Esta quinta-feira de manhã, o acesso ao Hotel Dunia Azalai-24 de Setembro, antiga messe de oficiais nos anos da colonização portuguesa, no bairro de Santa Luzia, parece mais o de um campo fortificado. Desde a madrugada, homem fardados e com pistolas-metralhadoras ocuparam as proximidades, incluindo o cruzamento da estrada que conduz ao centro de Bissau, a cerca de cinco quilómetros. Os taxis não entram e as outras viaturas são revistadas minuciosamente. As pessoas têm de mostrar convite.
Este local é esta quinta-feira o centro de gravidade da vida política guineense, em virtude da anunciada investidura do candidato presidencial Úmaro Sissoco Embaló, cerimónia que, a realizar-se, equivaleria a uma “tentativa de golpe de Estado”, segundo o primeiro-ministro guineense Aristides Gomes.
Com efeito, Sissoco Embaló, cuja vitória nas eleições presidenciais de 29 de dezembro último ainda é objecto de contestação judicial por parte do seu adversário, decidiu organizar a sua própria investidura, sem esperar pela decisão do Supremo Tribunal, nem pela tradicional sessão solene especial de empossamento no Parlamento.
Ontem a noite, um comunicado do Governo, em tom vagamente intimidatório, afirmava que perante “a deriva dos apoiantes do candidato Úmaro Sissoco”, o Governo apelou as Forças de Defesa e Segurança a assumirem o seu papel de “garante da ordem pública, a fim de prevenir eventuais consequências que poderão advir da tentativa de subversão dos valores democráticos”.
Indiferentes a esta posição e, aparentemente apoiados por um sector do Exército, os promotores do ato de posse, constestado também pelo próprio presidente da Assembleia Nacional Popular (ANP), o Parlamento guineense, parecem decididos a instalar Sissoco no palácio presidencial. A posse está agendada para as 11h locais, a mesma hora em Lisboa. E não é visível nenhum dispostivo das autoridades para contrariar esta cerimónia.
Apesar da tensão suscitada por esta iniciativa, as atividades diárias prosseguem normalmente. Os Ministérios trabalham, e foi suspensa a greve dos transportes, que ontem paralisou o país.
Segundo os rumores que circulam em Bissau, o primeiro ato de Sissoco, depois da sua investidura, será a publicação de um decreto presidencial para demitir o actual chefe de Governo, Aristides Gomes. Se isto acontecer, a Guiné-Bissau vai voltar à estaca zero, isto é, regressa ao ciclo de instabilidade governamental, cerca de sete meses após a entrada em funções deste executivo. O Expresso soube ainda que o primeiro-ministro terá enviado uma carta a todos os embaixadores estrangeiros acreditados em Bissau, com o pedido para não participarem na cerimónia de posse de Sissoco. Até este momento nenhum diplomata se encontra no local.
Nos dois dias que antecederam esta investidura, o presidente do Parlamento, Cipriano Cassamá, também esteve reunido com os representantes da comunidade internacional, nomeadamente o chamado grupo dos P5 (Nações Unidas, União Africana, União Europeia, Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental e CPLP), assim como com os embaixadores da China e França, aos quais tentou convencer da ilegalidade da posse de Sissoco.
Notícia atualizada às 14h21
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