Incerteza de 2023 dá lugar a expectativa em 2024

Ana Baptista
No Encontro Fora da Caixa que a Caixa Geral de Depósitos (CGD) e o Expresso organizaram no início deste ano, e onde se discutiram as perspetivas para 2023, a única certeza que os empresários tinham era de que não tinham certezas nenhumas. Nem sobre os impactos da guerra na Ucrânia, que já levava quase um ano de duração; nem sobre se as taxas de juro iam descer ou continuar a subir; nem se a inflação ia continuar nos níveis a que estava.
Agora, no último Encontro Fora da Caixa de 2023, que aconteceu esta semana e onde se discutiram as perspetivas para 2024, mantém-se a incerteza, mas com uma elevada expectativa, principalmente no que toca às taxas de juro. Até porque alguns dos impactos da guerra já foram ultrapassados (por exemplo, nas cadeias de abastecimento) e a inflação já começou a descer. Só falta mesmo o Banco Central Europeu (BCE) baixar as taxas de juro. E aqui as opiniões dividem-se.
O economista Pedro Brinca acredita que pode acontecer “ainda em junho, mas pode ser antes”. Já o economista João Duque é “um bocadinho mais conservador”, confessa, porque, diz, “o BCE baixa as taxas de juro quando perceber que a política adotada é demasiado cáustica para as economias do centro da Europa, por exemplo caírem mais de 2%”. E o CEO da CGD, Paulo Macedo, segue pela mesma via: “Pessoalmente, não acredito que haja baixas já no primeiro trimestre, porque a inflação ainda está a 2%, e partilho da opinião de alguns economistas de que a inflação vai ficar nos 2%, porque ainda há custos energéticos e custos da desglobalização [mudança para cadeias de abastecimento de proximidade].”
Não é, por isso, de estranhar que a evolução das taxas de juro tenha sido uma das principais preocupações durante 2023 e que o continue a ser em 2024. Não só para as famílias, que veem os seus empréstimos aumentar significativamente, mas também para as empresas, independentemente da dimensão e negócio.
Por exemplo, para operadores turísticos como o Savoy, da ilha da Madeira, as taxas de juro altas tiram poder de compra às famílias portuguesas que iriam ocupar os seus hotéis e que “são um mercado importante” para o grupo, diz o presidente executivo (CEO), Roberto Santa Clara. Para a construtora Mota-Engil, significa pagar mais pelo financiamento que pede à banca para diversificar o negócio, nota o CEO, Carlos Mota Santos. Já para os bancos pode originar uma descida nos pedidos de financiamento para grandes projetos e também um aumento do malparado, o que, “felizmente, não tem havido”, repara o CEO da CGD, Paulo Macedo. Em parte porque baixaram os spreads de alguns empréstimos, atenuando o impacto da subida.
As outras preocupações
O que também está a provocar alguma expectativa nas empresas é a capacidade de atração de investimento estrangeiro. Em causa está a demissão do primeiro-ministro, António Costa, por causa da Operação Influencer, que investiga um alegado tráfico de influências na construção de um centro de dados em Sines. Notícias que, diz a economista Sandra Maximiano, “têm impacto na atração de capital físico e humano e não abonam a nosso favor”. De facto, conta João Duque, quando “a primeira página do ‘Financial Times’ diz que António Costa se demitiu por suspeitas de corrupção no seu círculo próximo”, isso tem impacto na imagem do país e, consequentemente, na capacidade de atrair investimento estrangeiro. “Um advogado contou-me que três clientes que não estavam seguros em vir para Portugal desistiram. E nós precisamos de capital estrangeiro e de capital de risco, não é de depósitos e Certificados de Aforro”, repara.
Para Rui Tavares, historiador e fundador do Livre, está também em causa a confiança nas instituições, condição relevante quando Portugal se prepara para mais umas eleições antecipadas, apenas dois anos depois de outras eleições antecipadas. De acordo com os empresários presentes no Encontro Fora da Caixa, este é outro momento que causa alguma expectativa, e, por isso, deixam recados ao novo Governo.
Como a urgência em “resolver o problema da habitação”, diz Pedro Gomes, presidente do Conselho de Administração da Teleperformance Portugal, para quem a falta de casas a preços acessíveis é um “problema” à tão necessária atração dos trabalhadores qualificados que as empresas procuram. Ou a necessidade de se fazer “uma reestruturação dos serviços ainda mais profunda”, repara Sónia Fernandes, administradora financeira da Cândido José Rodrigues II Renewables e para quem o ritmo do Estado não está ao ritmo das empresas. “Os nossos governantes acham que vivemos 500 anos. É tudo muito lento”, remata, por sua vez, Sandra Maximiano.
Os distinguidos do Prémio Expresso Economia | Caixa Geral de Depósitos foram conhecidos na segunda-feira à noite na Culturgest, em Lisboa. Nesta sexta edição foram entregues 21 prémios, distribuídos por sete categorias, sendo a escolha Empresário do Ano e Conquista Empresarial do Ano da responsabilidade da redação do Expresso e os restantes da Informa DB e da Deloitte, responsáveis pela elaboração da lista das 1000 maiores empresas em Portugal e parceiros desta iniciativa.
Fora da Caixa
Os desafios de Portugal marcaram o último Encontro Fora da Caixa de 2023, conferência organizada pela Caixa Geral de Depósitos — ao qual o Expresso se associou como media partner.
Textos originalmente publicados no Expresso de 15 de dezembro de 2023
Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: clubeexpresso@expresso.impresa.pt