Só 55% da população tem competências digitais básicas
O secretário de Estado da Digitalização e da Modernização Administrativa, Mário Campolargo, mantém a expectativa de que a regulação europeia possa ser uma referência para o resto do mundo
Rui Oliveira
Portugal está acima da média europeia em três dos cinco pilares analisados pelo Relatório da Década Digital, desenvolvido pela Comissão Europeia, mas tem um longo caminho a trilhar, especialmente no que se refere à literacia e competências digitais das empresas e da população. Conheça outras conclusões do Fórum das Competências Digitais, que decorreu hoje, promovido pela iniciativa Portugal INCoDe 2030 e a que o Expresso se associou como media partner
Fátima Ferrão
Garantir a inclusão, através das competências digitais básicas, que agora envolvem igualmente a literacia em inteligência artificial (IA), mas também através da formação avançada para atualização e requalificação de profissionais para os desafios impostos pela tecnologia, é a principal meta da estratégia nacional que engloba iniciativas como o INCoDe 2030, o .PT ou o Portugal Digital. Na conferência que encerra o mês das competências digitais, Maria Manuel Leitão Marques, diretora do Fórum para as Competências Digitais, destacou a importância desta transformação da sociedade e das empresas para que o país se posicione de forma mais competitiva e preparada para lidar com os desafios do futuro. Mas, para fazê-lo, aquela responsável assegura que é “necessário responsabilizar o sector privado, envolver o sector social, estabelecer parcerias com investigadores, uma vez que se trata de um desígnio coletivo fundamental para a competitividade, mas também para a coesão social e territorial”.
Maria Manuel Leitão Marques falava, através de uma mensagem gravada, na abertura do Fórum para as Competências Digitais, que decorreu esta manhã na Super Bock Arena, no Porto, promovida pela iniciativa INCoDe 2030, e à qual o Expresso se associou como media partner. A responsável reforçou igualmente a importância da qualificação e da formação ao longo da vida que, acredita, “deve ser personalizada, interativa e antecipatória, adequada a todas as pessoas, e prevenindo o desemprego”, alertando também para a necessidade de “andar mais depressa e de ser mais criativo nas metodologias e formas de o fazer”. Como exemplo aponta a recente inauguração do primeiro centro TUMO em Coimbra, um projeto que oferece um programa educativo que combina tecnologia e criatividade a jovens entre os 12 e os 18 anos, totalmente gratuito e assente num modelo educativo “aprender fazendo”.
“É preciso investir em ferramentas digitais que criam valor para a sociedade”, apontou igualmente o primeiro-ministro António Costa, que também se dirigiu à plateia por intermédio de uma gravação prévia. O governante defende o digital como “um facilitador”, e garante que este é um “pilar estratégico das políticas públicas”.
Arlindo Oliveira, coordenador geral das estratégias de dados, IA e web 3.0, destacou a importância de construir em Portugal um ecossistema robusto assente numa economia competitiva e colaborativa
Rui Oliveira
Criar um ecossistema robusto até 2030
Apesar da evolução digital registada em Portugal na última década, o país debate-se atualmente com dois desafios simultâneos. Por um lado, apenas 55% da população dispões das competências digitais básicas, o que obriga a um esforço de aceleração para que este conhecimento chegue a todos os portugueses e, por outro, a cresce a necessidade de requalificar profissionais de várias áreas para que Portugal possa ser mais competitivo e não perder “o comboio europeu”, mas também para reduzir o impacto da escassez de talentos transversal a nível sectorial e global. Para tal, e como explica Arlindo Oliveira, “estamos a desenvolver em paralelo três estratégias para colocar Portugal numa posição competitiva e extrair o maior valor possível de cada uma delas”. O coordenador geral das estratégias de dados, IA e web 3.0, keynote speaker nesta conferência, assumiu que a meta desta estratégia tripartida passa por construir, até 2030, “um ecossistema robusto assente numa economia competitiva e colaborativa”.
Em jeito de provocação ao painel de debate que se seguiu, Arlindo Oliveira citou alguns dos desafios que o país, mas também a Europa e o mundo, terão que ultrapassar relativamente à massificação da IA na vida diária das empresas e das pessoas. Questões como os riscos, a regulamentação ou a capacidade de Portugal diferenciar-se e posicionar-se como influenciador foram alguns dos temas que quis aflorar, mas deixar em aberto para ouvir outras perspetivas por parte dos oradores presentes.
No debate sobre “A importância das competências digitais na IA” participaram Alípio Jorge, da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, Andrés Ortolá, da Microsoft Portugal, Joana Goncalves Sá, do Laboratório de Instrumentação e Física Experimental de Partículas, João Dias, da Agência para a Modernização Administrativa (AMA), e Paulo Nuno Vicente, da NOVA FCSH - Instituto de Comunicação da NOVA.
Seguiu-se um balanço do programa Emprego +Digital, feito pelo Secretário de Estado do Trabalho, Miguel Fontes, o lançamento da 2ª Edição da Campanha #Lerantesclicardepois, promovida pelo Centro Nacional de Cibersegurança (CNCS), e a entrega dos prémios SELO “uma ação INCoDe 2030”, cujo vencedor foi o projeto “Technnovation Girls Portugal”, que tem por objetivo a capacitação de raparigas nas áreas STEAM (Science, Technology, Engineering, Arts, Mathematics).
Luísa Ribeiro Lopes, Coordenadora Geral do INCoDe 2030, aponta o progresso de Portugal nos indicadores digitais, apesar de 55% da população ter apenas competências digitais básicas
Rui Oliveira
A encerrar o Fórum para as Competências Digitais, o Secretário de Estado da Digitalização e da Modernização Administrativa, não quis deixar de destacar o empenho do Governo no desenvolvimento de políticas públicas de transformação digital “que permitam a Portugal estar na vanguarda da evolução tecnológica”. O governante recorda que o país faz parte das 10 Digital Nations, uma rede colaborativa dos governos digitais que são líderes a nível mundial, e que tem como meta “aproveitar a tecnologia digital para melhorar a vida dos seus cidadãos”. O secretário de Estado alerta, no entanto, que “o digital é importante, mas não é um fim em si mesmo. É um facilitador das relações entre empresas, pessoas e Estado, criador de novos modelos de negócio, e de transformações societais importantes”.
Outras conclusões:
Não devemos precipitar-nos para a regulação da tecnologia e aplicação da IA com medo dos riscos, mas perceber quais são riscos reais com pilotos experiências e análises, e só depois criar legislação. “Portugal poderia desempenhar um papel interessante ao criar centros de excelência, e ambientes adequados ao teste de algumas tecnologias”, defende Arlindo Oliveira.
“Portugal tem oportunidade única de converter-se num test bed de quase tudo porque é pequeno e dispõe de muito talento”, afirma Andrés Ortolá.
IA abre manancial de possibilidades, em especial no sector público, mas credibilidade e dados com que se treina o algoritmo é fundamental, “porque se não for fiável pode levar a resultados menos credíveis”, aponta João Dias.
Europa assumiu que ia liderar na regulação, mas desistiu de liderar do ponto de vista do conhecimento, da investigação e do desenvolvimento. “Os estados desistiram também”, acredita Joana Gonçalves Sá.
“IA vai gerar novos empregos e novas oportunidades”, diz Alípio Jorge, e “vai permitir focar em tarefas de valor”, complementa Andrés Ortolá. Risco é, como defende Paulo Nuno Vicente, que novas potencialidades não agravem desigualdades digitais. “Temos que intervir para que assim não seja”.