Internacional

Conselho Europeu: a Polónia cedeu, Kiev conseguiu €18 mil milhões e Costa quer renovar o Mecanismo Ibérico

Mateusz Morawieki, primeiro-ministro da Polónia
Mateusz Morawieki, primeiro-ministro da Polónia
Mateusz Marek/Lusa

Os líderes europeus resolveram o impasse na aprovação do pacote de ajuda à Ucrânia, mas empurraram para os ministros da Energia a responsabilidade de se entenderem - até segunda - sobre o limite ao preço do gás. Já António Costa está interessado em prolongar o Mecanismo Ibérico, que mantém os preços da eletricidade mais baixos em Portugal

Não faltou suspense na última cimeira de líderes do ano. A noite terminou com a aprovação do pacote de 18 mil milhões de euros de ajuda à Ucrânia, mas o processo esteve tremido durante todo o dia, num braço de ferro entre os 26 e a Polónia.

Varsóvia queria a aprovação do apoio financeiro à Ucrânia, mas não a criação de um imposto mínimo sobre as multinacionais. Só que as duas decisões, ainda que de áreas distintas, estavam englobadas num único pacote político e era forte a pressão para se aprovar tudo ou nada.

O primeiro-ministro polaco, Mateusz Morawieki, ainda acusou os restantes de misturarem "maçãs com bananas" e de usarem a ajuda à Ucrânia como "chantagem" para pressionar Varsóvia a aceitar algo sobre o qual tinha dúvidas. Mas a estratégia funcionou. A maioria resistiu a separar os dossiers e no final tudo foi aprovado (incluindo o Plano de Recuperação e Resiliência húngaros e a suspensão de parte dos fundos europeus destinados à Hungria).

Diz António Costa que a Polónia "acabou por ficar convencida dos argumentos dos outros 26" e "teve a posição construtiva de não bloquear a essência de um acordo". Já a primeira-ministra italiana, que se estreou num Conselho Europeu, reclamou para si créditos no sucesso da cimeira. Numa nota à imprensa, a que o Expresso teve acesso, Giorgia Meloni congratulou-se pelas "conversas frutuosas" com Morawieki e pela "reunião decisiva que desbloqueou a situação".

Meloni e o colega polaco partilham a mesma família política europeia. Fazem parte dos Conservadores e Reformistas, que juntam muitos dos partidos nacionais com costela eurocética.

O regresso do veto polaco

A postura polaca de oposição à tributação mínima de 15% das grandes empresas na UE- obrigando-as a pagar impostos onde têm lucros - não é de agora. Durante vários meses, Varsóvia rejeitou aprovar algo que a UE negociou no âmbito da OCDE e que levou a um acordo histórico aceite por 140 países em outubro de 2021.

O veto polaco só desapareceu quando a Comissão Europeia deu luz verde ao Plano de Recuperação e Resiliência. Só que a tributação mínima acabou por não avançar porque, entretanto, passou a estar refém do veto da Hungria.

Na segunda-feira passada, Budapeste aceitou finalmente desbloquear a aprovação - por unanimidade - da taxa de imposto mínimo de 15%, depois de ter também a luz verde ao PRR húngaro. Quanto todos achavam que o assunto estava resolvido e a aprovação garantida, eis que Varsóvia voltou a suscitar dúvidas. A diferença, desta vez, é que a maioria dos países não percebeu o que é que Morawieki queria em troca, adianta fonte europeia.

Zelensky espera primeira tranche em janeiro

O impasse que marcou o dia acabou por merecer recados do presidente ucraniano. Numa intervenção por videoconferência, pediu ao Presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, que " garantisse" que o apoio à Ucrânia "não ficasse dependente de mal-entendidos e de disputas entre Estados-membros".

Kiev precisa do dinheiro e Volodymyr Zelensky espera que a primeira tranche dos 18 mil milhões de euros chegue já em janeiro. O financiamento dos empréstimos a muito longo prazo é para ir sendo transferido ao longo de 2023 e está ancorado no orçamento comunitário, o que significa que os 27 vão também participar no esforço.

