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Lula vai à China tentar "reaproximação" com o maior parceiro comercial, EUA estão preocupados

Lula vai à China tentar "reaproximação" com o maior parceiro comercial, EUA estão preocupados
EPA

A China é, desde 2009, o maior parceiro comercial do Brasil e uma das principais origens de investimentos em território brasileiro. As exportações de produtos brasileiros para a China mais do que duplicaram nos últimos dez anos, tendo chegado quase a 90 mil milhões de dólares em 2022

A vista do Presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, que deve começar no dia 12 de abril, terá uma agenda ambiciosa que prevê a celebração de muitos acordos e uma grande delegação brasileira formada por cerca de 300 membros.

Nos encontros, o Presidente brasileiro tratará de temas económicos e diplomáticos, expondo a intenção do país sul-americano de retomar uma cooperação mais ampla com países em desenvolvimento e expandir influência do Brasil no mundo, após o mandato do ex-presidente Jair Bolsonaro que foi marcado pelo grande isolamento internacional.

Existe a projeção por parte de diplomatas brasileiros de que serão assinados cerca de 20 acordos de cooperação entre Brasil e China em diferentes áreas, com destaque para ciência e tecnologia, economia, comércio exterior, cultura, indústria, defesa e educação.

Segundo declarações do secretário de Ásia e Pacífico do Ministério das Relações Exteriores do Brasil, Eduardo Paes Saboia, cerca de dez dias antes da viagem de Lula da Silva à China, estão a ser negociados muitos acordos bilaterais, 20 já foram confirmados, "mas esse número pode aumentar."

Um dos acordos da área económica que gera espetativa diz respeito a ativação de um fundo de financiamento chinês de 20 mil milhões de dólares (18,6 mil milhões de euros) para investimentos em projetos no Brasil.

O país sul-americano também espera firmar parceira para desenvolver a sexta geração de satélite sino-brasileiro e, por iniciativa do Governo Lula da Silva, há a indicação de que pode acontecer uma declaração conjunta com a China sobre clima e até mesmo criação de um fundo de financiamento binacional para combater as mudanças climáticas.

A previsão é que Brasil e da China também discutirão temas de governança global, assuntos de interesse dos BRICS (grupo formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), e a proposta brasileira sobre a criação de um grupo de países não envolvidos na guerra provocada pela invasão russa à Ucrânia para negociar a paz naquela região.

Xi Jinping acabou de retornar de uma visita de Estado a Moscovo, onde se reuniu com o Presidente russo, Vladimir Putin, e apresentou as propostas chinesas de paz na Ucrânia, facto que aumenta certeza de que a guerra no leste da Europa será um tema sensível e importante no encontro do líder chinês com o líder brasileiro.

Na visita, Lula da Silva deve participar de um grande evento de negócios que reunirá pelo menos 240 empresários brasileiros, com forte presença de pessoas ligadas ao agronegócio que acompanham a comitiva governamental na viagem, além de empresários e representantes do Governo chinês.

Cerca de 40 políticos, entre ministros do Governo brasileiro e parlamentares convidados devem participar das agendas na visita de Lula da Silva ao país asiático.

O programa oficial anunciado pelo Governo brasileiro também prevê uma visita a Xangai, capital económica da China, onde a ex-vice-presidente Dilma Rousseff, que governou o Brasil de 2011 a 2016, assumirá a gestão do Novo Banco de Desenvolvimento (NBD) dos BRICS.

A China é, desde 2009, o maior parceiro comercial do Brasil e uma das principais origens de investimentos em território brasileiro. Em 2022, a corrente de comércio entre os dois países atingiu recorde de 150,5 mil milhões de dólares (139,4 mil milhões de euros).

Especialistas consultados pela Lusa consideram que a viagem do Presidente brasileiro, Lula da Silva, à China, com uma comitiva sem precedentes, pretende projetar o país como ator internacional e é um "sinal de respeito" para com o maior parceiro comercial.

Luiz Inácio Lula da Silva estará na China entre os dias 12 e 15 de abril, depois de uma primeira viagem ter sido anulada por motivos de doença. Lula da Silva parte acompanhado por uma delegação recorde de 240 homens de negócios, ministros e parlamentares.

"Não me lembro de uma comitiva oficial ter essa robustez, a gente vê empresários de todos segmentos", disse à Lusa o consultor de agronegócio Luciano Vacari, destacando ainda o facto de os empresários de proteína animal estarem em peso representados.

"O Brasil está buscando uma reaproximação", considerou Luciano Vacari, referindo-se às relações políticas conflituosas entre o ex-presidente brasileiro Jair Bolsonaro e o seu homólogo chinês, Xi Jinping. "Com um comprador deste tamanho temos de ter uma relação mais saudável possível", frisou.

Logo na segunda-feira, com uma agenda intensa, o ministro da Agricultura do Brasil embarcou para Pequim para iniciar uma série de conversações com o seu principal importador de produtos agropecuários. Na comitiva foram ainda mais de 100 pequenos, médios e grandes empresários, produtores, representantes de associações e cooperativas do agronegócio brasileiro.

Para já, a ida antecipada do ministro da Agricultura do Brasil já deu frutos: as autoridades da China confirmaram o levantamento do embargo à carne bovina vinda do Brasil, imposto desde fevereiro após a confirmação de um caso isolado e atípico da doença das "vacas loucas".

As exportações de produtos brasileiros para a China mais do que duplicaram nos últimos dez anos, tendo chegado quase a 90 mil milhões de dólares em 2022, com minério de ferro, soja e petróleo a ocuparem o pódio.

Pequim é o principal destino das exportações do agronegócio brasileiro representando 31,9% das exportações do agronegócio brasileiro em 2022, num total de 47,20 mil milhões de euros. Entre os dez produtos mais exportados, a China foi o principal destino de seis: soja, carne bovina, carne de frango, celulose, açúcar de cana em bruto e algodão.

"Existe um anseio muito grande de ter a planta capacitada para vender na China", afirmou o especialista em agronegócio.

A viagem de Lula da Silva, contudo, extrapola a relação comercial e pretende restabelecer novas relações políticas e catapultar o Brasil para o panorama internacional, explicou à Lusa a professora do curso de Relações Internacionais e Integração na Universidade Federal da Integração Latino-Americana (UNILA) Karen dos Santos Honório.

Para além da relação pragmática, no campo da política externa brasileira o objetivo é que a relação Brasil-China seja consolidada "como uma relação central para se perceber como é que o Brasil se projeta na política internacional e principalmente num contexto de disputa entre Estados Unidos e China", disse.

"O Brasil está jogando o jogo da política internacional para ter ganhos políticos" e potencializar o Brasil como uma ator relevante, disse.

Nesta visita vislumbra-se um claro contraste com a ida de Lula da Silva aos Estados Unidos para se encontrar com o Presidente norte-americano, Joe Biden. Nos Estados Unidos, no mês passado, Lula da Silva esteve em Washington menos de 48 horas e não se encontrou com empresários.

"Os Estados Unidos estão preocupados com essa aproximação do Brasil com a China", afirmou a professora, lembrando a comissão de relações exteriores do Senado norte-americano convidou autoridades do governo Biden para uma discussão sobre o "futuro das relações entre Estados Unidos e Brasil".

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