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Emma está viva. “Tenham vergonha, tenham vergonha”

Emma está viva. “Tenham vergonha, tenham vergonha”
RHONA WISE/ Getty Images

Nicholas, Aaron, Jaime, Alyssa, Scott, Meadow, Christopher, Luke, Carmen, Gina, Alex, Peter, Alaina, Martin, Helena, Joaquin, Cara. Todos eles morreram numa escola da Florida, há uma semana. Assassinados. Emma sobreviveu e tem uma missão

Emma está viva. “Tenham vergonha, tenham vergonha”

Marta Gonçalves

Coordenadora de Multimédia

Emma anunciou: “Isso é treta”. Emma proclamou: “Isso é treta”. Emma gritou: “Isso é treta”.

Emma, 17 anos, sobreviveu a um tiroteio numa escola norte-americana. A mais um tiroteio. Tem 17 anos, falou-proclamou-gritou para uma multidão. Porque “a treta” a que Emma se refere é a tese de de que “nada podia” ter sido feito para evitar que mais 17 pessoas morressem. “Isso é treta.”

“Se o Presidente quiser vir ter comigo e dizer-me na cara que foi uma terrível tragédia, que nunca deveria ter acontecido, e continuar a dizer-nos que nada será feito, terei todo o gosto em perguntar-lhe quanto dinheiro recebeu da Associação Nacional de Armas.”

Emma dirigiu-se diretamente a Donald Trump no fim de semana, em Fort Lauderdale, perante uma plateia de gente de luto e durante uma manifestação contra o uso de armas. Desde então, vídeos e imagens dos mais de dez minutos de discurso foram partilhados centenas de vezes e o seu nome foi um dos tópicos mais comentado nas redes sociais nos últimos dias. Porque isto não é treta.

Emma Gonzalez é finalista do secundário. Estava na escola quando, na semana passada, Nikolas Cruz entrou no recinto e começou a disparar na Escola Secundária de Stoneman Douglas, em Parklanda, no estado norte-americano da Florida. Nicholas, Aaron, Jaime, Alyssa, Scott, Meadow, Christopher, Luke, Carmen, Gina, Alex, Peter, Alaina, Martin, Helena, Joaquin, Cara morreram. Mas Emma não.

Dias depois do massacre, uma professora convidou-a a discursar após a marcha a favor do controlo de armas. Já estava algo habituada a participar em movimentos cívicos, lidera um grupo LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgéneros).

No dia do discurso, não sabia o que dizer. O que poderia ser dito depois de um massacre? Depois de algo que já aconteceu tantas vezes e nada mudou? Acordou bem cedo, sentou e escreveu o que queria dizer, o que queria que fosse ouvido. “Os meus dedos não podem fazer nada de errado”, disse à revista “People”. E deixou-se levar. No carro, durante a viagem de quase uma hora, foi editando, escrevendo e reescrevendo. Quando chegou ao palco, as folhas estavam riscadas e desenhadas. Emma estava preparada para ser ouvida.

Políticos que se sentam nos seus lugares dourados do congresso e senado financiados pela Associação Nacional de Armas e dizem-nos que nada pode ser feito para prevenir o que aconteceu, isso é treta. Dizem que leis de controlo de armas mais rígidas não diminuem a violência. Isso é treta. Dizem que as armas são apenas como as facas e tão perigosas como conduzir um carro. Isso é treta. Dizem-nos que somos crianças e que não sabemos do que estamos a falar, que somos muito novos para compreender como o governo funciona. Isso é treta.

A voz falhou-lhe. Por vezes gritou. “Tenham vergonha todos vocês, políticos, que aceitam doações da Associação Nacional de Armas.” E foi interrompida por quem ali estava: “Tenham vergonha. Tenham vergonha”.

Emma está viva. E acredita que outros estarão. “Somos os miúdos sobre os quais se vai ler nos manuais escolares - não por sermos mais um número nas estatísticas, mas porque vamos ser os últimos miúdos vítimas de um tiroteio massivo.”

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: mpgoncalves@expresso.impresa.pt

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