vitória proclamada.

Cerca de 60 a 70 pessoas ficaram à espera. Transpiravam e iam até à rua arejar. Parecia que assistiam no ecrã gigante à final de um qualquer campeonato de futebol em que Portugal está à beira da vitória mas em que os 90 minutos nunca mais terminam. “Isto está difícil, está”. E eis que alguém entra na sala de telemóvel no ar: “aqui já nos dão um deputado. Elegemos, elegemos”. E eis que naquele momento, todos começam a receber a mesma notícia - a mais desejada. Era oficial: o Chega tinha um deputado.

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André Ventura na noite eleitoral, em Lisboa
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André Ventura na noite eleitoral, em Lisboa

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“Grande André, pá”. A explosão de euforia. Há abraços, cumprimentos, felicitações. “Vai dar um beijo à tua mulher, André”, dizia-lhe um dos apoiantes. O Chega conseguiu eleger um deputado pelo círculo eleitoral de Lisboa e ao nível nacional foi o partido mais votado entre aqueles que até agora não tinham assento parlamentar.

“Se estou contente com esta Assembleia da República? Não”, garantia. “Temo muito o crescimento do Bloco de Esquerda”, explicou. E logo a seguir negou e toda e qualquer possibilidade de apoiar um Governo socialista. “O senhor António escusa de me contactar.”

- Estamos à frente do PSD? - perguntava divertido Ventura no início da noite eleitoral.

- Podes perguntar isso daqui a quatro anos, André.

Já era quase 01h00 quando prometia o futuro: “garanto que dentro de oito anos seremos o maior partido de Portugal”. Até onde é que Ventura quer ir? “Até ao Governo.”

E cantou-se o hino nacional rumo à Assembleia, para onde marcharam com os quatro piscas ligados. Voltaram a juntar-se todos e a entoar gritos de vitória. A escadaria do Parlamenteo foi fechada e guardada com uma dezena de agentes da PSP. Ventura voltou a falar e a proclamar vitória. Por fim, cada um entrou para o seu carro e seguiram.

“Onde se come a esta hora em Lisboa?” São duas da manhã e a festa do Chega é bem capaz de continuar.