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Adolfo Mesquita Nunes: “48% dos homens adiaram cuidados por falta de dinheiro. Este número não surpreende — mas devia preocupar”

Adolfo Mesquita Nunes: “48% dos homens adiaram cuidados por falta de dinheiro. Este número não surpreende — mas devia preocupar”
Nuno Botelho

O advogado é o primeiro protagonista de dez minientrevistas - que publicaremos a partir de hoje e até 24 de junho - relacionadas com o estudo da GfK Metris para o Expresso sobre “A Saúde do Homem”. Neste período serão igualmente exibidos online 10 vídeos, com outros 10 entrevistados. Acompanhe

O estudo refere que apenas 52% dos homens nunca adiaram uma consulta ou tratamentos por falta de dinheiro. Como podemos reduzir a dependência dos utentes nos encargos diretos em saúde para garantir um acesso mais equitativo aos cuidados médicos?

Como defensor de políticas públicas baseadas em dados, vejo com interesse estes números — mas também com prudência. São indicadores importantes, que mostram padrões de afastamento dos homens em relação aos cuidados de saúde, mas há ainda muito por compreender antes de tirarmos conclusões definitivas.

Sabemos agora que 48% dos homens adiaram cuidados por falta de dinheiro. Num país onde 30% da despesa em saúde é suportada diretamente pelos utentes, este número não surpreende — mas devia preocupar. O peso dos encargos diretos na decisão de procurar cuidados é um dado estrutural que não pode ser ignorado, e que deve ser considerado quando se discute responsabilidade individual. São números impressionantes e que contrariam aquilo que esperaríamos de um Estado Social: que o contexto financeiro de cada família fosse o menos determinante possível.

Quais são as principais barreiras que impedem os homens de utilizarem regularmente os serviços de saúde disponíveis?

Este estudo diz-nos que, entre os que têm médico de família, quase metade dos homens só o consulta uma vez por ano ou menos. É uma estatística que levanta mais perguntas do que respostas: será falta de tempo, de hábito, de confiança no sistema? Será que há obstáculos de acesso que não estamos a mapear? Será que, ao contrário das mulheres, os homens não têm ao longo da vida pontos de contacto regulares com o sistema — como acontece, por exemplo, com a saúde reprodutiva? Pode ser. Mas importa não cair em simplificações ou em análises essencialistas. Estes dados devem ser o início de um esforço para perceber melhor o que está a acontecer — e não o fim da conversa.

Como podemos melhorar a qualidade de vida na velhice, abordando as determinantes sociais da saúde de forma eficaz?

Há mais dados que nos deviam preocupar. Portugal está a viver mais, sim. Mas está a viver pior. Aos 65 anos, a esperança de vida de um português é de mais 19,8 anos — acima da média europeia. Mas apenas 7,8 desses anos são vividos com saúde. Isso coloca-nos entre os países europeus com pior qualidade de vida na velhice. O que é que isso nos diz? Diz-nos, para começar, que o debate não pode ser apenas sobre viver mais, mas sobre viver melhor. E que as determinantes sociais da saúde — educação, rendimento, condições de trabalho, ambiente urbano, acesso a cuidados — estão a falhar. A longevidade sem qualidade é um fracasso coletivo.

Preocupa-me também o dado de que 54% das pessoas recorrem à internet para procurar informação sobre a sua saúde, ultrapassando o farmacêutico. É um sinal de curiosidade e de tentativa de auto-orientação, mas levanta riscos sérios, sobretudo quando já se começa a recorrer a modelos de linguagem como os LLMs. Esses sistemas são impressionantes na forma, mas não estão preparados para dar conselhos médicos fiáveis. Podem dar respostas plausíveis — mas plausibilidade não é o mesmo que rigor clínico. E num contexto de baixa literacia, isso pode fazer mais mal do que bem. Em suma: os dados são úteis, mas não esgotam o problema. Precisamos de mais informação, mais investigação e mais cuidado na forma como interpretamos estes comportamentos. Se há afastamento, temos de perceber onde, porquê, e como o sistema pode reagir. Sem moralismo, sem estereótipos.

Nome: Adolfo Mesquita Nunes

Idade: 47 anos

Profissão: Advogado

Resumo profissional: Jurista e antigo secretário de Estado do Turismo (2013–2015), foi também Vice-Presidente do CDS-PP, partido de que se desfiliou. É conhecido pela defesa de posições liberais. Atualmente exerce advocacia, na área de direito público e regulatório, tendo-se destacado nos últimos tempos pelos temas de compliance em matéria de IA.

Lema de vida: I chose and my world was shaken. So what? The choice may have been mistaken. The choosing was not (Escolhi e o meu mundo abalou-se. E depois? A escolha pode ter sido errada. O ato de escolher não foi)

“A Saúde do Homem” é uma iniciativa que visa retratar os cuidados de saúde da população masculina e sensibilizar a sociedade para a importância da prevenção e do tratamento de doenças que a afetam. Um projeto Expresso, com o apoio da Johnson & Johnson Innovative Medicine e o apoio institucional da Ordem dos Médicos.

Este projeto é apoiado por patrocinadores, sendo todo o conteúdo criado, editado e produzido pelo Expresso (ver Código de Conduta), sem interferência externa

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: clubeexpresso@expresso.impresa.pt

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