Exclusivo

Internacional

Das presidenciais às legislativas: os desafios para o “Renascimento” de Macron

Uma coabitação de Macron com Mélenchon poderá levar, não só a uma paralisia do sistema de governo, mas também à erupção, porventura caótica, da cólera que ressoa na sociedade francesa

Macron acaba de iniciar o seu segundo mandato na presidência francesa e enfrenta dentro de uma semana outro desafio eleitoral, com um partido rebatizado de “Renascimento.” Na primeira e segunda volta das próximas legislativas, a 12 e 19 de junho, o chefe do Eliseu perderá, ou não, a sua maioria parlamentar. Os franceses irão escolher um candidato em cada circunscrição, num modo de voto semelhante ao das presidenciais. Em França, este resultado dita a capacidade de o Presidente levar a cabo o seu programa político.

Sem maioria, Macron será porventura obrigado a governar em “coabitação” com um primeiro ministro que reflita a distribuição partidária dos assentos parlamentares. Os três casos na história da Vª República Francesa deram preponderância aos governos em detrimento da liderança presidencial, afetando os mandatos do socialista Mitterrand (1986-1988 e 1993-1995) e do gaulista Chirac (1997-2002). No entanto, a redução de sete para cinco anos do mandato presidencial e a sequência eleitoral permitiram eliminar esta possibilidade, até agora.

Para além de questões ambíguas e constitucionais sobre a sede do poder em França – localizada na interação entre o governo e a Assembleia Nacional ou na liderança presidencial - os desafios para Macron são, hoje, ampliados por um contexto nacional e internacional voláteis.

Na passada segunda-feira, Mélenchon (terceiro mais votado nas presidenciais de abril), lançou uma iniciativa que faz eco às profundas questões de sociedade que tanto marcaram a nebulosidade da campanha presidencial. Criou um “Parlamento” para a nova coligação das esquerdas. Na “Nupes” (para Nouvelle Union Populaire et Sociale), socialistas, ecologistas e comunistas alinham com a extrema esquerda dos “insubmissos”. Nos termos do seu líder, visa uma implicação popular massiva na discussão do futuro dos franceses.

Mas o terreno da “linguagem do povo” é também ocupado por Le Pen na extrema direita que, apesar de ter arrancado mais tarde a campanha das legislativas, tem expectativas de criar um grupo parlamentar na senda do seu sucesso político crescente (segunda mais votada nas presidenciais), e da boa comunicação sobre o tema do poder de compra.

O pano de fundo da guerra na Ucrânia e os seus impactos globais pressionam também esta campanha, assim como o recém-nomeado governo de Macron, em jeito de crise permanente, que se acumula às crises supervenientes, como o fiasco da gestão do afluxo de adeptos de futebol em Paris para a final da Liga dos Campeões.

Qual é o realismo do apelo de Mélenchon para que as legislativas sejam a terceira volta das presidenciais capazes de o “eleger” primeiro ministro? Começa, de facto, com os “Nupistas” que se perfilam para serem a segunda maior força política no hemiciclo. Caso Macron tenha de coabitar com Mélenchon, poderá ainda recorrer ao poder de dissolução da Assembleia ou à simples ameaça do seu uso. Isso não irá resolver a dificuldade de ambos para tomar medidas políticas e poderá levar, não só a uma paralisia do sistema de governo, mas também à erupção, porventura caótica, da cólera que ressoa na sociedade francesa.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: clubeexpresso@expresso.impresa.pt

Comentários
Já é Subscritor?
Comprou o Expresso?Insira o código presente na Revista E para se juntar ao debate