Emmanuel Macron assumiu a paternidade da nova Comunidade Politica Europeia e terminou o primeiro encontro em Praga como um pai orgulhoso que junta à mesa todos os filhos, incluindo os que estão desavindos.
A reunião desta quinta-feira não sanou os conflitos existentes entre Arménia e Azerbaijão, nem o diferendo entre a Sérvia e o Kosovo ou a tensão entre a Turquia e a Grécia, mas o Presidente francês acredita que "são precisos encontros" como este para resolver os problemas entre os europeus.
Esta tarde, à margem dos trabalhos, mediou o "tête-à-tête" entre o primeiro-ministro arménio, Nikol Pashinyan, e o Presidente do Azerbaijão, Ilham Aliyev. A fotografia do encontro está em destaque no Twitter de Macron, com uma mensagem: "por uma paz duradoura no Cáucaso". À volta de uma mesa redonda, surgem Pashinyan e Aliyev a ouvir Macron falar.
O Presidente francês assume o protagonismo e desde já uma vitória: a de reunir 44 países europeus numa mesma cidade apesar da divergências. De Praga sai "uma mensagem de unidade", deixando claro que todos condenam a invasão russa da Ucrânia e "desfazendo as dúvidas" dos que achavam que a Europa estava dividida.
Aos 27 da UE juntaram-se 17 vizinhos. A foto de família tirada durante a tarde é um retrato de um continente sem a Rússia (e a Bielorrússia) e ao lado da Ucrânia. Para o primeiro-ministro português foi Moscovo que se isolou a si própria quando invadiu a Ucrânia. Já o homólogo polaco, Mateusz Morawiecki, afirma que "a reunião confirmou que a Rússia está totalmente isolada", não apenas em relação à UE mas também dos países com quem faz fronteira.
No Castelo de Praga, o Presidente ucraniano, Volodymir Zelensky foi um dos primeiros a fazer-se ouvir. Fê-lo por videoconferência, atirando novas acusações a Vladimir Putin e pedindo apoio para derrotá-lo em solo ucraniano. Quanto à Comunidade Política Europeia espera que ajude a restaurar a paz na Europa: "todos juntos temos de agir para que a fórmula da guerra seja completamente bloqueada, e a fórmula da paz seja completamente realizada".
A Alemanha reafirma que não são será aceite qualquer "anexação de uma parte de um país vizinho" e Macron garante que o apoio "financeiro, humanitário e militar" a Kiev é para continuar, empurrando para esta sexta os detalhes do apoio. (O tema volta a ser abordado esta sexta-feira na cimeira informal a 27).
CPE sem agenda, mas já com nova reunião marcada
O peso político dos 44 reunidos em Praga, numa altura em que a Rússia escala o conflito e sobe o tom da ameaça nuclear, tapa para já o vazio de uma declaração final que não existiu. Aliás, essa ideia esteve sempre fora da mesa face à dificuldade de acertar um acordo tão abrangente. Se a 27 é difícil, a 44 ainda mais.
Fica assim por definir no papel o que é a Comunidade Política Europeia e que agenda vai ter para os próximos anos, mas para Berlim é uma vantagem que todos este líderes possam continuar a reunir-se sem a pressão de chegarem a qualquer acordo ou de tomarem decisões. A CPE é para já um espaço livre de debate.
No entanto, existe o objetivo - ambicioso - de se reunirem duas vezes por ano, ficando já acordado que a próxima reunião é em Chișinău, capital da Moldova. Espanha e Reino Unido estarão interessados em organizar os seguintes.
Quanto aos "potenciais projetos a 44", Macron diz que podem passar pela proteção das "infraestruturas estratégicas europeias", como gasodutos e satélites, sobretudo depois dos ataques e da alegada sabotagem nos gasodutos nordstream 1 e 2. Há espaço também para uma maior cooperação em matéria de cibersegurança, na criação de um fundo de apoio à Ucrânia e em matéria de energia, para fazer baixar os preços.
Tanto o Azerbaijão como a Noruega são produtores de gás natural, e o objetivo da UE é não só ver-se livre da dependência do petróleo russo, como também estreitar relações com os chamados parceiros "de confiança". Em Praga, multiplicaram-se as reuniões bilaterais, entre elas a da Presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, com o primeiro-ministro norueguês.
Os dois concordaram "em desenvolver ferramentas" para estabilizar os mercados energéticos, "a fim de reduzir os preços excessivamente elevados de forma significativa a curto e longo prazo". (A renegociação de contratos de aquisição de gás mais favoráveis e em conjunto também está em cima da mesa esta sexta, juntamente com a possível imposição de um preço máximo ao preço do gás).
Mas nem tudo foi um mar de diplomacia. O presidente turco sai de Praga a dizer que não tem nada a falar com a Atenas. "Toda a política (grega) é baseada em mentiras, não são honestos. Não temos nada a discutir com a Grécia".
Recep Erdogan, citado pela Reuters, vai mais longe ao dizer que "Atenas compreendeu a mensagem de Ancara" quando disse "que uma noite poderia chegar sem avisar" à Grécia. O comentário foi feito pela primeira vez em setembro e foi visto pela Grécia e outros parceiros europeus como uma ameaça a um Estado vizinho. Em causa está a tensão nas águas do mar Egeu.
Lembra Macron que a "Europa produziu mais guerras do que é capaz de digerir". Agora quer acreditar que um novo formato e uma nova plataforma de diálogo pode fazer a diferença e contribuir para a segurança e paz no continente europeu. Mas o entendimento de alguns responsáveis europeus é que é preciso esperar ainda alguns anos para ver se dá resultado.
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