Líderes endurecem pressão sobre Israel, mas dividem-se quanto ao financiamento conjunto na defesa

Os 27 apelam ao fim da violência em Gaza e pressionam Netanyahu a não avançar com uma ofensiva em Rafah
Os 27 apelam ao fim da violência em Gaza e pressionam Netanyahu a não avançar com uma ofensiva em Rafah
Correspondente em Bruxelas
A UE pede "uma pausa humanitária imediata que leve a um cessar-fogo sustentável". O apelo a um cessar-fogo é mais indireto do que direto, mas não deixa de ser a posição mais forte que a UE teve até agora sobre a guerra entre Israel e o Hamas. Os líderes foram mais longe do que em outubro, quando levaram horas a discutir se apelavam a uma pausa ou pausas nos bombardeamentos sobre Gaza.
Apelam também "à libertação incondicional de todos os reféns" e a "um acesso humanitário total e seguro a Gaza". São cada vez mais as vozes entre os líderes europeus que consideram a situação insustentável.
"Penso que finalmente temos uma posição unificada dos 27 países que é extremamente clara, exigindo que a violência acabe imediatamente", afirmou o primeiro-ministro belga à entrada para o segundo dia de Cimeira. "Foram mortos demasiados civis inocentes. Por isso, é preciso acabar com a violência", considera Alexander de Croo. A Bélgica é um dos países que tem defendido uma posição mais forte em relação a Israel, juntamente com Irlanda, Espanha , Suécia ou Portugal.
Nas conclusões da Cimeira fica também expressa a condenação às intenção do Governo de Benjamin Netanyahu de avançar com uma ofensiva em Rafah. "Não aceitável", diz De Croo.
"O Conselho Europeu insta o Governo israelita a não levar a cabo uma operação terrestre em Rafah, que agravaria a já catastrófica situação humanitária e impediria a prestação urgentemente necessária de serviços básicos e de ajuda humanitária. Mais de um milhão de palestinianos procuram atualmente refugiar-se dos combates e obter acesso a ajuda humanitária em Rafah", pode ler-se nas conclusões.
Uma maior pressão sobre Israel sem deixar de voltar a condenar os "ataques terroristas brutais e indiscriminados de 7 de outubro". Os líderes apoiam também mais sanções contra o Hamas e reiteram o direito de Israel à autodefesa, mas deixam claro que entendem que Israel tem ido longe demais, apontando para "o efeito desproporcionado nos civis, em especial nas crianças, bem como com o risco iminente de fome causado pela entrada insuficiente de ajuda em Gaza".
A posição mais dura da União Europeia em relação em Gaza avança apesar das reticências da Áustria, República Checa e Hungria. E coincide com a decisão dos Estados Unidos de passar dos vetos no Conselho de Segurança à apresentação de uma resolução a pedir um cessar fogo-imediato associado à libertação dos reféns.
"O facto de os EUA assumirem esta posição também significa que muitos teriam ficado embaraçados se a posição da UE fosse menos frontal. E penso que o enorme sofrimento em Gaza fez com que muitos corações se revoltassem", diz Leo Varadkar. O primeiro-ministro irlandês avisa, no entanto, que os apelos "da UE e dos EUA a um cessar-fogo não faz com que aconteça" e defende mais "pressão sobre as partes - Hamas e Israel - para que cheguem a um entendimento. Varadkar, tal como António Costa, despede-se hoje dos Conselhos Europeus, depois de se ter demitido do cargo.
Esta quinta-feira, os 27 receberam também o secretário-geral das Nações Unidas pedir que não tivessem "dois pesos e duas medidas" sobre os conflitos na Ucrânia e na Faixa de Gaza. Um apelo em linha com o que defendeu António Costa à entrada para o Conselho Europeu
"A União Europeia não pode convocar o mundo para defender o direito Internacional quando a Rússia invade a Ucrânia e depois ignorar o que é o direito Internacional, quando Israel está neste momento a utilizar meios absolutamente desproporcionais contra o povo palestiniano. Aquilo que dá autoridade moral à Europa é a coerência na defesa do direito Internacional", afirmou ao primeiro-ministro somando o anúncio de mais 10 milhões de euros de financiamento nacional à UNRWA, a Agência das Nações Unidas que apoia os refugiados palestinianos.
Numa altura em que vários países europeus, incluindo a Alemanha, suspenderam o financiamento à UNRWA, por causa das suspeitas de que funcionários da agência participaram nos ataques de 7 de outubro, Portugal volta a reforçar o financiamento, que para 2024 vai já em 15 milhões de euros.
O apoio à agência está também nas conclusões finais em que o Conselho Europeu reconhece "que os serviços prestados pela UNRWA em Gaza e em toda a região são essenciais", esperando agora o resultado da investigação sobre o envolvimento de funcionários nas operações do Hamas. No início do mês, a Comissão Europeia tinha já decidido avançar com novas transferências para a UNRWA, agora são os líderes a darem um voto de confiança ao trabalho de uma das agência da organização liderada por António Guterres.
Os líderes reconhecem a "urgência" de enviar sistemas de defesa aérea, munições e mísseis para a Ucrânia. O momento é considerado "crítico" e isso fica escrito nas conclusões do Conselho Europeu, tal como o compromisso para finalmente "cumprir o compromisso" de fornecer à Ucrânia um milhão de munições de artilharia, que está agora mais próximo com a iniciativa lançada pela Chéquia para a aquisição urgente de munições - dentro e fora da europa - e na qual Portugal participou com 100 milhões de euros.
No entanto, na questão do financiamento deste tipo de apoio, continua a haver divergências. No início da semana, os 27 aprovaram finalmente mais 5 mil milhões de euros para comprar equipamento militar e munições para Kiev através do Mecanismo Europeu de Apoio à Paz, mas ainda não há luz verde para utilizar as receitas extraordinárias provenientes dos ativos russos congelados para comprar armas e munições para a Ucrânia.
Esta quarta-feira, a Comissão avançou com uma proposta para usar 3 mil milhões de euros referentes aos juros e receitas extraordinárias que só existem porque os ativos do banco central russo ficaram congelados devido às sanções. O Conselho Europeu analisou a questão, mas ainda não há consenso para uma luz verde política a esta ideia. É agora pedido aos ministros que o trabalho continue a nível técnico.
Já a Presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, pressiona para que se avance com a utilização das receitas dos ativos russos congelados. Diz que se os 27 forem rápidos, há condições para "se desembolsar os primeiros mil milhões de euros" para a compra de equipamento militar já no "dia um de julho".
Os 27 dizem-se ainda empenhados "em aumentar globalmente a prontidão e as capacidades em matéria de defesa" interna e reforçar a base industrial e tecnológica de defesa. Mas também estão longe de um entendimento sobre os meios financeiros conjuntos para reforçar o objetivo da "aumentar substancialmente as despesas com a defesa e investir melhor e mais rapidamente em conjunto".
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