Líderes da Transição

Líderes na transição: estratégias com impacto

Líderes na transição: estratégias com impacto

Compromisso: no rescaldo da COP28, que terminou há uma semana no Dubai, as perspetivas sobre o futuro unem ambientalistas e governantes, com ambos a considerarem insuficientes as medidas acordadas para a ação climática. Envolta em polémicas, a cimeira foi presidida por Al Jaber, dirigente da petrolífera Adnoc, que diz que “não há ciência” que comprove a eficácia do fim dos combustíveis fósseis. Entre os 20 líderes da transição que o Expresso apresenta — aqui e no online, até 2024 —, há quem veja 2030 com otimismo e outros que acreditam que o planeta estará pior. Mas estão todos empenhados em mudar o mundo. Conheça as ideias do engenheiro Álvaro Sousa, da executiva Andreia Carreiro, da professora Maria José Roxo, do ativista Francisco Ferreira, do empreendedor Nuno Brito Jorge, da gestora Andreia Fernandes e do diretor de inovação Gonçalo Saraiva. Continue a acompanhar este projeto até janeiro

1. Estudar o ciclo de vida dos produtos

Nem sempre o que parece é, defende Álvaro Sousa, o engenheiro que está a transformar camiões movidos a diesel em máquinas alimentadas a hidrogénio. O cofundador da KEYOU acredita, por isso, que todos os instrumentos de financiamento públicos dirigidos à sustentabilidade devem ter em conta o verdadeiro impacto de cada produto. “A ideia base é os Governos alocarem fundos públicos para o apoio a esta transição, valorizando os ciclos de vida que são realmente sustentáveis”, aponta.

Colocar esta sugestão em prática implica conhecer bem o percurso completo do que é produzido, da matéria-prima até ao seu fim de vida. “Não é só pensar o produto quando ele é usado, quando está bonito na vitrina, empacotado.” E “depois aparece no mar”, reforça este português emigrado na Alemanha. Só assim, acredita, será possível avaliar a pegada ambiental e dirigir os apoios financeiros aos bens com melhor desempenho.

2. Passar da teoria à prática nas metas de 2030

Andreia Carreiro é uma das (ainda poucas) mulheres na energia que têm lutado para revolucionar o sector, um passo de cada vez. Já ocupou várias funções, no público e no privado, mas hoje lidera a Kinergy, uma startup açoriana que quer implementar a transição energética nas ilhas. Habi­tuada a pôr as mãos na massa, pede um mundo em que as metas ambien­tais, como as de 2030, não sejam apenas aspiracionais. Sugere que consigamos, como sociedade, “não só proclamar que esses objetivos vão ser alcançados, mas também garantir que temos todas as condições para os poder operacionalizar”.

Para o final desta década, mostra-se otimista sobre o caminho traçado pelo Governo para a descarbonização da economia e espera ver “mais telhados revestidos de fotovoltaicos” e “mais carros movidos a energia elétrica”. No entanto, é preciso empenho político, empresarial e individual, sublinha.

3. Conhecer os recursos naturais

“Não há humanidade B”, como disse António Costa durante a COP28, no Dubai, e não haverá humanos sem os recursos que a Terra ainda oferece. É, porém, urgente que a sociedade — e em particular os líderes políticos — saiba tomar conta dessas preciosidades, como são a água, o solo fértil e a biodiversidade. Para isso, a professora e investigadora Maria José Roxo defende que “as ideias que um Estado pode pôr em prática têm de se basear sobretudo num bom conhecimento do território”.

Isso implica que a máquina de gestores da coisa pública conheça os recursos naturais, “porque, para gerir e ter boas ideias, preciso de saber o que tenho”, insiste a reconhecida espe­cialista. Pede ainda que as empresas ajudem “a investigação científica”, a “regeneração” dos ecossistemas e financiem projetos com poten­cial transformador. “Cada um de nós pode ser um agente de transição e de mudança”, remata.

