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O misterioso caso das 19 mortes em resorts da República Dominicana

O misterioso caso das 19 mortes em resorts da República Dominicana
Education Images/GETTY IMAGES

Íman de turistas de todo o mundo, a República Dominicana vê o seu principal sector ameaçado face às repentinas mortes de turistas norte-americanos. Autoridades dos dois países já estão a investigar os casos. Há suspeitas de que bebidas alcoólicas possam ter sido adulteradas em resorts, mas só os exames toxicológicos o poderão confirmar

O misterioso caso das 19 mortes em resorts da República Dominicana

Liliana Coelho

Jornalista

Atraídos pelos luxuosos resorts, com regime de tudo incluído, e pelas praias paradisíacas com areia branca e mar cálido, a República Dominicana tornou-se há muito num dos principais destinos turísticos das Caraíbas. Mas aquele que é considerado um destino de sonho para muitos turistas tem-se transformado nos últimos meses num autêntico pesadelo para alguns turistas norte-americanos.

Pelo menos 19 cidadãos dos EUA morreram repentinamente enquanto estavam alojados em hotéis de luxo na República Dominicana – oito este ano e 11 em 2018 –, casos que estão a ser investigados e que ameaçam um dos pilares da economia daquele país caribenho. Estima-se que o país receba cerca de dois milhões de turistas norte-americanos por ano e o receio face às ameaças deste destino poderão afundar o sector.

Apesar de não haver certezas quanto à causa das mortes, nem mesmo se há uma correlação entre elas, certo é que estes episódios fizeram disparar os alarmes nos Estados Unidos. O FBI já enviou uma equipa para o país com vista a investigar os casos e averiguar se existe uma relação direta entre eles.

Inicialmente havia suspeitas sobre a qualidade da água, do gelo ou mesmo a contaminação por pesticidas existente em alguns alimentos. Mas a mais recente hipótese recai sobre a possibilidade de poderem ter sido servidas bebidas alcoólicas adulteradas a turistas em resorts localizados em vários pontos do país. Sobre a veracidade desta hipótese, só os exames toxicológicos a poderão comprovar. Por enquanto, persistem muitas dúvidas até a investigação estar concluída.

John Greim/GETTY IMAGES

Vítimas com idades entre os 41 e os 67 anos

As mais recentes vítimas têm idades compreendidas entre os 41 e os 67 anos e estavam alojadas em vários hotéis de luxo localizados em diferentes regiões da República Dominicana. As circunstâncias das mortes também não são comuns.

Vittorio Caruso, um cidadão nova iorquino, de 56 anos, é a última baixa desta onda de mortes repentinas no país, confirmaram esta segunda-feira as autoridades norte-americanas. O antigo sócio de uma pizzaria na cidade de Glen Cove, em Long Island, morreu na última quarta-feira após ter tomado uma bebida num resort em Santo Domingo.

Segundo relatos da família, Vittorio Caruso começou-se a queixar-se com dificuldades respiratórias assim que ingeriu a bebida, acabando por morrer já no hospital, na sequência de um ataque cardíaco. Este indivíduo não teria problemas de saúde, de acordo com o seu médico, e tinha-se reformado recentemente tendo decidido passar uma temporada na República Dominicana, um dos seus destinos de eleição. O resultado da autópsia só deverá ser conhecido daqui a uma semana.

Seis dias antes morrera Joseph Allen, outro turista norte-americano, de 55 anos, após ter-se sentido indisposto quando se encontrava na piscina com um grupo de amigos no resort Terra Linda, em Sosúa. O mal-estar fê-lo subir mais cedo para o quarto, disse que ia tomar um duche e descansar. Mas quando foram ter com o hóspede ao quarto, na manhã seguinte, encontraram-no caído no chão inanimado, explicou a irmã Jaimie Reed à CNN. A família ainda aguarda a chegada do corpo de Joseph Allen aos EUA.

Dúvidas sobre autópsias realizadas no país

No passado dia 10 de junho foi Leyla Cox, de 53 anos, que faleceu num quarto do hotel Excellence Resorts, em Punta Cana, aparentemente devido a um ataque cardíaco. Em declarações *a CBS, o filho Will Cox disse duvidar da validade da autópsia realizada no país, sublinhando acreditar que a mãe ainda hoje estaria viva se estivesse em qualquer outro país com exceção da República Dominicana.