E enquanto os líderes pressionavam Morawiecki na sala, à parte, os embaixadores finalizavam o nono pacote de sanções à Rússia. Uma vez mais, para satisfação de Zelensky. Ainda que formalmente só fique aprovado esta sexta-feira, está politicamente fechado. Inclui medidas restritivas para mais 200 indivíduos e entidades ligadas à máquina de guerra do Kremlin e tenta restringir o acesso da Rússia a ‘drones’.

Portugal quer prolongar Mecanismo Ibérico

A inflação e os preços da energia voltaram à agenda para confirmar que os 27 continuam sem se entender sobre se se deve ou não intervir no mercado da energia e limitar o preço do gás. O tema é altamente divisivo, com a Bélgica, Itália ou Espanha a pressionaram para que o mecanismo de correção de preços que está em cima da mesa inclua um verdadeiro limite ao preço do gás.

Já a Alemanha, Países Baixos, Dinamarca e Áustria insistem que é preciso salvaguardar que o mecanismo não afasta os fornecedores e cria um problema de abastecimento na Europa.

O braço de ferro arrasta-se. A novidade é que os líderes deram um prazo aos ministros da Energia. Têm de se entender até à próxima segunda-feira, dia em que há nova reunião da Energia. O desafio passa por encontrar uma solução que permita a todos "salvar a face", tendo em conta as posições extremadas das últimas semanas.

Ao que o Expresso apurou, "está mais ou menos aceite" que terá de haver um "limite ao preço do gás". Falta saber qual o valor a incluir no mecanismo de correção de preços. A Comissão tinha proposto 275 euros - considerado por muitos demasiado elevado - agora já se fala em valores entre os 190 e os 220.

Quanto a Portugal, está mais preocupado em renovar, por mais um ano, o chamado Mecanismo Ibérico, que limita o preço do gás para a produção de eletricidade. Em Bruxelas, o primeiro-ministro aproveitou o encontro para sublinhar que vai querer negociar com a Comissão Europeia o prolongamento. Uma posição articulada com Madrid.

"Sublinhámos que independentemente da fixação deste mecanismo de correção [de preços], é essencial renovar a partir de maio a solução de exceção ibérica", afirmou António Costa aos jornalistas. O Governo saca dos argumentos que deverá utilizar para conseguir nova luz verde da Comissão Europeia. "Não tem distorcido o mercado, mas permitido às empresas ter preços francamente mais competitivos do que os que são praticados no mercado internacional. Tem-se revelado um bom mecanismo para evitar que a subida do preço do gás tenha idêntica correspondência na subida do preço da eletricidade", rematou.

Da cimeira de dezembro sai também o acordo para uma reunião extraordinária em fevereiro. É que muito ficou por discutir e decidir, nomeadamente toda a parte das migrações - o eterno tema sem acordo - o debate sobre a revisão das regras orçamentais e ainda a resposta a dar aos Estados Unidos e à legislação norte-americana para baixar a inflação.

A presidente da Comissão Europeia saiu do encontro com os líderes a prometer que em janeiro “irá apresentar uma proposta de ajuda de Estado”. É através dos auxílios de Estado que Bruxelas deverá contrapor a lei norte-americana que entrou em vigor em agosto e que inclui, por exemplo, investimentos no setor da energia, subsídios para veículos elétricos e projetos de energia renovável.

Da reunião a 27 sai ainda a luz verde dos líderes à candidatura da Bósnia-Herzegovina à UE. A decisão não teve o impacto mediático concedido à Ucrânia, há uns meses, mas confirma o “estatuto de país candidato”.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: clubeexpresso@expresso.impresa.pt

Comentários

Assine e junte-se ao novo fórum de comentários

Conheça a opinião de outros assinantes do Expresso e as respostas dos nossos jornalistas. Exclusivo para assinantes

Já é Assinante?
Comprou o Expresso?Insira o código presente na Revista E para se juntar ao debate
+ Vistas