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Liderança no feminino ajuda a quebrar preconceitos

Silvia Bechmann e Maria Silva, CEO da Mercedes-Benz.io e presidente do Banco Carregosa, duas líderes, duas gerações e duas oradoras do Breaking the Bias in Fin & Tech
Silvia Bechmann e Maria Silva, CEO da Mercedes-Benz.io e presidente do Banco Carregosa, duas líderes, duas gerações e duas oradoras do Breaking the Bias in Fin & Tech

Diversidade. Há estigmas que ainda precisam de ser ultrapassados nas áreas financeira e tecnológica das empresas. Educar para investir mais e melhor e atrair mulheres para estas atividades tradicionalmente masculinas são alguns exemplos

Décadas antes de temas como diversidade, inclusão ou liderança feminina serem alvo de discussão nas empresas, já Maria Cândida da Rocha e Silva, 80 anos, rompia estigmas na área financeira. Aos 30 anos, e seguindo os passos do pai, foi a primeira mulher corretora em Portugal, numa época em que a atividade era exclusivamente masculina. Começou aos 30, no pós-revolução do 25 de Abril, no Palácio da Bolsa, no Porto, e ao longo de 50 anos tem sido exemplo para várias gerações de mulheres, para quem abriu caminho. Atualmente é presidente do Conselho de Administração do Banco Carregosa e há quem lhe chame “a última banqueira”. Questionada sobre como gostaria de ser lembrada, não tem dúvidas: “Gostava que dissessem que era uma pessoa que sempre fez o bem.” Foi com esta simplicidade e humildade que respondeu à pergunta durante a gravação do podcast “O CEO É o Limite”, que abriu o evento Breaking the Bias Fin & Tech, que decorreu ontem no Edifício Impresa.

“O maior obstáculo à participação de mais mulheres nos níveis superio­res na área financeira é a falta de apoio”, acredita Anastasia Amoroso, que salienta a importância do suporte, em casa e no trabalho, para gerir a intensidade de uma carreira de alto nível. “Com uma miríade de responsabilidades familiares, pode ser esmagador e desencorajador”, reforça a administradora e CIS ­(chief investment strategist) na fintech norte-americana iCapital e oradora no painel dedicado à quebra de preconceitos na área financeira.

“Há também um sentimento de responsabilidade inerente ao saber que o caminho que percorremos hoje está a abrir as portas para as gerações futuras”, acrescenta Sílvia Bechmann. A CEO da Mercedes-Benz.io, que igualmente participou no debate, revela que procura partilhar a sua paixão por esta área com adolescentes e estudantes para que desenvolvam autoconfiança e explorem as oportunidades. “Assim, contribuímos para um futuro mais inclusivo, no qual cada vez mais mulheres estarão representadas na tecnologia.”

No fundo, “a diversidade traz valor acrescentado”, afirma Inês Drumond. Na opinião da vice-presidente da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), diferentes pontos de vista, atitudes e visões são fonte de aprendizagem e de riqueza adicional. “O mesmo se aplica às fontes de financiamento e à forma como afetamos as nossas poupanças”, sublinha.

Falta de apoio para gerir carreira de alto nível no sector financeiro ainda afasta mulheres dos cargos de topo

Conceitos como risco ou retorno de uma aplicação financeira ainda são desconhecidos de uma elevada fatia da população nacional, na qual se incluem muitos gestores de empresas. Segundo um relatório da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), em 2023 Portugal continuava a meio da tabela entre os 27 Estados-membros no que se refere aos conhecimentos financeiros. “Tendemos a ser cautelosos talvez por não termos bons conhecimento financeiros?”, questiona Inês Drumond, que não tem uma resposta objetiva mas acredita que o desconhecimento impede os aforradores de tirar partido do que o sector financeiro pode permitir.

Mercado de capitais robusto, precisa-se!

O nível de maturidade financeira da população e algum preconceito influenciam os investimentos privados e impedem o desenvolvimento de um mercado de capitais robusto, que faz falta em Portugal. “Os mercados de capitais desempenham um papel crucial em muitos aspetos num mundo em mudança”, reforça Anastasia Amoroso. Do financiamento da transição energética à aposta no aumento da produtividade com a ajuda da inteligência artificial (IA) ou a maior equidade de acesso das empresas privadas “são essenciais para o crescimento e a inovação”, conclui.


TRÊS PERGUNTAS A

Silvia Bechmann

CEO Mercedes-Benz.io

Como é ser líder, sendo mulher, num mundo tradicionalmente masculino?

A minha experiência é muito positiva. Durante o percurso profissional tive a oportunidade de trabalhar com líderes e equipas que valorizaram e promoveram uma cultura de inclusão, onde as skills e os resultados determinam a progressão de carreira. Acredito que o trabalho e o seu impacto falam mais alto do que preconceitos, e é essa a cultura que construímos na Mercedes-Benz.io. Ser mulher num mundo tradicionalmente masculino permite-me trazer perspetivas diversas, muitas vezes cruciais para impulsionar a inovação e novas formas de pensar. Essa diversidade de pensamento é fundamental para identificar novas oportunidades e agregar valor de maneiras que nem sempre são óbvias de imediato.

A introdução de tecnologia no sector automóvel fez com que as decisões deixem de ser apenas do pelouro do IT. Como garante o equilíbrio entre tecnologia e gestão?

A transformação digital é não só uma vantagem competitiva, como também uma realidade na maioria das indústrias e sociedade. Hoje, as áreas de IT e de administração ou negócio não funcionam de forma isolada, mas como duas faces de uma mesma estratégia integrada. Como líderes, devemos garantir que as prioridades levem em conta tanto os aspetos tecnológicos, quanto os de negócio, assegurando um alinhamento eficaz entre ambos.

Reter talento é hoje um desafio. Como estão a combater esta dificuldade, e de que forma a introdução da IA está a exigir requalificação nas equipas?

A nossa taxa de retenção é superior à média do mercado. Na Mercedes-Benz.io, acreditamos que a aprendizagem é contínua e nunca deve parar. Por isso, oferecemos ferramentas para apoiar o crescimento das nossas equipas. Todos os colaboradores têm um orçamento anual para investir no seu desenvolvimento, seja através de conferências ou formações, e organizamos regularmente sessões de partilha de conhecimento, com foco crescente na IA que não é apenas uma ferramenta importante, mas essencial para a evolução do nosso negócio e das nossas equipas. Já está a transformar várias áreas, e promovemos a sua adoção para capacitar as equipas a utilizarem o seu potencial ao máximo.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: clubeexpresso@expresso.impresa.pt

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