Exclusivo

Internacional

Do “circo” à “reprimenda” até à “guerra inevitável” de Steve Bannon

Do “circo” à “reprimenda” até à “guerra inevitável” de Steve Bannon
Tom Williams/Getty Images

O arquiteto do “Trumpismo” começou hoje a ser julgado por desrespeito pelo Congresso americano, uma “contravenção menor”, segundo a Justiça. Bannon ameaçou com mais violência

Do “circo” à “reprimenda” até à “guerra inevitável” de Steve Bannon

Ricardo Lourenço

Correspondente nos Estados Unidos

Steve Bannon usa sempre duas camisas sobrepostas, pretas de preferência. Três ou quatro esferográficas na lapela e um blazer daquela mesma cor completam a “farda de guerra”, descreve o próprio sempre que é questionado sobre a indumentária.

Hoje, à entrada do Tribunal distrital de Washington D.C., a poucos minutos do Capitólio, o ex-estratego-chefe da Administração Trump insistiu no traje, apesar da temperatura e humidade sufocantes. “Pronto para uma nova batalha”, afirmou, enquanto descia a rampa de acesso à entrada principal, minutos antes do início do seu julgamento (as primeiras horas serviram para selecionar os membros do júri).

Respondendo a duas acusações de desrespeito pelo Congresso, crimes classificados de “contravenções menores”, após recusar depor no Comité da Câmara dos Representantes que investiga a invasão da sede do Governo americano, a 6 de janeiro de 2021, Bannon pretenderá arrastar o caso. “Rezem pelos nossos inimigos”, avisou, numa nota enviada à imprensa, durante o fim de semana. “Responderemos em modo medieval. Iremos destruí-los”.

Frank Figliuzzi, antigo vice-diretor do FBI, assegura ao Expresso que se trata de “um exemplo claro de desrespeito pelo Congresso” e que, como tal, “não existe uma tentativa viável de defesa”.

Sendo assim, dada a previsibilidade do desfecho, como explicar a alegada tentativa de protelamento? “Teremos circo antes da decisão. É tudo tão simples que, em dois dias, o episódio ficaria resolvido, mas isso vai contra as necessidades e desejos de Bannon, que pretenderá adiar um desfecho por forma a desviar as atenções do seu chefe [Donald Trump], visado pelo Comité do Congresso”, diz Figliuzzi. “Bannon é o arquiteto, o treinador, o “quarterback” [jogador chave no futebol americano] de qualquer manobra liderada por Trump. É por isso que o Comité do Congresso quer ouvi-lo, visto que Bannon terá informação mais do que suficiente para ligar os pontos até agora dispersos da tentativa de golpe de Estado realizada a 6 de janeiro de 2021”.

“Manobra política conduzida por democratas”

No final do julgamento - os peritos ouvidos pelo Expresso dividiram-se sobre a previsível duração do mesmo -, Bannon receberá uma “reprimenda ou pouco mais”, adianta ao Expresso Matthew Galluzzo, antigo procurador do condado de Nova Iorque. “Mesmo que seja considerado culpado, a questão é que, no final, continuaremos sem ter acesso à papelada e ao tão necessário testemunho de Bannon sobre a invasão do Capitólio”.

Figliuzzi tem a mesma preocupação e acrescenta outra. “Bannon sairá destas audiências em glória, com discursos para as massas e a pregar aos convertidos. Porém, cautela, visto que ele poderá promover ações violentas, em função do desejo de querer acionar o que entende por modo medieval”.

Ao deixar as instalações do Tribunal distrital de Washington D.C., Bannon confirmou a atitude belicosa, classificando o processo de “manobra política conduzida por democratas” (o juiz encarregue do caso foi nomeado por Donald Trump).

Subjugação dos vencidos

Bannon convenceu-se de que a tal “farda de guerra” deixou de simbolizar algo abstrato. Segundo o arquiteto do “Trumpismo”, um conflito sangrento entre as forças pró e anti-Trump é inevitável. Num episódio recente do seu podcast “War Room”, durante uma entrevista ao advogado Alan Dershowitz, um liberal do Massachusetts que, no entanto, entende que Trump está a ser perseguido, daí tê-lo defendido no segundo processo de “impeachment”, Bannon mostrou-se irado.

Apesar de Dershowitz insistir na ideia de que “a América não sobreviverá se os seus líderes colocarem os partidos acima dos princípios”, o “grande manipulador” (rótulo dado pela revista “Time”) mostrou-se, repetidamente, incomodado com o argumento. Seguiu-se uma interrupção abrupta. “Essa ideia de nos sentarmos à mesa e dar as mãos… Tenho uma visão da História muito diferente, da Revolução à Guerra Civil, passando pela Grande Depressão e Segunda Guerra Mundial. A guerra é inevitável. Um dos lados vencerá e o outro perderá. Voltaremos a estar unidos depois disso, com os vencedores a estipularem as condições”.

Quanto ao julgamento, e em caso de condenação, Bannon incorre numa pena que pode ir de 30 dias a um ano de prisão. Contudo, na última vez que um indivíduo respondeu pelo mesmo crime, há mais de 40 anos, o magistrado em causa decretou apenas a obrigatoriedade de apresentação semanal junto das autoridades durante um período de dois meses.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: correspondenteusa@expresso.impresa.pt

Comentários
Já é Subscritor?
Comprou o Expresso?Insira o código presente na Revista E para se juntar ao debate