4. Usar só o suficiente e poupar o planeta

O conceito de minimalismo não é novo, que o digam os artistas que cria­ram um movimento transformador nos anos 60. Mas nas últimas décadas tem sido muitas vezes aplicado à forma como vivemos, e é aí, com especial atenção ao consumo, que o ativista Francisco Ferreira acredita que todos podem contribuir. “A suficiência é vivermos bem, com qualidade de vida, mas com aquilo que efetivamente precisamos e, portanto, com uma menor pegada ecológica”, explica o fundador e presidente da associação ZERO. Casado com a causa ambiental há mais de 40 anos, garante que, “se tivermos esta ideia de usar o suficiente, estamos no caminho da sustentabilidade”. Comprar menos fará com que se reduza a produção de bens e, com isso, se alcance uma exploração menos intensiva dos recursos do planeta. Em simultâneo, acrescenta, uma aposta maior em energias renováveis evita o consumo de combustíveis fósseis.

5. Incentivar investimentos no ambiente

Acelerar o caminho rumo à neutralidade carbónica depende, em grande medida, do desenvolvimento de tecnologia e da produção de novo conhecimento, mas Nuno Brito Jorge considera que para que isso aconteça devem ser criados incentivos ao investimento em sustentabilidade. O fundador e CEO da GoParity, a plataforma que liga projetos com impacto positivo no ambiente a investidores privados, diz que o “Estado pode desempenhar um papel ao criar mecanismos que mitiguem o risco de perda” do capital investido. Nesses casos, os cidadãos devem poder assumir o montante investido “como um gasto no IRS”, de forma a privilegiar a aplicação de fundos “quando há um bem maior e coletivo”, como sejam iniciativas “de energia limpa ou redução de emissões de dióxido de carbono”, exemplifica. Incentivos fiscais como a redução do imposto a pagar sobre as mais-valias deve ser, segundo a sua opinião, um modelo a implementar.

6. Colocar PME a falar de sustentabilidade

Andreia Fernandes é sensível ao tema do financiamento de atividades verdes. Não fosse líder da InnoEnergy, uma empresa do Instituto Europeu de Inovação e Tecnologia que apoia a disrupção nos Estados-membros. “É necessário criarmos condições às empresas para poderem criar, desenvolver e implementar a sua estratégia de sustentabilidade”, sublinha. Em particular junto das organizações de pequena e média dimensão, que não só compõem 99% do tecido económico como são também as que têm menor capacidade de investimento.

Em paralelo, advoga uma maior aposta na comunicação sobre ações em prol do planeta para aumentar a consciencialização sobre o tema na sociedade em geral. “Vamos falar sobre a transição energética e mostrar, com exemplos práticos, o quanto podemos ganhar com uma pequena ação”, reforça. Só assim é possível “empoderar” as pessoas e fazer avançar os objetivos para um mundo melhor.

7. FACILITAR ACESSO AOS FUNDOS VERDES

A eliminação de barreiras à adoção de comportamentos sustentáveis aplica-se igualmente aos cidadãos, que, embora tenham alguns instrumentos à disposição para investir em painéis solares ou substituição de janelas por outras mais eficientes, continuam a enfrentar o peso da burocracia. Quem o diz é o líder de inovação na EDP Comercial, Gonçalo Saraiva, que usa como exemplo o Fundo Ambiental do Ministério do Ambiente e da Ação Climática: “Na verdade, as pessoas hoje, para poderem beneficiar desses incentivos, têm de investir o dinheiro [logo à partida]” e só depois recebem, eventualmente, a comparticipação do Estado, vinca.

Se o objetivo é “aumentar a acessibilidade deste tipo de soluções”, o responsável acredita que as entidades públicas devem “eliminar ou reduzir esta barreira à entrada”, até porque, realça, “já não há dúvidas se [estas medidas] são benéficas ou não” para o planeta.

Líderes da Transição

O Expresso, com apoio da EDP, selecionou 20 personalidades portuguesas com percurso assinalável na jornada da sustentabilidade. Ao longo de 10 semanas, o semanário publica as ideias destes académicos, empresários e ativistas com vontade de mudar o mundo. Acompanhe o projeto Líderes da Transição até janeiro.

Textos originalmente publicados no Expresso de 22 de dezembro de 2023

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