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Mike Pence e Mitch McConnell abandonam Donald Trump mas milhares tentam invadir Capitólio para o defender

Mike Pence e Mitch McConnell abandonam Donald Trump mas milhares tentam invadir Capitólio para o defender
Bill Clark

Milhares de pessoas tentaram invadir esta quarta-feira o Capitólio dos Estados Unidos, onde uma sessão conjunta no Senado discutia a confirmação de Joe Biden como Presidente. Várias conseguiram, e os participantes foram obrigados a fecharem-se dentro dos seus escritórios. Donald Trump falou horas antes, inspirando uma revolta generalizada dos seus apoiantes contra o que consideram ser uma eleição presidencial fraudulenta

Em atualização

Mike Pence e Mitch McConnell abandonam Donald Trump mas milhares tentam invadir Capitólio para o defender

Ana França

Jornalista da secção Internacional

A polícia de Washington D.C. não está a conseguir lidar com a tentativa de milhares de pessoas de invadir o Capitólio norte-americano, em revolta contra o que consideram uma eleição roubada pelo Presidente eleito Joe Biden - uma mentira que Donald Trump, ainda Presidente dos Estados Unidos, repetiu várias vezes no discurso que antecedeu estes desacatos.

Uma hora antes de o Congresso norte-americano se reunir para contar e confirmar oficialmente os votos depositados no Colégio Eleitoral - a última formalidade na consagração da nova Administração do Presidente eleito Joe Biden - Donald Trump, que ainda é Presidente, falou para milhares de apoiantes no relvado atrás da Casa Branca, durante mais de uma hora, e por diversas vezes tentou colocar pressão pública sobre o seu vice-Presidente, Mike Pence, para que este se recusasse a certificar Biden como 46º Presidente dos Estados Unidos.

Já com os microfones ligados, com as televisões norte-americanas em direto do Capitólio, de repente ouve-se Pence a fazer uma pergunta a alguém ao seu lado, pensando porventura que ainda não havia ninguém a escutar: “A minha carta seguiu, certo?” Tinha seguido, sim, como um míssil disparado às últimas esperanças de Trump, que ainda estava a falar quando o seu vice decidiu comunicar ao mundo que não iria negar-se a certificar a eleição, como o seu Presidente lhe tinha pedido várias vezes que fizesse.

Nessa carta ao Congresso, Pence diz não acreditar possuir autoridade para mudar o curso da eleição: "É minha opinião ponderada que o meu juramento em apoiar e defender a Constituição me impede de reivindicar autoridade unilateral para determinar quais os votos eleitorais deveriam ser contados e os que não deveriam”.

Trump havia dito, talvez nem meia hora antes desta carta de Pence, que estava nas mãos do senador trazer a vitória para o lado republicano: “Se Mike Pence fizer a coisa certa, nós vencemos a eleição e vocês serão um grupo de gente muito feliz”, disse Trump aos apoiantes reunidos em Washington D.C. Mas parece que Pence tem um amor maior, ou pelo menos um não tão passageiro quanto Trump. “Como um estudante de história que ama a Constituição e idolatra os seus autores, não acredito que os fundadores do nosso país pretendessem investir o vice-presidente de autoridade unilateral para decidir qual os votos eleitorais devem ser contados durante a Sessão Conjunta do Congresso, e nenhum vice-presidente na história americana jamais afirmou tal autoridade”, escreveu numa carta de duas páginas divulgada pela Casa Branca por volta das 13h (18h em Portugal continental).

Há alguma possibilidade de esta sessão se tornar um problema para Biden?

Há praticamente zero probabilidade de alguma coisa de muito determinante acontecer nesta sessão. Para que estas objeções pudessem surtir o efeito que os republicanos parecem querer - uma anulação da vitória de Biden até que um inquérito àquilo que classificam como “fraude eleitoral generalizada” seja concluído - seria preciso que tanto a Câmara dos Representantes quanto os senadores lhes fossem favoráveis, o que é praticamente impossível que aconteça na medida em que a maioria da Câmara baixa do Congresso norte-americano repousa em mãos democratas.

“Fora um evento totalmente cataclísmico, tudo isto vai acabar com Biden eleito Presidente”, foi a frase que a correspondente do “New York Times” na Casa Branca Maggie Haberman usou como alfinete no balão das expectativas republicanas que se iam entoado cá fora ao som dos mantras de Donald Trump - “a culpa é das grandes empresas de tecnologia”, “roubaram-nos a eleição”, “é a maior fraude de sempre na História dos Estados Unidos” e outros que tem repetido em vários dos comícios e entrevistas desde que perdeu as presidenciais para Joe Biden a 3 de novembro de 2020.

Parece que Trump perdeu também Mitch McConnell, líder da maioria republicana no Senado que em breve pode passar a ser líder da minoria republicana no Senado dada a vantagem que os democratas neste momento parecem reter nas duas segundas-voltas para a escolha dos dois senadores da Geórgia.

O discurso de McConnell, um dos últimos republicanos de peso a parabenizar Biden pela vitória, foi duríssimo não só para quaisquer resquícios de esperança que Trump ainda pudesse ter de ver o Grand Old Party quebrar a Constituição para ficar do seu lado, como para todos os republicanos que ainda insistem nestas manobras “profundamente danosas para a democracia, agora e durante muitos anos”, disse McConnell, apelando também ao fim das “abrangentes teorias da conspiração” sobre umas eleições que, no seu entender, não têm sobre si qualquer nuvem de ilegalidade.

“Não há nada diante de nós que possa provar ilegalidades a uma escala passível de poder derrubar toda a eleição. Só a perceção pública não pode justificar o que se está a passar aqui, especialmente porque as dúvidas foram semeadas sem qualquer base factual”, disse McConnell, com um semblante zangado, como se tivesse a falar diretamente para Trump ouvir. Pence sentir-se-á talvez um pouco mais calmo depois deste discurso, ao menos serão os dois traidores aos olhos do rei.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: afranca@impresa.pt

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