Luanda Leaks

Em 2016 havia entusiasmo. Em 2020, a Câmara do Porto não tem projetos com Sindika Dokolo

Sindika ladeado por Isabel dos Santos e Rui Moreira na inauguração de You Love Me You Love Me Not
Sindika ladeado por Isabel dos Santos e Rui Moreira na inauguração de You Love Me You Love Me Not
RUI DUARTE SILVA

Marido de Isabel dos Santos é um dos maiores colecionadores africanos de arte contemporânea e tem uma fundação sediada em Luanda, cuja sede europeia deveria ser instalada no Porto. Fonte do município garante que os contactos entre as duas partes cessaram há anos

Em 2016 havia entusiasmo. Em 2020, a Câmara do Porto não tem projetos com Sindika Dokolo

João Pedro Barros

Editor Online

Em março de 2015, a inauguração da exposição “You Love Me, You Love Me Not”, na Galeria Municipal do Porto, nos Jardins do Palácio de Cristal, teve pompa e circunstância. Deveria ser apenas um primeiro passo de aproximação entre a Fundação de Sindika Dokolo, o marido da empresária Isabel dos Santos, e o município portuense.

Para além do patrono, detentor daquela que será a maior coleção de arte contemporânea africana – teria então cerca de 3.500 obras – , estiveram presentes a mulher, o presidente Rui Moreira e também Manuel Pizarro, do PS, que então estava coligado com Moreira para assegurar a governação da cidade. Antes Sindika Dokolo tinha recebido a medalha de ouro da cidade e, numa entrevista ao “Sol”, dizia que o objetivo era o estabelecimento de “um eixo cultural estratégico entre o Porto e Luanda”.

Passados quase cinco anos, nada se materializou. Contactada pelo Expresso, fonte da Câmara Municipal do Porto assegura que não há qualquer “apoio ou participação” em atividades da fundação e que não há “nada em cima da mesa” em análise. Para além disso, a autarquia desconhece qual o estado atual do projeto de instalação na cidade da sede europeia da instituição.

Sindika Dokolo com Rui Moreira, autarca do Porto
RUI DUARTE SILVA

Em 2016, foi noticiado que a Fundação, através da sociedade Supreme Treasure – uma empresa que pelo menos à época era dirigida por Mário Leite da Silva, considerado o braço-direito de Isabel dos Santos – comprou o edifício destinado inicialmente à Casa Manoel de Oliveira, desenhado por Souto Moura, para aí instalar a sua sede europeia

A última declaração de algum responsável sobre o edifício – comprado em hasta pública, por 1,58 milhões de euros – data de novembro de 2018 e foi estampada no “Público”. Garantia-se que o espaço não estava abandonado, mas não se anunciavam datas para a abertura. O Expresso tentou por várias formas contactar algum responsável da fundação, mas tal ainda não foi possível.

Paulo Cunha e Silva era o pivô da parceria, esclarece a Câmara

Fonte da Câmara do Porto explica que a morte do então vereador da cultura, Paulo Cunha e Silva, em novembro de 2015, justifica o quebrar das ligações entre as partes, visto que seria o grande mentor da parceria. No entanto, o auge na relação institucional parece ter sido atingido posteriormente, em fevereiro de 2016.

Rui Moreira visitou então Luanda durante dois dias, a convite da fundação, e sublinhava, citado pela Lusa, que se tratava do “melhor exemplo de uma cooperação profícua”. A realização de uma exposição dedicada à arte Tchokwe - povo originário do interior norte de Angola e do sul da República Democrática do Congo - seria concretizada “muito brevemente" e o arquivo da autarquia estaria ao dispor. Entretanto a relação entre Sindika Dokolo e a Câmara do Porto parece ter esfriado e não será agora uma prioridade para nenhuma das partes.

Quanto à medalha entregue a Sindika Dokolo – com unanimidade entre o executivo municipal e uma larga maioria a favor na Assembleia –, a Câmara do Porto garantiu ao “Público” que a sua retirada “não se coloca”. O assunto gerou então alguma polémica, que o próprio Sindika comentou então ao “Sol”: “No domínio da arte não é muito bom que haja uma lógica estalinista de votação. Um projecto inovador cria sempre debate e acho que o contraditório é muito importante.(...) Não me cabe a mim entrar nessas considerações”.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: jpbarros@expresso.impresa.pt

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