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Trump ordenou retenção de quase $400 milhões em ajuda militar à Ucrânia antes de telefonema polémico

Trump ordenou retenção de quase $400 milhões em ajuda militar à Ucrânia antes de telefonema polémico
Drew Angerer/Getty Images

Durante a chamada telefónica, Trump terá pressionado o seu homólogo ucraniano, Volodymyr Zelensky, a investigar o filho de Joe Biden. O ex-vice-Presidente é o pré-candidato democrata mais bem colocado para as eleições do próximo ano. O Presidente norte-americano nega quaisquer irregularidades mas Zelensky não terá o mesmo entendimento

Trump ordenou retenção de quase $400 milhões em ajuda militar à Ucrânia antes de telefonema polémico

Hélder Gomes

Jornalista

O Presidente dos EUA, Donald Trump, instruiu o seu chefe de gabinete interino, Mick Mulvaney, a reter quase 400 milhões de dólares (364 milhões de euros) em ajuda militar à Ucrânia pelo menos uma semana antes de um telefonema com o seu homólogo ucraniano que tem gerado polémica. Nele, Trump terá pressionado Volodymyr Zelensky a investigar o filho de Joe Biden. O antigo vice-Presidente é o candidato mais bem colocado para conseguir a nomeação democrata nas eleições do próximo ano em que Trump procura a reeleição.

A instrução para reter aquela quantia foi confirmada por três altos funcionários da Administração, citados pelo jornal “The Washington Post”.

Funcionários do Gabinete de Gestão e Orçamento transmitiram a ordem de Trump ao Departamento de Estado e ao Pentágono durante uma reunião entre agências em meados de julho. De acordo com fontes que falaram sob anonimato, o Presidente manifestou “preocupações” e pretendia analisar se o dinheiro precisava de ser gasto. Os funcionários da Administração terão sido instruídos a dizer aos congressistas que os atrasos faziam parte de um “processo interagências” mas para não darem informações adicionais. Este padrão terá continuado durante quase dois meses, até que a Casa Branca libertou os fundos a 11 de setembro.

Segundo um outro alto funcionário da Administração, a decisão de Trump de reter os fundos baseava-se nas suas preocupações sobre a existência de “muita corrupção na Ucrânia” e a decisão posterior de os libertar deveu-se à proximidade do fim do ano fiscal, a 30 de setembro. Havia o receio de que se não gastassem o dinheiro, estariam a infringir a lei, revelou a fonte, pelo que o Presidente acabaria por dar ao diretor interino do Gabinete de Gestão e Orçamento, Russell Vought, autorização para libertar o dinheiro. Contudo, esta segunda fonte nega enfaticamente qualquer relação entre o bloqueio da ajuda e a pressão sobre Zelensky para investigar a família Biden.

O ex-conselheiro para a segurança nacional John Bolton queria libertar o dinheiro por acreditar que isso ajudaria a Ucrânia e simultaneamente restringiria a agressão russa. Além de Bolton, vários outros funcionários da Administração revelaram não saber por que motivo a ajuda tinha sido cancelada ou por que razão não tinha sido agendada uma reunião. A decisão foi comunicada a funcionários do Estado e da Defesa a 18 de julho, revela uma outra fonte ouvida pelo “Washington Post”. A chamada telefónica entre os Presidentes americano e ucraniano decorreu a 25 de julho.

Pelosi alude pela primeira vez a ‘impeachment’ de Trump

A presidente da Câmara dos Representantes, a democrata Nancy Pelosi, apelou este domingo à divulgação do relatório de um denunciante que alegadamente alertou para os pedidos de ajuda eleitoral de Trump a Zelensky. Numa carta enviada ao Congresso, Pelosi deixa claro que espera que o diretor interino dos serviços de informação nacional, Joseph Maguire, divulgue o documento quando comparecer perante a comissão de informação na próxima quinta-feira. Caso contrário, poderá inaugurar-se “um novo e grave capítulo de ilegalidade”, sublinha.

Nancy Pelosi, presidente da Câmara dos Representantes
Aurora Samperio/NurPhoto/Getty Images

O bloqueio da Administração à divulgação da queixa significa levar Maguire a violar os estatutos federais, que afirmam inequivocamente que o diretor dos serviços está obrigado a partilhar com o Congresso a informação de que dispõe, descreve Pelosi. “O Governo está a pôr em risco a nossa segurança nacional e a provocar um efeito aterrador sobre qualquer futuro denunciante que se deparar com um procedimento incorreto”, sinaliza na missiva.

A líder democrata também exorta os republicanos a juntarem-se-lhe no apelo à divulgação do relatório. Ao concluir a carta, Pelosi alude à possibilidade de ‘impeachment’ (destituição) presidencial, alertando que qualquer esforço continuado para bloquear a chegada da queixa ao Congresso conduzirá a “um novo estágio da investigação”. Até agora, a democrata tem-se abstido de apoiar um processo de ‘impeachment’ de Trump.

Para Zelensky não foi “uma chamada telefónica perfeita”, como diz Trump

Senadores republicanos já disseram que a ajuda à Ucrânia esteve suspensa enquanto a Administração avaliava se Zelensky era pró-russo ou pró-ocidental. A Casa Branca acabou por libertar o dinheiro depois de o senador democrata Richard Durbin ter ameaçado congelar 5 mil milhões de dólares (4,5 mil milhões de euros) em financiamento ao Pentágono para o próximo ano, a menos que o dinheiro para 2019 fosse distribuído, acrescentaram.

No entanto, o senador Robert Menendez, o mais destacado democrata na comissão das Relações Exteriores, falou esta segunda-feira em potencial “extorsão”, acusando Trump de tentar “remodelar a política externa americana” para promover os seus objetivos pessoais e políticos.

Volodymyr Zelensky, Presidente da Ucrânia
Danil Shamkin/NurPhoto/Getty Images

Trump voltou a negar quaisquer irregularidades, sublinhando que a sua conversa de 25 de julho com Zelensky foi “uma chamada telefónica perfeita” e sugerindo que poderia divulgar uma transcrição da conversa. Contudo, essa não parece ter sido a avaliação do seu homólogo ucraniano, a avaliar pelas declarações do senador Chris Murphy. O democrata, que falou com Zelensky durante uma visita à Ucrânia no início de setembro, revelou esta segunda-feira que aquele lhe tinha manifestado “diretamente” a sua preocupação de que “a ajuda estava a ser cortada como uma consequência” da sua falta de vontade em iniciar uma investigação sobre o filho de Biden.

Hunter Biden fez parte do conselho de administração da Burisma, a maior empresa privada de gás na Ucrânia, durante quase cinco anos. O dono da Burisma foi investigado pelo Ministério Público ucraniano por possível abuso de poder e enriquecimento ilícito. O filho do ex-vice-Presidente americano não foi acusado de quaisquer irregularidades na investigação.

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