Leonor, herdeira da Coroa de Espanha, jurou respeito pela Constituição e já pode ser rainha
Ballesteros via Lusa
A herdeira da Coroa espanhola atingiu a maioridade e jurou a Constituição do país: Leonor de Borbón tem agora plena capacidade legal para suceder ao seu pai, Felipe VI. Se chegar à chefia do Estado, será a primeira mulher a assumir o cargo em mais de 150 anos
A herdeira da Coroa espanhola chegou esta terça-feira à maioridade e centenas de pessoas saíram à rua em Madrid para a saudar. Leonor de Borbón foi ao parlamento nacional jurar que respeitará a Constituição do país, numa cerimónia considerada de grande carga simbólica e jurídica para a continuidade da monarquia em Espanha.
A filha mais velha do Rei Felipe VI, chefe do Estado espanhol desde 2014, jurou perante os deputados, os senadores e outros titulares das instituições de Espanha que respeitará os direitos dos cidadãos e das regiões autónomas do país reconhecidos na Constituição de 1978.
A cerimónia foi considerada de grande valor simbólico e jurídico para a continuidade da Coroa espanhola, “um momento histórico”, nas palavras da presidente do parlamento, Francina Armengol, que realçou que Leonor de Borbón expressou hoje publicamente respeito pela Constituição de uma Espanha “plural, aberta e europeia”.
“Viva a Constituição, viva Espanha, viva o Rei”, disse a socialista Francina Armengol no encerramento da sessão das Cortes (parlamento), levando as centenas de pessoas reunidas na Porta do Sol a gritarem o mesmo.
CHEMA MOYA
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Esta é a segunda vez na democracia espanhola que há este juramento, depois de o pai de Leonor, Felipe de Borbón, ter feito o mesmo em 1986. Nesse ano, o então príncipe de Astúrias jurou respeitar uma Constituição aprovada num referendo popular que tinha menos de dez anos, que estabeleceu a monarquia parlamentar em Espanha e que tinha saído da designada “transição espanhola” da didatura para a democracia, após a morte do ditador Francisco Franco, em 1975.
O juramento de Leonor de Borbón foi idêntico ao que fez o seu pai em 1986, mas o parlamento a quem se dirigiu é bem diferente, numa Espanha que vive agora um momento político marcado pelo protagonismo de partidos nacionalistas e independentistas e onde, na última década, ganharam lugar e espaço forças extremistas, tanto de esquerda como de direita.
Na sessão especial de hoje das Cortes (Senado e Congresso dos Deputados) não estiveram presentes os deputados dos partidos da Catalunha, da Galiza e do País Basco nem os presidentes dos governos autónomos catalão e basco.
Estiveram também ausentes deputados e outros membros das formações de esquerda que integram a plataforma Unidas Podemos, incluindo três ministros, que são republicanos e recusam participar numa cerimónia que reconhece uma instituição, a monarquia, que consideram um anacronismo.
À cerimónia no parlamento, seguiu-se uma outra no Palácio Real, também em Madrid, em que foi entregue a Leonor de Borbón, por decisão do Governo, o Colar da Ordem de Carlos III, a mais alta condecoração concedida pelo estado espanhol.
Madrid voltou a gritar vivas a monarquia “manchada” por Juan Carlos I
Fora das cerimónias públicas esteve o rei emérito de Espanha, Juan Carlos I, que abdicou da Coroa em 2014 e vive nos Emirados Árabes Unidos por causa dos casos de corrupção e outras polémicas em que se viu envolvido. Juan Carlos I viajou, porém, para Madrid, mas para estar, à tarde, numa celebração privada e familiar dos 18 anos da neta.
“Juan Carlos é uma mancha na monarquia”, disse à agência Lusa S. M., de 62 anos, uma das muitas mulheres reformadas que hoje foram até à praça Porta do Sol, no centro de Madrid, para ver passar um cortejo formado por guardas reais a cavalo e dois carros em que seguiam os Reis de Espanha, Felipe VI e Letizia, e as duas filhas, Leonor e Sofía.
Para S.M. e a amiga E. M., de 75 anos, a monarquia espanhola sofre hoje com "a mancha sempre presente" que lhe fez o avô de Leonor, Juan Carlos de Borbón, por causa de casos de corrupção e outras polémicas em que se envolveu, depois de ter sido visto e reconhecido como um dos pais da democracia em Espanha, instituída após a morte do ditador Francisco Franco, em 1975.
Celebração estende-se às ruas de Espanha
O aniversário da princesa poderá ainda ser celebrado nas ruas de Madrid, onde foram instalados ecrãs gigantes para seguir as cerimónias públicas e os cortejos. Artérias centrais da cidade estão também engalanadas com bandeiras e faixas com a cara de Leonor de Borbón.
Nas ruas de Madrid, e apesar de algumas vaias, “o ambiente foi mais saudável” do que noutras situações e cerimónias, “mais de união do que confrontação”, mesmo que “em Espanha nem toda a gente esteja com o Rei, como em Inglaterra”, disse Guillermo Ruiz, um estudante de 18 anos que assistia à cerimónia, à Lusa.
Aos 18 anos, como Leonor de Borbón, não se imagina a assumir a chefia do Estado, como pode acontecer a partir de hoje à princesa a qualquer momento, caso Felipe VI deixe de ser Rei, por algum motivo.
“Mas ela está a ser preparada para isso desde que nasceu. Penso que está preparada”, afirmou o jovem estudante. Nos ecrãs, Leonor de Borbón, depois do juramento e de receber uma condecoração do Governo e do próprio pai, dirigiu as primeiras palavras aos espanhóis e respondeu assim a Guillermo: “Confiem em mim”.
Rodrigo Jimenez/EPA via Lusa
Se chegar à chefia do Estado, Leonor de Borbón será a primeira mulher a assumir o cargo em mais de 150 anos, mas jura hoje fidelidade a uma constituição que mantém a vantagem dos homens sobre as mulheres nos direitos de herança da Coroa.
No país é consensual a necessidade de mudar esta regra na Constituição espanhola, com os analistas a preverem que nesse momento haverá em Espanha um debate sobre a instituição da monarquia.