Julian Assange, o co-fundador da WikiLeaks que saiu de quase sete anos de exílio na embaixada do Equador em Londres, apresenta sintomas associados a uma prolongada exposição a tortura psicológica e não deve ser extraditado para os Estados Unidos nem para outro estado que possa aceder a esse pedido, como a Suécia. Esta é a conclusão de Nils Melzer, relator especial das Nações Unidas sobre tortura, em declarações ao britânico “The Guardian”.
O responsável deve dirigir-se ao Governo britânico esta sexta-feira, com este pedido, argumentando que não há garantias de respeito pelos direitos mínimos de Assange. Esta quinta-feira, os advogados do australiano – que cumpre uma pena de 50 semanas de prisão no Reino Unido, por ter falhado uma apresentação em tribunal relacionada com uma acusação de violação na Suécia – justificaram a ausência do ativista numa audiência sobre a possível extradição com o seu estado de saúde.
“O que foi preocupante foi o aspeto psicológico e a sua constante ansiedade. Era perceptível que ele se sente ameaçado por toda a gente. Ele percebeu qual era a minha função mas estava extremamente agitado e ocupado com os seus próprios pensamentos. Foi difícil ter uma conversa muito estruturada com ele”, afirmou Nils Melzer. O relator especial – que visitou Assange a 9 de maio, numa delegação em que também estavam dois médicos, sendo um deles o português Duarte Nuno Vieira – admitiu ainda que os advogados solicitaram a sua intervenção já em dezembro e que tinha um certo “preconceito” sobre o caso.
A sua intervenção foi, portanto, pedida muito antes de Assange ter sido detido, a 11 de abril, na embaixada do Equador em Londres. Porém, os preconceitos parecem ter dado origem a uma preocupação clara e Melzer escreveu cartas aos ministros dos Negócios Estrangeiros dos Estados Unidos, Reino Unido e Suécia.
“Ao longo dos últimos nove anos, o senhor Assange foi exposto a persistente e progressiva violência, desde perseguição judicial sistemática e confinamento arbitrário na embaixada equatoriana até ao seu isolamento opressivo, assédio e vigilância dentro da embaixada, desde ridicularização pública, insultos e humilhação até instigação pública de violência e pedidos repetidos para o seu assassínio”, declarou.
Assange foi acusado a 24 de maio de 17 novos crimes nos Estados Unidos, por alegada violação da Lei de Espionagem norte-americana através da participação na publicação, em 2010, de documentos confidenciais, anunciou esta quinta-feira o Departamento de Justiça. As novas acusações surgem após a instituição ter reaberto o processo contra o cofundador da WikiLeaks, após a sua detenção em Londres.
Assange, de 47 anos, é acusado de ter divulgado centenas de milhares de comunicações e ficheiros sobre as guerras no Afeganistão e no Iraque, incluindo nomes de fontes secretas. Está ainda indiciado pelos crimes de conspiração e de apoio à ex-analista militar Chelsea Manning, que lhe providenciou a informação classificada. Estas acusações juntam-se a uma anterior por alegada tentativa de acesso ilegítimo a uma rede de computadores do Pentágono, sede do Departamento de Defesa dos EUA. A pena máxima para o conjunto das acusações é de 175 anos.
Um porta-voz do Governo britânico já garantiu que haverá colaboração com a ONU, mas adiantou desde logo que há várias discordâncias em relação ao conteúdo das queixas do relator especial.
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