Trump “cada vez mais louco”: como um processo contra a Fox News mostra a diferença entre o que se passava à frente e atrás das câmaras
Spencer Platt
Canal televisivo deu palco a Donald Trump para questionar a legitimidade dos resultados das eleições de 2020, enquanto nos bastidores muitos duvidavam das alegações e ridicularizavam o antigo Presidente dos Estados Unidos
O processo de difamação da Dominion Voting Systems – empresa que produz máquinas de votação eletrónica – contra a Fox News abriu caminho para a descoberta do funcionamento interno da estação televisiva nos dias que se seguiram às eleições presidenciais de 2020, nos Estados Unidos – e pode concluir-se que o ambiente não era, no mínimo, agradável.
A empresa considera que a Fox News transmitiu falsas alegações de que os seus dispositivos ajudaram Joe Biden e o Partido Democrata a “roubar” as eleições a Donald Trump. Para defender o caso, chamou dezenas de jornalistas e executivos do canal para testemunhar, além do recurso a milhares de mensagens e e-mails, agora divulgados pela BBC.
É assim que se revela a “luta” nos bastidores perante a tentativa de Donald Trump de inverter os resultados eleitorais. Em programas de opinião noturnos apresentados por figuras como Tucker Carlson, Sean Hannity ou Laura Ingraham, a cobertura ao antigo Presidente dos Estados Unidos foi amplamente positiva.
Mas, após a derrota em 2020, tudo começou a mudar. Num e-mail, o presidente da Fox Corporation, Rupert Murdoch, escreveu que Trump e o seu advogado, Rudy Giuliani, estavam a ficar “cada vez mais loucos”. Já Carlson admitiu odiar Trump “apaixonadamente”, além de classificar a presidência como desastrosa e destacar que todas as suas empresas fracassaram.
Enquanto os apresentadores da Fox News davam a Trump e aos respetivos apoiantes uma plataforma para questionar a legitimidade dos resultados das eleições, nos bastidores muitos negavam a validade das alegações e lamentavam a forma como a estação cobria o tema.
O próprio Murdoch disse ao editor do “New York Post”, Col Allan, que metade daquilo que Trump dizia era prejudicial e não era verdade. “Parece-me uma loucura”, escreveu Carlson numa mensagem para os restantes apresentadores do período noturno, a propósito da alegação de que as máquinas de votação da Dominion “roubaram” a eleição.
A rede televisiva está a recorrer a uma decisão do Supremo Tribunal, com cerca de 60 anos
Conforme o esforço de Trump para contestar a derrota eleitoral se foi prolongando, os executivos da Fox News perceberam que as afirmações arriscavam trazer uma reação negativa por parte dos telespetadores. “Não podemos fazer as pessoas pensar que nos virámos contra Trump”, escrevia um produtor da equipa de Carlson numa mensagem para outro colega.
Surgia, entretanto, o receio de o público optar por outros canais de notícias conotados com a direita, como o Newsmax. Carlson disse mesmo que o canal estava a “brincar com o fogo”, numa alternativa que poderia ser “devastadora”. De acordo com a ação judicial da Dominion, foi a motivação financeira a levar à decisão de continuar a transmitir o negacionismo eleitoral que a estação sabia ser falso.
A empresa terá de provar que a Fox News sabia que as alegações eleitorais eram falsas e que causavam danos significativos à sua reputação e interesses comerciais. Após os registos reunidos terem sido divulgados, o canal emitiu um comunicado em que diz que os advogados da empresa estão a “pintar um quadro impreciso”, através da escolha de citações “sem contexto” e com factos “irrelevantes”.
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