Numa reunião com o seu corpo de ministros, o Presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, avançou a ideia de que a Venezuela pudesse tentar organizar novas eleições. O seu principal assessor, Celso Amorim, confirmou, segundo o jornal “Folha de São Paulo”, que essa ideia foi discutida de forma “informal”.
A imprensa satírica venezuelana não demorou 24 horas a pegar na proposta do chefe de Estado brasileiro para brincar com a situação política atual na Venezuela: o Presidente Nicolás Maduro e as instituições que retificam os atos eleitorais, e que lhe são fieis, insistem em mantê-lo como vencedor das presidenciais de 28 de julho, sem apresentarem provas que demonstrem os 51% de votos anunciados.
“Brasil propõe repetir eleições até que Maduro ganhe”,titulava, terça-feira, o “Chigüire Bipolar”, um periódico satírico venezuelano especializado em “notícias parciais e sem veracidade”, editadas por “uma capivara [chigüire] com problemas psicológicos”.
Lá dentro, a notícia expandia-se para incluir o assessor de Lula. “Num esforço para solucionar a crise venezuelana, Celso Amorim, assessor do Presidente Lula da Silva e a única pessoa para quem não é suficiente uma página na internet com todas as atas do CNE [Conselho Nacional Eleitoral], sugeriu repetir as eleições na Venezuela até que [Nicolás] Maduro ganhe. Poderia ser à ‘melhor de três’”, ironizou o jornal.
Na segunda-feira, trinta ex-presidentes de países da América Latina e de Espanha (chefes do Governo) divulgaram uma carta aberta dirigida ao Presidente brasileiro, onde pedem que mantenha o compromisso com a democracia e a liberdade na Venezuela. “Os ex-chefes de Estado e de Governo subscritores deste documento, membros da Iniciativa Democrática de Espanha e das Américas (IDEA), exortam Luiz Inácio Lula da Silva, Presidente da República Federativa do Brasil, a reafirmar o seu inquestionável compromisso com a democracia e a liberdade, as mesmas de que goza o seu povo, e a fazê-las prevalecer também na Venezuela”, lê-se no documento publicado pelo IDEA.
Maduro, um ditador?
Segundo fontes presentes na reunião de Lula com os seus ministros, o Presidente disse que o resultado das eleições não pode ser aceite se não houver provas de que a votação decorreu dentro da legalidade e de que os resultados são mesmo os que Maduro e a CNE divulgaram, sob risco de o venezuelano ser considerado por todos um ditador.
O chefe de Estado brasileiro tem mantido contacto com os presidentes do México e da Colômbia, Andrés Manuel López Obrador e Gustavo Petro, respetivamente, com o objetivo de encontrar solução para a Venezuela. Como são os três de partidos de esquerda, é mais provável que consigam chegar a Maduro e discutir uma solução, mas também este esforço parece estar em risco de falhar. López Obrador disse, quarta-feira, que iria abster-se, por enquanto, de participar nestas conversas, uma vez que o Tribunal Supremo de Justiça da Venezuela ainda não emitiu um parecer final sobre o ato eleitoral, o que deve acontecer esta sexta-feira.
A oposição garante que recolheu atas eleitorais (‘talões’ impressos pelas máquinas de voto eletrónico que mostram os votos depositados em cada candidato por cada máquina) suficientes para provar que o seu candidato, Edmundo González Urrutia, venceu as eleições. A agência de notícias Associated Press já confirmou que essas atas, disponíveis publicamente na internet, são reais. Já Maduro pediu ao Supremo Tribunal que valide a sua vitória, mas não apresentou atas que provem que venceu. Vários países têm pedido que todas as atas sejam revistas por um painel de especialistas internacional.
Um painel de peritos em atos eleitorais da Organização das Nações Unidas (ONU) já emitiu parecer sobre as eleições. Determinou que a recusa em apresentar resultados detalhados é algo “sem precedentes nos dias de hoje”. As “medidas básicas de transparência e integridade” exigidas para "eleições credíveis" não foram respeitadas.
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