Apesar de o valor da produtividade por hora trabalhada ter vindo a aumentar ao longo das últimas duas décadas, a diferença entre Portugal e a média da União Europeia (UE) continua a ser muito significativa. Em 2002, no ano em que o escudo deu lugar à entrada do euro na carteira dos portugueses, Portugal apresentava uma produtividade por hora trabalhada de €14,6, enquanto a média da UE era de €26,8.
Os dados da Pordata indicam ainda que dez anos mais tarde, em 2012, o montante gerado por hora era de 19,8 em território nacional, contra €35,4 nos outros Estados-membros. Em 2021, o último ano em que existem dados para o país e a UE a 27, a produtividade real era de €24,3 e comparava com €43,6 na média europeia.
Segundo números do Eurostat, no ranking europeu de produtividade Portugal está no fundo da lista com 72,1% dos níveis registados na Zona Euro – praticamente o mesmo valor que o país apresentava em 2012. Abaixo só mesmo a Eslováquia com 71,1% e a Grécia com 66,4%. Na liderança estão a Irlanda (216,3%), o Luxemburgo (156,3%) e a Bélgica (126,3%).
Se olharmos para o nível de qualificações da população portuguesa, verifica-se um crescimento ao longo das últimas décadas. Em 2002, apenas 7% dos cidadãos com mais de 16 anos tinha concluído o ensino superior, valor que mais do que duplicou em 2012 para 14,6% e que voltou a subir em 2022, quando 24,5% dos adultos já tinha pelo menos uma licenciatura.
é o nível de produtividade de Portugal face à média dos países da União Europeia, segundo dados do Eurostat para 2022. Em média, a produtividade média por trabalhador é 28% inferior em território nacional
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Perante estes dados, a questão que se coloca é como é que as qualificações dos portugueses não se estão a refletir no encurtar da distância entre Portugal e a média europeia na produtividade? Eduardo Oliveira começa por explicar que a produtividade “não depende só das qualificações dos trabalhadores ou das chefias”, mas é influenciada também pelos processos de trabalho, o grau de digitalização das empresas e a competitividade das organizações. O professor e diretor do curso de Mestrado em Economia e Gestão de Recursos Humanos da Faculdade de Economia da Universidade do Porto fala na importância da requalificação profissional e da atualização de competências como um dos fatores que contribui para esta equação.
“Esse reskilling e esse upskilling têm de ser feitos e, a par disso, tem de haver mudanças ao nível do contexto empresarial”, continua. Isto porque embora as gerações mais jovens apresentem maiores qualificações académicas, o peso das gerações mais velhas no mercado de trabalho continua a ser muito significativo e, nesta parte da pirâmide etária, as qualificações são, de forma geral, menores.
Manuel Carlos Nogueira, economista e professor na Universidade de Aveiro, acrescenta ainda a “fuga de mão de obra qualificada para o exterior” como outro elemento a ter em conta. “O exterior remunera melhor. Portugal acaba por suportar os custos com a educação dos estudantes e depois o estrangeiro beneficia de mão de obra altamente qualificada”, assinala. De acordo com números do Instituto Nacional de Estatística, em 2012 cerca de 18% dos jovens entre os 20 e 24 anos estavam fora do país por mais de um ano, enquanto no segmento 25-29 anos 20% tinha emigrado. Dez anos depois, em 2022, os valores aumentaram para 20,7% e 21,9%, respetivamente.
No entanto, a dimensão das empresas do tecido económico português e a sua relação com as exportações também pode ter impacto na produtividade média, aponta o economista José Alberto Ferreira. Para o economista, se um “jovem muito qualificado vai para uma empresa média com poucas relações com o exterior, ele não vai conseguir traduzir todo o seu potencial em riqueza gerada para a empresa”. Em simultâneo, considera que a “estrutura económica” está viciada em emprego pouco qualificado, o que dificulta o aumento da produtividade.
“Acho que a produtividade não é uma questão genética. Temos essa ideia porque nos desresponsabiliza”, afirma o professor Eduardo Oliveira
PARA ONDE CAMINHAMOS
A baixa produtividade que parece ser crónica em Portugal não é, ao contrário do que por vezes se faz querer parecer, uma inevitabilidade. “Não é uma situação no nosso ADN. Os nossos trabalhadores emigrantes são muito requisitados pelo exterior”, reforça Manuel Carlos Nogueira. Opinião semelhante tem Eduardo Oliveira, que diz que olhar para este assunto como uma “questão genética” é uma forma de desresponsabilização.
Mas, então, como podemos fazer crescer a produtividade para os níveis europeus? A resposta é, como a origem, multifatorial. Os especialistas ouvidos pelo Expresso apontam três níveis de intervenção: os trabalhadores, a gestão das empresas e as políticas públicas.
No campo dos trabalhadores, a resposta parece ser apostar na formação ao longo da vida, em especial junto dos recursos humanos com mais idade e menos qualificações-base. Já de cima para baixo, na cúpula da gestão, é preciso investir em novas formas de organização laboral – simplificação de processos, redução da carga burocrática, maior aposta na interação geracional e reforço da inovação.
Do lado do Estado, porém, espera-se a construção de um “ambiente favorável” às empresas, nomeadamente com a simplificação da relação entre organizações e os serviços da administração pública, a revisão da carga fiscal sobre o trabalho e políticas que incentivem a produtividade. “A resposta macro é canalizar os recursos da economia para os sectores com maior potencial de inovação e maior potencial de crescimento”, perspetiva José Alberto Ferreira.
Sobre a semana dos quatro dias, as opiniões dos peritos são semelhantes. Manuel Carlos Nogueira acredita que “esta medida de forma isolada não funciona” e que deve ser acompanhada de políticas que resolvam os desafios já mencionados. “Há uns anos falou-se na possibilidade de criar uma secretaria de Estado ou um ministério para a competitividade e produtividade. Talvez tivesse algum interesse em implementar esta ideia, mas ficou na gaveta”, acrescenta.
Já Eduardo Oliveira acredita que “esta ideia dos quatro dias por semana tem todas as pernas para andar” e que os trabalhadores estariam “menos cansados” e, portanto, menos suscetíveis a cometer erros. “É óbvio que há desvantagens, há limitações para essa ideia, mas eu sou um acérrimo e convicto defensor de que, em vários contextos, ela pode ajudar-nos a ser mais produtivos”, remata.