5 Décadas de Democracia

O sol não chega. Como pode Portugal tornar-se mais atrativo para os imigrantes?

Uma das zonas do país com uma maior concentração de imigrantes é o Alentejo. Trabalham em estufas de frutos vermelhos, mas muitos vivem sem condições dignas e cuidados de saúde adequados
Uma das zonas do país com uma maior concentração de imigrantes é o Alentejo. Trabalham em estufas de frutos vermelhos, mas muitos vivem sem condições dignas e cuidados de saúde adequados
Luís Barra

O Expresso e a Fundação Francisco Manuel dos Santos (FFMS) juntam-se para debater as últimas cinco décadas de democracia em Portugal. Nos próximos 10 meses, vamos escrever (no Expresso) e falar (na SIC Notícias) sobre 10 tópicos diferentes, da economia à sociedade. Neste mês de junho, o tema será como nos adequamos ao envelhecimento da população.

Ana Baptista (Texto) e Sofia Miguel Rosa (Infografias)

Os factos

O saldo migratório português é positivo, ou seja, estão a entrar mais estrangeiros do que os portugueses que saem.

Emigrantes permanentes


Imigrantes permanentes


A maioria das pessoas que sai de Portugal tem entre 20 e 40 anos, estão em idade reprodutiva, em idade ativa para trabalhar e são a geração mais qualificada.

Já grande parte das pessoas que entram em Portugal têm 65 e mais anos (ver gráficos interativos em baixo), não contribuem para a natalidade nem para a economia e podem mesmo ser um encargo adicional para o Estado porque vão precisar de mais cuidados de saúde.


Emigrantes permanentes


Imigrantes permanentes


Daí que Pedro Góis, sociólogo e professor na Universidade de Coimbra, diga que as migrações têm um impacto “considerável” no envelhecimento da população. Contudo, não a considera a razão “mais importante”, porque diz que há portugueses que regressam ainda em idade ativa e há imigrantes que trazem os filhos, ou que já os têm cá: “Entre 13% a 14% das crianças que nascem em Portugal têm uma mãe estrangeira”.

Como chegámos até aqui

Em Portugal, houve dois grandes movimentos migratórios de saída: nos anos 1960 e, depois, nos anos da crise do subprime e da troika entre 2008 e 2015 (ver gráficos em cima).

Foram dois movimentos diferentes. No primeiro, as pessoas que sairam fixaram-se nos destinos e os que voltaram a Portugal, que foram poucos, foi já em idade avançada. Além disso, não tinham tantas qualificações e foram trabalhar nas limpezas, construção ou restauração. No segundo momento, “a circularidade” já foi maior, ou seja, as pessoas migravam mas sem intenção de se fixar e algumas regressaram a Portugal ainda em idade ativa, até porque migravam para países da Europa. Além disso, tinham mais qualificações, muitas vezes licenciaturas e mestrados ,e procuravam empregos adequados a esse nível de escolaridade.

As razões que levaram essas pessoas a sair, em ambos os momentos, foram as mesmas: a procura de melhores condições de vida, de emprego ou de melhores salários. Que são também as mesmas razões que fizeram com que o número de imigrantes em Portugal tenha crescido nos últimos anos, mas neste caso há que juntar outros factores como as guerras ou mesmo as alterações climáticas.


Sala de aula no Centro Escolar de São Teotónio, Odemira, que integra estudantes com 32 nacionalidades
NUNO VEIGA/LUSA

Para onde caminhamos

Pedro Góis não tem dúvidas: Portugal precisa de imigrantes em idade ativa, não só para combater o envelhecimento da população, mas também para o equilíbrio da economia.

“Sem a entrada de pessoas, o país não sobrevive. São os imigrantes que vão ser a mão de obra necessária para os projetos que há para a agricultura e para a indústria, ou mesmo para a construção civil, porque é verdade quando se diz que os portugueses não querem fazer esse tipo de trabalho ou preferem trabalhar para empresas estrangeiras que pagam mais. Mas também vamos precisar dos imigrantes para ser professores ou motoristas de autocarros ou camionistas de longo curso. E, como temos pessoas mais velhas no País, vamos precisar de mais cuidadores - e muitos deles vão também ser imigrantes”.

Contudo, ressalva, é preciso criar condições para chamar mais imigrantes e para reter os que já cá estão.

“Portugal tem 6% a 7% de população estrangeira residente, quando, por exemplo, o Luxemburgo tem 30% e a Suécia 20%”, diz o sociológo, Pedro Góis.

“Nesta altura estamos a receber mais gente do que aquela que podemos receber de forma digna. Temos de repensar a nossa sociedade à luz das pessoas que cá vivem, de as integrar melhor. Por exemplo, nas escolas ter aulas noutras línguas. Mas temos também de reconfigurar o mercado de trabalho, pagando melhores salários, porque são uma forma de reter cá os portugueses, mas também de reter os imigrantes que facilmente podem sair daqui para a Europa. E temos de renovar o parque habitacional. O Algarve é um exemplo, porque vem gente para trabalhar, mas não têm onde ficar. As pessoas não vêm para cá nem voltam só pelo sol”, considera Pedro Góis.

E depois vai ser preciso “ensinar” a população a lidar com esta evolução demográfica e a ser mais tolerante com os imigrantes. Apesar de Portugal comparar muito com o Japão em termos de população envelhecida, no Japão não há imigrantes. Não os querem. A solução que encontraram para ter mais pessoas a trabalhar foi a robotização, “algo que Portugal não tem capacidade para fazer”, conclui.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: clubeexpresso@expresso.impresa.pt

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