Guerra na Ucrânia

Procurado desde abril pela família, cozinheiro desaparecido em navio russo que se afundou no Mar Negro recebeu ordem de recrutamento

Moskva
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MAX DELANY

Um gabinete de recrutamento militar em São Petersburgo emitiu um aviso preliminar dirigido a um marinheiro russo desaparecido a bordo do navio Moskva, que se afundou no Mar Negro em abril

A família de Mikhail procura o marinheiro desde a noite de 13 de abril de 2022, quando a Ucrânia disparou dois mísseis de cruzeiro Neptune contra o navio-almirante da frota russa do Mar Negro. O “Moskva”, que tinha a bordo uma tripulação de cerca de 500 pessoas, rapidamente se afundou após ficar em chamas. Foi, por isso, com estupefacção que os pais do marinheiro Mikhail, que era cozinheiro na embarcação russa, receberam uma convocatória no mês passado, no âmbito da mobilização parcial anunciada pelo Kremlin.

De acordo com o site de notícias russo “Fontanka”, um gabinete de recrutamento militar em Frunzenskaya, São Petersburgo, emitiu um aviso preliminar dirigido ao marinheiro russo desaparecido a bordo do navio Moskva, que afundou no Mar Negro em abril. O documento ordenava a Mikhail que se apresentasse ao gabinete em causa, sob pena de enfrentar um possível processo. "Pode ser processado se não comparecer na hora e local indicados, sem que apresente uma razão legítima”, podia ler-se no documento.

As autoridades locais de São Petersburgo admitiram que a convocatória de Mikhail terá sido “provavelmente” um “erro” que se deveu à grande quantidade de avisos enviados desde o início da mobilização, em setembro. “Se o erro for confirmado, faremos o possível para ressarcir os familiares”, declarou Mikhail Kalinin, porta-voz da administração regional.

Nunca chegou a ser divulgado o número exato de marinheiros que morreram no naufrágio em abril. Naquela altura, o Ministério da Defesa russo adiantou que um funcionário morreu e outros 27 membros da tripulação encontravam-se desaparecidos, após aquilo que Moscovo descreveu como uma explosão de munições desencadeada por um incêndio no navio. Os órgãos de comunicação independentes russos acreditam, no entanto, que o número de soldados desaparecidos será maior, em grande medida devido às denúncias feitas por várias famílias nas redes sociais.

Em outubro, um tribunal da Crimeia, região alegadamente anexada pela Rússia, reconheceu a morte de mais 17 marinheiros desaparecidos, depois de as suas famílias terem exigido respostas perante o tribunal.

Um amigo de Mikhail revela que o cozinheiro contou, numa carta, como os recrutas passaram o Ano Novo em Sebastopol. Depois, começaram a “sair para o mar” e mantinham contacto com amigos e familiares apenas quando se encontravam no porto. "Eles não foram informados sobre a operação especial”, acrescenta o amigo de Mikhail.

Uma das cartas que Mikhail escreveu foi publicada nas redes sociais pela mãe do cozinheiro. “O que está a acontecer no mundo agora eu sei apenas em termos gerais”, escreveu, no início de março, reclamando que o dólar já se convertia em 117 rublos: “Deveria ter comprado mais ações da Microsoft.” Desde 8 de abril, quando o Moskva deixou o porto de Sebastopol, que Mikhail não entra em contato. Alguns amigos do marinheiro tentaram apurar o que aconteceu junto dos sobreviventes. Pouco tempo antes da explosão, terá ido à área de armazenamento de alimentos e nunca mais ninguém o viu.

Os amigos de Mikhail explicaram ao site de informação “Fontanka” que a mãe do militar desaparecido ganhou uma nova “esperança” com a carta que chegou a casa: a familiar de Mikhail acredita agora que o desaparecimento não foi registado oficialmente, pelo que a sua morte não é certa.

A primeira mobilização militar da Rússia desde a II Guerra Mundial, anunciada por Vladimir Putin, tem gerado caos e revolta em todo o país. As autoridades locais têm enviado convocatórias a russos que morreram ou que apresentam graves condições de saúde. Pelo menos dois homens cegos e um homem de 63 anos com diabetes e uma lesão cerebral grave foram chamados a combater.

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