Projetos Expresso

“Vírus do VIH é cego. Não quer saber se é imigrante ou português de bem”

Responsável pela APDES, que dedica a sua atividade a apoiar comunidades vulneráveis, fala em falta de fundos para financiar este tipo de organizações
Responsável pela APDES, que dedica a sua atividade a apoiar comunidades vulneráveis, fala em falta de fundos para financiar este tipo de organizações
DR

José Queiroz, diretor-executivo da Agência Piaget para o Desenvolvimento, diz ser preciso investir em proximidade com comunidades vulneráveis para reduzir infeções. Nas próximas semanas, publicamos dez artigos sobre vencedores das edições anteriores do Programa Gilead Génese, a que o Expresso se associa como media partner

Há mais de quatro décadas foi descoberto o primeiro caso de infeção por VIH em Portugal. Neste período, o Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge (INSA) contabiliza mais de 68 mil casos de infeção e perto de 17 mil mortes – só entre 1995 e 2005, a média de diagnósticos de infeções ocorridas em território nacional foi de 2737 casos por ano. Em 2023, contaram-se 876 diagnósticos. “Junto das populações com que trabalhamos, em termos de VIH e hepatites virais os números parecem estabilizados”, conta José Queiroz, diretor-executivo da Agência Piaget para o Desenvolvimento (APDES).

A propósito da cerimónia de entrega de bolsas de investigação e apoio a projetos comunitários da 10ª edição do Programa Gilead Génese, a que o Expresso se volta a associar como media partner, publicamos dez artigos sobre vencedores das anteriores edições da iniciativa. Neste segundo episódio, vamos conhecer a APDES e o trabalho que desenvolve, desde 2004, na área metropolitana do Porto e que venceu já duas edições deste programa.

O projeto Adere+ foi o último com que esta organização de base comunitária venceu a iniciativa da farmacêutica, em 2016, com uma proposta para a promoção da terapêutica para a hepatite C junto de utilizadores de drogas. Antes disso, em 2014, a instituição recebeu apoio para concretizar uma ação de deteção de VIH/SIDA, hepatites víricas e outras infeções sexualmente transmissíveis junto de trabalhadores do sexo.

“O que sentimos nos últimos três anos é que a Comissão Europeia foi desinvestindo nestes projetos [ligados ao fenómeno da droga] ao ponto de quase nem abrir concursos”

“O trabalho que fazemos, como muitas outras organizações, é promover o acesso à saúde por parte de populações em grande vulnerabilidade social”, explica José Queiroz. Todos os dias, a equipa que dirige procura estar junto destas comunidades e aproximá-las do sistema de saúde, rastreando e diagnosticando sempre que possível. A instituição lidera o consórcio que gere a sala de consumo assistido no Porto, que serve cerca de 1500 pessoas por ano. “A média diária é de 150 pessoas, mas temos uma equipa de rua em Vila Nova de Gaia, que faz isto há 21 anos e tem cerca de 100 pessoas diariamente a receber metadona e apoio”, detalha.

A grande dificuldade de organizações como a APDES é, mais do que chegar às pessoas que precisam destas respostas sociais, financiar a sua atividade. Muitos dos projetos financiados pelo Estado só suportam 80% a 90% dos custos, cujos valores estão, garante José Queiroz, desadequados. “E isto tudo com grande precariedade, porque o que é proposto em termos de tabelas salariais para profissionais de saúde são valores ridículos”, diz. Sem mecenato, estas associações não conseguiam dar resposta.

O diretor-executivo critica ainda o que considera ser uma tendência de securitização, que afasta recursos das comunidades e da saúde, e lembra que as infeções por VIH, hepatites ou outras sexualmente transmissíveis não olham a sexo, idade ou origem geográfica. “O vírus do VIH é cego. Não quer saber se é imigrante ou se é português de bem. Mas se alguém estiver infetado, aumenta-se a probabilidade de ver infeções em cadeia na sociedade”, avisa, reforçando a importância de investir em respostas comunitárias como a da APDES.

Este projeto é apoiado por patrocinadores, sendo todo o conteúdo criado, editado e produzido pelo Expresso (ver Código de Conduta), sem interferência externa.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: clubeexpresso@expresso.impresa.pt

Comentários
Já é Subscritor?
Comprou o Expresso?Insira o código presente na Revista E para se juntar ao debate