Tom Moore, veterano da II Guerra Mundial que se tornou célebre em todo mundo por ter conseguido angariar 39 milhões de libras (44,2 milhões de euros) para o serviço nacional de saúde do Reino Unido (NHS, na sigla inglesa), morreu com covid-19. Foi essa doença que o levou a dedicar-se à causa de ajudar os serviços de saúde.
Moore, que viveu 100 anos, fez a sua própria maratona, mas muito lentamente, às voltas ao quintal de casa, apoiado num andarilho. Esse gesto emocionou milhares de pessoas, que decidiram doar largas somas para acompanhar o seu esforço.
“É com grande tristeza que anunciamos a morte de nosso querido pai, o capitão Sir Tom Moore. Estamos muito gratos por ter estado com ele nas últimas horas da sua vida; Hannah, Benjie e Georgia ao lado da sua cama e Lucy no FaceTime. Passámos horas à conversa com ele, relembrando a nossa infância e nossa maravilhosa mãe. Partilhámos risos e lágrimas juntos”, escreveram as filhas Hannah e Lucy Moore num comunicado enviado à imprensa.
O último ano de vida de Moore foi decerto muito diferente do que o próprio teria previsto, por muito otimista que fosse (e era, segundo dezenas de relatos que foram surgindo nos jornais e redes sociais). Na primeira fase da pandemia, o militar jubilado deu 100 voltas pelo quintal de sua casa. Por cada uma recebia donativos de milhares de populares, via Internet.
A 17 de julho Moore foi ordenado cavaleiro pela rainha Isabel II, numa curta cerimónia no castelo de Windsor. A frase que usou para descrever um momento tão solene trouxe gargalhadas, tão úteis em temos de coronavírus: “Pedi desculpa por não me ajoelhar, se o fizesse nunca mais me levantava”.
A ideia de Moore, no início do primeiro confinamento, era angariar apenas 1000 libras (1135 euros), uma ajuda simbólica aos profissionais de saúde que o tinham ajudado a sobreviver a um cancro. Depressa, porém,a sua imagem, a caminhar sem parar mas bastante curvado, sobre o andarilho, converteu-se em imagem da resiliência de um país.
O dinheiro começou a chover na conta bancária que recebia os donativos. Na última semana do desafio, percorreu os metros que faltavam para o seu objetivo, envergando um casaco militar pejado de medalhas.
No seu centésimo aniversário, celebrado a 30 de abril de 2020, dois aviões da Força Aérea cruzaram os céus em sua homenagem e mais de 140 postais de aniversário chegaram de todo o mundo para felicitar o militar. Hoje, o seu nome está pintado num comboio de alta velocidade e os serviços de correio britânicos emitiram um selo em sua honra. Dia 30 de abril, Moore atingiu o marco das 30 milhões de libras doadas.
Mas o veterano não parou por aí. Em dueto com o artista britânico Michael Ball e vários grupos corais do SNS britânico, apresentou uma versão de “You'll never walk alone”, canção de um musical pós-guerra que se tornou hino para os fãs do Liverpool. A faixa chegou ao primeiro lugar dos tops em todo o país.
O primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, disse na altura em que Moore recebeu o título de cavaleiro que os seus “esforços heróicos” tinham conseguido “erguer o espírito de toda a nação”. Já o príncipe William, neto de Isabel II, chamou-lhe “máquina de angariar fundos”.
A proeza valeu-lhe duas entrada para o livro de recordes do Guinness: uma por ser a pessoa mais velha a ter uma música no primeiro lugar dos tops britânicos, outra por se ter tornado a pessoa que mais dinheiro angariou numa caminhada sozinho.
“O último ano da vida de nosso pai foi nada menos que notável. Rejuvenesceu e experimentou coisas que sempre sonhara. Embora presente em tantos corações por um curto espaço de tempo, foi um pai e avô incrível e permanecerá vivo nos nossos para sempre”, disseram ainda as filhas em comunicado.
Nascido em Keighley, Yorkshire, a 30 de abril de 1920, Moore foi aprendiz de engenheiro civil antes de ingressar no exército. Em 1940 ascendeu ao posto de capitão e posteriormente foi destacado para a Índia. Serviu no estado de Arakan, no oeste do atual Myanmar (na altura Birmânia, hoje estado Rakhine), e foi com seu regimento para Samatra após a rendição japonesa.
Regressou ao Reino Unido e tornou-se instrutor na Escola de Veículos de Combate Blindados em Bovington, Dorset, no sul de Inglaterra. No final da vida, galvanizou um país abalado.
Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: afranca@impresa.pt