Barómetros

Somos todos diferentes. Iguais só quando dá jeito

Somos todos diferentes. Iguais só quando dá jeito

Imigração. Portugal enfrenta um dilema: os imigrantes ajudam a sustentar a economia mas muitos portugueses olham para eles com desconfiança. Vivemos um ciclo de oposição em que a origem geográfica define o grau de aceitação, revelam os dados

São cerca de 51% os inquiridos que acreditam que a imigração põe em risco a cultura e os valores nacionais, conclui o Barómetro da Imigração divulgado esta semana pela Fundação Francisco Manuel dos Santos (FFMS). Em 2010, o valor fixava-se em 28%. “Uma parte significativa da população expressa oposição à imigração, percecionando-a mais como uma ameaça do que como uma oportunidade, e como trazendo mais desvantagens do que vantagens”, lê-se no documento.

O estudo, apresentado à boleia do Dia Internacional das Migrações, assinalado a 18 de dezembro, diz mesmo que dois terços dos portugueses associam os trabalhadores estrangeiros a um aumento da criminalidade e 68% das pessoas defendem que a atual política de imigração é pouco regulada. “Os dados dizem-nos que há uma grande aceitação da necessidade de imigração, mas depois há uma rejeição concreta de alguns grupos específicos”, explica Pedro Góis, um dos autores do barómetro. O sociólogo e investigador do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra refere-se a um dos dados mais significativos deste estudo: os portugueses aceitam mais facilmente quem vem do chamado mundo ocidental (Estados Unidos, Reino Unido ou França, por exemplo) e nem tanto quem chega de países africanos, do Brasil ou do subcontinente indiano (ver caixa).

Os números são esmagadores: 60,8% dos participantes defendem que deve ser reduzida a chegada de imigrantes do subcontinente indiano. “Há uma perspetiva de que são muitos, e isso tem muito a ver com a visibilidade mediática de alguns grupos específicos e também com a desinformação”, justifica. Rui Costa Lopes, outro dos autores e investigador principal do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, afirma que este grupo étnico “sofre de uma tempestade de circunstâncias negativas”. Desde logo por representarem uma nova imigração, mas também por “não partilharem a língua ou a cor de pele”. O especialista é perentório: “O facto de serem racializados contribui para isto, embora se distingam de outros grupos racializados como os imigrantes de países africanos”.

60,8% opõem-se à chegada de imigrantes do subcontinente indiano. 77,4% pedem saída de estrangeiros sem trabalho

Os números oficiais mostram uma realidade diferente da percebida pelos inquiridos e apontam que os estrangeiros vindos do Indostão representam apenas 9% do total de imigrantes em Portugal. Esta sobrevalorização dos números é, aliás, uma constante ao longo do barómetro da FFMS. “42% das pessoas acham que os imigrantes representam mais de 20% da população. Ainda não se sabe os números atualizados para 2024, mas é certo que [o valor] estará mais próximo dos 10%”, sublinha Rui Costa Lopes.

Existe claramente uma visão utilitarista da imigração, aponta o barómetro. Se por um lado os portugueses reconhecem a importância destes trabalhadores para a economia nacional, por outro, 77,4% dizem que os estrangeiros devem regressar ao seu país de origem se não tiverem trabalho. “A nossa sociedade reage de forma ambivalente. Mostra algum humanismo quando diz que estas pessoas devem regularizar-se, aceder à nacionalidade e ter direito de voto”, acrescenta Pedro Góis.

Cátia Batista, diretora científica do centro de investigação NOVAFRICA, explica que a imigração traz vantagens não apenas económicas, mas também demográficas. “A população teria diminuído desde os últimos Censos se não fosse o influxo de imigrantes. A consequência de não termos estes imigrantes em Portugal seria absolutamente desastrosa e levaria a uma contração forte da nossa economia”, assegura. De acordo com números do INE, a população portuguesa cresceu, em 2023, 1,16% graças à componente migratória. “Precisamos claramente de mais imigrantes”, remata.

Quanto mais distantes, mais oposição

Subcontinente indiano

Imigrantes de países como a Índia, o Paquistão, Nepal ou Bangladesh devem, segundo os inquiridos do Barómetro da Imigração, reduzir-se. Apenas 25,9% das pessoas defendem que os números devem manter-se.

Chineses mantêm posição

Entre os participantes, 37,3% consideram que a imigração com origem na China representa mais desvantagens do que vantagens. São cerca de 50% aqueles que defendem uma redução na entrada destes estrangeiros em Portugal.

PALOP atrás do Ocidente

Imigrantes ocidentais são preferidos aos dos PALOP, nomeadamente dos países africanos (45,5% dizem que deve diminuir) e do Brasil (51%). Apenas 25,7% pede redução dos estrangeiros com origem no Ocidente.

Sentimento negativo

Quase 55% dos inquiridos consideram que, sem imigrantes, os portugueses teriam melhores condições de trabalho. Apenas 40,1% discordam desta afirmação.

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