Retenção ou rotatividade? A nova questão na busca de talento

Ana Baptista
Quando o tema são os recursos humanos, o grande debate dos últimos anos tem sido sobre como atrair e reter trabalhadores nas empresas. Não só os mais qualificados e com competências digitais avançadas, mas também “os mais tradicionais, como os serralheiros, mecânicos ou pintores que estão em vias de desaparecimento”, repara Paula Arriscado, diretora corporativa de pessoas, marca e comunicação do Grupo Salvador Caetano.
Ora, num contexto laboral onde há uma “competição muito grande, já não há fronteiras, há exportação física de talento” e há “pessoas que estão a trabalhar cá para companhias lá fora”, as empresas têm de ser criativas na forma de atrair e reter esses trabalhadores. Não só através de melhores salários, mas acima de tudo através de “benefícios emocionais”, como “uma maior flexibilidade” e “autonomia”, diz Paula Arriscado.
O desafio é tão grande, acrescenta, que agora a reflexão tem sido outra: devem as empresas continuar a apostar na retenção de talento ou, ao invés, na rotatividade de pessoas? A Salvador Caetano, a Sonae e a Corticeira Amorim são exemplos de empresas que já fazem essa reflexão e, para já, a conclusão é de que a solução passa por uma conjugação das duas. “Caminhamos para um patamar em que teremos mais entradas e saídas dentro das empresas e vamos conseguir reter algumas pessoas”, diz Alexandra Godinho, diretora de recursos humanos da Corticeira Amorim. Até porque, acrescenta Miguel Tolentino, diretor de recursos humanos da Sonae, “aumentar a mobilidade das pessoas — e mobilidade não é necessariamente para fora — permite que a empresa esteja mais capacitada para a mudança e permite um maior desenvolvimento das pessoas”.
Aliás, para José Machado, diretor de recursos humanos do grupo DST, a capacidade de adaptação é uma competência essencial em empresas que procuram aumentar as suas exportações e dessa forma contribuir para o objetivo da iniciativa Portugal Export +60’30, promovida pela Associação Empresarial de Portugal (AEP) e o Novo Banco: ter as exportações a valer 60% do PIB em 2030.
Lei laboral tem de mudar
“É obrigatório o registo de entrada e saída; as paragens ao fim de cinco horas de trabalho e de uma hora para descansar... Mas depois temos colaboradores que dizem que fazem uma dieta intermitente e não precisam de parar uma hora.” Quando Paula Arriscado deu este exemplo, para mostrar como “a nossa lei laboral está desatualizada face ao atual contexto de trabalho”, ouviram-se alguns risos de concordância na sala. De facto, repara Alexandra Godinho, “as gerações novas não têm nada a ver com as mais antigas” e, por isso, é preciso “uma maior flexibilidade na lei laboral”.
Este foi um dos recados que os empresários presentes no segundo almoço-debate da Portugal Export +60’30 deixaram para o novo Governo que aí vem, mas não foi o único. Exigiu-se ainda a descida da “elevada carga fiscal” que incide sobre o trabalhador, como refere Luís Correia, CEO da Planície Verde; o aumento do número de creches a nível nacional, como lembra Alexandra Lopes, administradora do grupo Visabeira. E também ainda criar mais formação financiada e incentivos para fixar trabalhadores no interior e para que os imigrantes — na sua maioria jovens qualificados — regressem ao país (ver gráfico). Porque, recorda o administrador do Novo Banco, Andrés Baltar, “temos 30 mil que saem do país todos os anos”.
Em percentagem
“Temos muitos empregos sem pessoas e muitas pessoas sem emprego”
João Veloso
Vice-reitor da Universidade de Aveiro
“O sistema educativo está completamente obsoleto”
José Esteves
Reitor da Porto Business School
“Não vai ser a inteligência artificial que vai fazer um detalhe num rodapé”
José Machado
Diretor de recursos humanos do grupo DST
Portugal Export
Decorreu esta semana, no Porto, o segundo dos três almoços-debate do Portugal Export +60’30, projeto da Associação Empresarial de Portugal (AEP) e do Novo Banco — a que o Expresso se associa como media partner — que pretende incentivar as exportações portuguesas a atingir os 60% do PIB em 2030.
Textos originalmente publicados no Expresso de 12 de janeiro de 2024
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