Os documentos diplomáticos não enganam: a confiança da União Europeia em Boris Johnson parece ter-se esgotado, num momento em que nova ronda de negociações começa em Londres, para definir os termos do Brexit. A Irlanda do Norte continua a ser um dos pontos mais sensíveis do divórcio e a presidente da Comissão Europeia avisa que o Reino Unido deve cumprir o protocolo relativo àquele território.
Ursula von der Leyen adverte que o Governo londrino deve respeitar o direito internacional, apesar de ter usado o Twitter para expressar esperança no êxito das negociações. “Confio no Governo britânico para aplicar o acordo de saída, uma obrigação ao abrigo da lei internacional e pré-requisito para qualquer parceria futura”, escreveu, naquela rede social , a chefe da Comissão Europeia.
“O protocolo sobre a Irlanda/Irlanda do Norte é essencial para proteger a paz e a estabilidade na ilha, bem como a integridade do mercado único”, sentenciou ainda Von der Leyen.
Esta é a posição diplomática que a UE pretende transmitir, mas documentos confidenciais enviados a vários executivos europeus, a que o diário “The Guardian” teve acesso, revelam total descrédito nas negociações com o Governo de Boris Johnson.
“Jonhson é suspeito de hesitar em encontrar um compromisso sobre as questões-chave pendentes”, como as pescas ou apoios estatais, indicam os documentos. Os mesmos dão conta de que a situação é “preocupante” e que “esses pontos não serão fáceis de resolver com um simples telefonema entre outros líderes”.
A Comissão Europeia “teme que a ministra do Interior britânica, Priti Patel, tente contornar Bruxelas e abra negociações paralelas sobre segurança interna, após convidar ministros dos cinco maiores estados-membros da UE para uma reunião em Londres, a 22 de setembro".
Os referidos documentos confidenciais revelam que “funcionários da Comissão Europeia pediram aos países que evitem aceitar qualquer proposta britânica que seja então feita”. As mensagens, enviadas às capitais europeias, revelam que o executivo comunitário “receia que Downing Street [sede do Governo do Reino Unido] esteja por detrás de um manancial de artigos anti-UE na imprensa britânica, citando reportagens que acusam Bruxelas de intransigência antes da última ronda negocial”.
Acordo até 15 de outubro... ou nada feito
Também do lado do Reino Unido a desconfiança é grande, com Boris Johnson a dizer que “o acordo do Brexit nunca fez sentido”, considerando-o “contraditório” e “ambíguo”, sobretudo por acreditar que este pode deixar a Irlanda do Norte isolada da Grã-Bretanha. O acordo de saída foi negociado com os 27, recorde-se, pelo Governo do próprio Johnson.
O negociador-chefe da UE, o francês Michel Barnier, chega a Londres na manhã desta terça-feira, onde se reunirá com o primeiro-ministro do Reino Unido. O seu homólogo britânico, David Frost, frisa que é hora de a União reconhecer a “realidade” de que o Reino Unido é um Estado soberano. Em jeito de ultimato, atira: “Vamos passar a mensagem clara de que teremos de fazer avanços esta semana se queremos chegar a acordo a tempo”.
O Reino Unido saiu da UE no passado dia 31 de janeiro. Até final de 2020 mantêm-se em vigor os regulamentos que valiam enquanto foi membro da UE, mas a partir de 1 de janeiro a realidade será aquela que as partes acordarem até lá. Johnson indicou há dias que caso não haja acordo até 15 de outubro o melhor será abandonar as negociações.
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