O presidente do American Club de Lisboa, Patrick Sieger-Lathrop, acredita que haverá uma transição pacífica de poder depois das presidenciais dos EUA, mas explica o que pode acontecer num cenário de disputa hostil de resultados eleitorais.
Aos 78 anos, Patrick Sieger-Lathrop já passou por suficientes eleições nos Estados Unidos para poder dizer que todas são importantes, embora reconheça que a disputa entre o republicano Donald Trump e o democrata Joe Biden, no dia 03 de novembro, está a ser vivida num momento particularmente delicado para a vida política do seu país.
Em entrevista à Lusa, o presidente do American Club de Lisboa lembra que as sondagens parecem indicar uma vitória confortável de Biden, que retiraria de vista cenários mais extremados de adiamento de declarações de derrota ou de contestação de vitórias obtidas por margens diminutas, e mostra confiança na fiabilidade das previsões que dão cerca de sete a oito pontos de vantagem ao candidato democrata.
Ainda assim, Sieger-Lathrop não elimina o risco de Trump poder criar problemas no momento do desfecho eleitoral.
Autor do livro "Rendez-vous com a América: uma explicação do sistema eleitoral americano", Sieger-Lathrop sabe bem dos riscos de uma eleição com resultados que sejam questionados por uma das partes, como já admitiu fazer o Presidente em exercício, Donald Trump, alertando para a possibilidade de fraude na contagem de votos, em particular com um número elevado de votos por correspondência.
Contudo, o presidente do American Club de Lisboa sabe também que a Constituição apresenta numerosas soluções que evitem uma crise institucional, embora não garanta impedir uma crise social, provocada por divisões entre fações políticas rivais e com atitudes extremadas.
Patrick Sieger-Lathrop está à frente do American Club de Lisboa há cerca de dois anos e tem uma longa carreira como empresário, banqueiro de investimento, consultor e professor, vivendo em Portugal desde 2008, depois ter trabalhado em vários países, em vários projetos em empresas e organizações não-governamentais.
O seu livro -- uma obra de autor independente que procura fazer um retrato da complexa máquina do sistema eleitoral nos EUA -- mostra como estão previstos os mais diferentes cenários para desfechos eleitorais, com complexas soluções e elaboradas "válvulas de escape" para situações imprevisíveis.
"Com um elevado número de votos por correspondência, que demoram dias ou semanas a contar, o resultado final da eleição pode não ser conhecido em 03 de novembro", explica o especialista em sistema eleitoral, referindo-se à necessidade de precaver a possibilidade de nenhum dos candidatos poder conceder a vitória ao adversário nessa mesma noite.
Donald Trump tem repetido, numerosas vezes, que não confia no sistema eleitoral perante uma avalanche de votos por correspondência e pediu mesmo aos eleitores republicanos para estarem atentos ao que se passar no dia 03 de novembro.
Perante um cenário de disputa hostil de resultados, Joe Biden montou um gabinete de crise com cerca de uma centena de advogados, a trabalhar a tempo inteiro nos vários cenários no 'day after' das presidenciais, para evitar que os republicanos usem a influência da Casa Branca e da maioria no senado para distorcer o desfecho das eleições.
Patrick Sieger-Lathrop explica que, perante uma disputa hostil de resultados, o processo possa ser arrastado até ao Congresso, que terá de se reunir no dia 06 de janeiro próximo para tomar uma decisão sobre quem será o próximo Presidente dos EUA.
E, nesse caso crítico, o colégio eleitoral que escolhe o Presidente é composto pelos representantes eleitos, tendo cada um dos 50 estados direito a um voto (mesmo que alguns deles tenham eleito mais deputados).
Nesse caso, perante o atual cenário na câmara de representantes, os republicanos têm vantagem, já que os republicanos controlam as delegações de 26 estados, contra 23 dos democratas (e um estado com um empate), apesar da maioria democrata em termos totais de representantes.
Ainda por cima, dos nove estados 'swing' (os estados com eleitorado volúvel, que pode transitar facilmente de um para outro partido), oito estão sob o controlo de republicanos, pelo que se um ou vários deles decidirem contestar resultados (cuja margem de diferença costuma ser diminuta) o partido do Presidente fica facilmente em situação de vantagem.
Neste caso, o Presidente escolhido pelo colégio eleitoral do Congresso em ambiente hostil será Donald Trump, mesmo que os democratas contestem os resultados e não queiram reconhecer a legitimidade do candidato republicano.
Patrick Sieger-Lathrop diz, contudo, que mesmo esse cenário não implica inevitavelmente uma crise social, mesmo admitindo que houvesse protestos nas ruas.
"Se houvesse protestos, eles seriam sempre pacíficos", conclui este especialista no sistema eleitoral norte-americano, que confia no modelo político dos EUA e na eficácia dos seus mecanismos de equilíbrio e controlo do poder ("checks and balances") para evitar crises políticas, apesar de reconhecer a vertente emotiva das opções partidárias.
"O voto dos eleitores nas presidenciais é sempre muito emotivo. As pessoas votam com as emoções", disse Sieger-Lathrop, para explicar o caráter imprevisível e pouco racional do ato eleitoral, tentando também compreender por que motivos os candidatos não se podem apenas diferenciar pelas suas ideias, mas também pelas suas personalidades.
Esse caráter emotivo, presente no lado republicano e democrata, ajuda a entender as clivagens políticas, mas o presidente do American Club de Lisboa acredita que o sistema político norte-americano incorporaria a agitação social.
Por outro lado, Sieger-Lathrop olha para as sondagens e verifica que elas estão estáveis na vantagem que dão a Joe Biden, além de que já foram alvo de correções e aperfeiçoamentos que deverão eliminar o risco de falharem como falharam nas eleições de 2016, quando, a poucas semanas das eleições, previam a vitória da democrata Hillary Clinton, contra Trump.
O presidente do American Club de Lisboa explica que várias empresas de sondagens fizeram uma calibragem no peso da formação académica das amostras de eleitores, que permite melhor antecipar o comportamento do eleitorado.
Por outro lado, este especialista recorda que as sondagens mostram um número muito mais reduzido de indecisos, nesta altura de campanha, o que também contribuirá para uma maior fiabilidade das previsões.
"Até porque, agora, já não há o desconhecimento sobre quem é Donald Trump que existia há quatro anos", conclui Patrick Sieger-Lathrop.