O dia em que Ribeiro e Castro entrou na campanha... sem falar de Assunção
NUNO BOTELHO
O antigo líder do CDS foi a Leiria elogiar a "candidata" que gostaria de eleger... mas referia-se Raquel Abecasis. Assunção aproveitou o dia para puxar por Tancos - e repetiu as críticas depois de ter visto Costa reagir aos ataques de Rio
O feixe de espuma surpreendeu todos - jornalistas, militantes, simpatizantes e a própria Assunção Cristas - quantos se encontravam nas caves da Murganheira, visitando as grutas onde se guardam mais de três milhões de garrafas. O centrista José Pinto, que abria uma garrafa para servir à presidente do partido, decidiu pregar uma partida a Cristas e deu-lhe um pequeno banho de espumante, anunciando, entusiasmado, que a líder "está batizada". Diz-se que é o banho da vitória: também tiveram direito a ele, antes de Cristas, Marcelo Rebelo de Sousa e Mário Soares, ao passarem em campanha pela Murganheira, Viseu.
A frase:
"Então um deputado do PS sabia e o primeiro-ministro não sabia?" Assunção Cristas sobre a troca de mensagens em que Azeredo Lopes terá admitido a Tiago Barbosa Ribeiro, deputado do PS, que "sabia" da encenação para recuperar as armas furtadas em Tancos.
O personagem:
José Pinto destacou-se assim que chegou à feira de Lamego, abrindo caminho para a presidente do partido e percorrendo os corredores de bancas com à vontade: afinal, o presidente da concelhia centrista de Lamego estava em casa. Mas houve um momento em que ganhou a atenção de todos quanto o rodeavam: por entre muitos votos prometidos a Cristas, entusiasmou-se a puxar pelos feirantes. "Quero esta ciganada toda a votar no CDS!". O termo foi usado com "carinho", tentaria esclarecer momentos depois a comitiva.
A fotografia:
Assunção Cristas visitou as caves da Murganheira, onde levou um banho de champanhe. "É o banho da vitória"
NUNO BOTELHO
“Podemos confiar em pessoas que são trabalhadoras e imaginativas (...) e pelas ideias que trazem, porque esses critérios duram sempre”. “Só devemos depositar confiança nas pessoas que transmitem alguma coisa com o seu coração”. “Se votasse aqui, não teria dificuldade em dizer: esta é a minha candidata”.
As frases que citamos acima são de José Ribeiro e Castro, antigo líder do CDS, que apareceu esta quinta-feira na campanha eleitoral do partido, numa ação em Leiria. E seria natural pensar-se que estava a falar de Assunção Cristas, que não só concorre às eleições enquanto presidente do partido como estava sentada ali mesmo à sua frente. Mas não. As palavras simpáticas - e o hipotético voto prometido - eram dirigidas a Raquel Abecasis, que veio substituir Cristas na liderança da lista de Leiria ao Parlamento. Para Assunção, nem sequer um elogio de circustância: o antigo líder, frequente crítico da atual direção, não disse o nome da atual presidente durante os doze minutos pelos quais se prolongou a sua intervenção.
Foi um momento singular que marcou uma ação de campanha que, doutra forma, pouca história teria. E foi a maior surpresa de um dia de campanha que acabou de forma soft, com uma sessão de perguntas combinadas sobre o programa eleitoral dos centristas e pouca margem para esticar o evento - Cristas seguiu imediatamente depois para uma entrevista com a RTP.
O dia do CDS acabou cedo, a praça Rodrigues Lobo, em Leiria, longe de estar cheia. Apenas algumas dezenas de cadeiras estavam dispostas no chão de pedra enquanto Raquel Abecasis explicava o intuito da sessão: passar em revista alguns dos pontos cruciais do programa, aplicando-os às várias fases de vida de cada pessoa.
Seguiu-se, por isso, uma sessão de perguntas ensaiadas sobre variados temas, acabando sempre numa conclusão comum que resume a filosofia do documento com que os centristas se apresentam às eleições de outubro: enfrentar um “Estado centralista” e privilegiar o empreendedorismo, a iniciativa privada e a resolução dos “problemas das pessoas”. Foi assim que Cristas respondeu às questões sobre propostas do CDS como o estatuto do cuidador informal, a contratualização de creches dos setores social e privado ou a distribuição de manuais escolares gratuitos segundo o critério do rendimento das famílias - para corrigir a “gravíssima inconstitucionalidade” que é apenas os alunos das escolas públicas terem direito a receber estes materiais.
A esquerda incomodada com Tancos
Depois, a pergunta sobre o assunto que marcava a agenda: o caso de Tancos. Cristas desenvolveu, comparou o caso a uma “telenovela”, bateu na esquerda “incomodada” com o tema e considerou que, dadas as novas revelações da acusação, ou o Governo funciona “muitíssimo mal” ou Costa não podia estar “alheado de tudo”: “Não é crível que o primeiro-ministro possa estar alheado de tudo ou continuar calado”.
Foi o segundo assalto de uma crítica que já tinha tecido, e com força, de manhã, quando no final de uma visita à feira de Lamego colocou a questão assim: “Então um deputado do PS sabia [Azeredo Lopes terá contado a Tiago Barbosa Ribeiro que “sabia” da operação de encenação para recuperar as armas, via SMS] e o primeiro-ministro não sabia?”. Com uma nuance: Costa não tinha reagido às duras críticas de Cristas e só resolveu falar quando, ao final da tarde, Rui Rio entrou em campo e implicou o primeiro-ministro no caso. E Cristas, pouco depois, decidiu insistir - já se sabia que não largaria o tema, e também não o quis deixar os créditos (só) nas mãos de Rio.
Foi a questão de atualidade que marcou o dia de campanha - uma boa notícia para o CDS, que não só tinha proposto a criação da comissão parlamentar de inquérito ao caso e chumbado as conclusões da esquerda, favoráveis ao Governo, como vinha insistindo no caso, à espera de que pegasse. Pegou, finalmente. E Cristas agarrou-o com as duas mãos.
A fechar o dia, a intervenção de Ribeiro e Castro por onde começámos. Quem esteve na praça de Rodrigues Lobo viu o antigo líder chegar, sentar-se ao lado da presidente do partido, ouvir dela um cumprimento, ser chamado para falar de Abecasis - era para isso que ali estava - e… explorar uma variedade de assuntos, particularmente o caso de Américo Sebastião, o empresário português desaparecido em Moçambique há três anos. Também o caráter particularmente democrata-cristão dos distritos de Leiria e Aveiro. E ainda as qualidades de Raquel Abecasis. Só não falou mesmo de Assunção.