No final de maio, Nathaniel Holmes, de 63 anos, e Cynthia Day, de 49 anos, também morreram enquanto aguardavam que o staff do hotel Grand Bahia Principe, em La Romana, fizessem o checkout. Depois de falhar o horário de saída, este casal do estado norte-americano de Maryland teve que esperar muito tempo até os funcionários da receção lhes efetuarem o checkout. Quando chegaram ao local, os dois turistas já estavam mortos com hemorragias internas, nomeadamente no pâncreas.

Os relatórios forenses realizados no país indicaram ainda que as duas vítimas tinham líquido nos pulmões e no cérebro, assim como cirroses nos fígados. Mas as autoridades norte-americanas aguardam mais resultados de testes toxicológicos.

Cinco dias antes, morreu Miranda Schaup-Werner, de 41 anos, que estava a comemorar o aniversário de casamento com o marido no mesmo hotel em que esteve alojado o casal de Maryland. Esta turista norte-americana, natural da Pensilvânia, caiu abruptamente inanimada no chão após ter tomado uma bebida do minibar. O resultado preliminar da autópsia refere como causas da morte um ataque cardíaco, edema pulmonar e falha do sistema respiratório.

O norte-americano John Corcoran, de 60 anos, foi por sua vez encontrado morto no seu quarto noutro hotel da República Dominicana, cujo nome não foi avançado pela imprensa. Supostamente, este cidadão – que viajava com regularidade para o país – tinha problemas cardíacos, mas os resultados da autópsia revelaram-se igualmente inconclusivos.

John Greim/GETTY IMAGES

Bebidas dos minibares sob suspeita

Em meados de abril, Robert Wallace, de 67 anos, morreu após ter bebido um uísque escocês que se encontrava no minibar do Hard Rock Hotel & Casino, em Punta Cana. Este turista norte-americano encontrava-se no país com outros membros da família para assistirem a uma cerimónia de casamento, mas mais ninguém do núcleo apresentou queixas de mal-estar.

Em julho de 2018, David Harrison, de 45 anos, também faleceu quando se encontrava hospedado no mesmo hotel Hard Rock & Casino, em Punta Cana. De acordo com a mulher, o marido sofreu um ataque cardíaco um dia depois de ter feito snorkeling, mas terá tomado também uma bebida do minibar do quarto do hotel.

Yvette Monique Sport, de 51 anos, estava a passar férias no hotel Bahia Principe, em Punta Cana, com o seu noivo em junho de 2018, tendo-se sentido indisposta também após ter ingerido uma bebida que se encontrava no minibar do quarto do hotel. Durante a noite, o noivo diz ter ouvido um ruído estranho, mas na altura estava com sono e desvalorizou. Quando acordou, na manhã seguinte, deparou-se com a noiva sem vida ao seu lado na cama.

As autoridades dominicanas garantem estar a cooperar com as norte-americanas na investigação destes casos, que contam ainda com a colaboração dos familiares das vítimas, ainda que insistam que se trata de situações pontuais. O Ministro do Turismo dominicano, Francisco García, afirmou que estes episódios são um “fenómeno estatístico normal” ainda que constituam exceções. “Queremos que prevaleça a verdade. Mas posso dizer que não temos nada a esconder aqui. A causa mais provável é sempre a morte natural ”, declarou o governante na passada sexta-feira.

A presidente da Associação Hoteleira da República Dominicana, Paola Rainieri, assegurou, por seu turno, que o país continua a ser um destino seguro para os turistas. Mas embora a administração norte-americana não tenha emitido qualquer aviso para os cidadãos norte-americanos evitarem a República Dominicana, os receios são evidentes entre os turistas nacionais.

Esta situação está também a preocupar as autoridades dominicanas, uma vez que poderá contribuir para a quebra do sector do turismo, que envolve mais de 332 mil empregos diretos e 650 mil indiretos, representando cerca de 8% do PIB do país. Só em 2017, a República Dominicana recebeu 2,7 milhões de turistas norte-americanos, um dos seus principais mercados.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: lpcoelho@expresso.impresa.pt

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