Duas semanas após o início dos protestos no Líbano, o primeiro-ministro, Saad Hariri, anunciou esta terça-feira que iria apresentar a sua demissão, “em resposta aos muitos libaneses que saíram para as ruas”. As manifestações contra o aumento dos impostos – mas não só – levaram ao encerramento de bancos, escolas e universidades.
Entre os impostos a aumentar constava uma taxa por utilização do serviço de troca de mensagens WhatsApp. No entanto, milhares de libaneses saíram às ruas para protestar também contra o mau funcionamento do país e a corrupção governamental.
Veja aqui cinco perguntas e respostas para entender os protestos no Líbano, considerados “os maiores e mais diversos” desde a independência do país.
Para avaliar a situação política e social após o anúncio da demissão do primeiro-ministro, o Expresso falou com Heiko Wimmen, diretor para o Líbano do International Crisis Group, uma organização não-governamental que se dedica à prevenção de conflitos armados internacionais.
Como reage à demissão do primeiro-ministro libanês?
É uma vitória parcial. A exigência mais crucial é a formação de um Governo independente e a realização de novas eleições no médio prazo. Mas é certamente um enorme incentivo moral.
Quais são as consequências desta demissão?
O Governo é considerado demitido a partir do momento em que o primeiro-ministro apresenta a sua demissão. Se o Presidente Michel Aoun se recusasse a aceitá-la, isso abriria uma crise institucional. Não é claro se tal rejeição tem consequências legais, mas tendo a pensar que não. Tecnicamente, Hariri deverá agora tornar-se chefe de um Governo interino, o que carece de um decreto presidencial, que é a única coisa que Aoun se pode recusar a fazer. Uma crise institucional levaria a um impasse imediato e demolidor. O sistema é muito centralizado, pelo que não pode funcionar em piloto automático. Não consigo imaginar que Aoun faça isso, embora ele seja conhecido como alguém extremamente teimoso e parece não estar no seu melhor ultimamente – por isso, quem sabe? Chegou a hora do Parlamento. Os deputados serão recebidos pelo Presidente para declararem as suas preferências para um candidato a primeiro-ministro, que terá então de formar Governo. O Executivo terá provavelmente de ser composto por figuras públicas independentes e credíveis para convencer os manifestantes de que representa uma mudança efetiva. Terá de haver novas eleições em breve. Um novo partido abrangente de centro-esquerda deverá sair-se bem. Alguns dos partidos sectários identificados com a confusão atual serão castigados. O Hezbollah também deve sair-se bem.
E no plano financeiro?
Paira sobre a cabeça de todos o colapso iminente de todo o sector financeiro. O novo Governo precisará do apoio incondicional de todas as forças políticas para gerir a crise, em particular para aliviar os receios de um colapso financeiro. Os bancos estão fechados há 12 dias. Fontes credíveis dizem-me que já começou uma corrida silenciosa, com financiadores influentes a desembolsarem enormes quantias de dinheiro em práticas de nepotismo. Essa é a bola de fogo em que ninguém quer tocar.
O que se pode esperar do Hezbollah?
O Hezbollah é o joker nesta equação. Até agora, os seus militantes limitaram-se a enviar capangas para acabar com os protestos, agarrando-se àquela que é a sua posição política mais confortável de sempre no país. No início dos protestos, o secretário-geral do Hezbollah, Hassan Nasrallah, disse que eles também podiam ir para as ruas para exigir que as suas exigências fossem atendidas. Eles podem fazê-lo e a situação torna-se perigosa – só Deus sabe onde isso nos levaria. Ou podem aceitar que as peças estão a mover-se, apoiar um Governo de salvação nacional e pressionar também para a realização de novas eleições. Eles não têm verdadeiramente nada a temer dessas eleições.
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