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É difícil (mas possível) arriscar num país avesso ao risco

De Marco de Canaveses para o mundo, Belmiro de Azevedo moldou a Sonae e foi o primeiro vencedor do EY Entrepreneur of the Year
De Marco de Canaveses para o mundo, Belmiro de Azevedo moldou a Sonae e foi o primeiro vencedor do EY Entrepreneur of the Year
António Pedro Ferreira

Reconhecimento: após dedicarem décadas a atividades que acreditam criar valor social e económico, alguns dos principais empresários portugueses não escondem a insatisfação perante os entraves que lhes colocam. Mas não viram a cara à luta

É difícil (mas possível) arriscar num país avesso ao risco

Tiago Oliveira

Jornalista

Na década de 70, Dionísio Pestana saiu da África do Sul rumo à Madeira, “praticamente sem falar português”, com a missão de “tentar salvar o hotel” que o pai “tinha construí­do”. Será seguro dizer que a tarefa foi cumprida com êxito, só que o presidente do Pestana Hotel Group não tem dúvidas de que este impacto não é valorizado porque “em Portugal há sempre um ‘mas’ quando se fala do mundo das empresas”.

Vencedor em 2011 do EY Entrepreneur of the Year (prémio a que o Expresso se associa e cujos detalhes da 9ª edição pode conhecer nesta página), Dionísio Pestana estranha que o mundo empresarial seja “sempre olhado com alguma desconfiança, apesar de ser a fonte que cria mais e melhor emprego, paga mais impostos e gera mais riqueza económica”. Num país com uma cultura muitas vezes avessa ao risco, é preciso “desde logo” terminar com “o estigma associado a um percalço, que não deverá impedir que se avance para o próximo”, ao mesmo tempo que pede “políticas públicas facilitadoras” ou que, no mínimo, não “desincentivem a atividade económica”.

Segundo Guy Villax — que deixou no ano passado o cargo de CEO da Hovio­ne após mais de 20 anos à frente dos destinos da farmacêutica —, os “verdadeiros empreendedores” não têm medo dos obstáculos. No momento de se lançar na aventura dos negó­cios, “o grande desafio é encontrar as pessoas certas e motivá-las para ter os melhores recursos humanos”. O vencedor do prémio em 2021 defende que é “muito difícil estimular o risco, porque nas organizações grandes a forma de funcionar e o contexto da empresa por vezes não premeiam o talento, e mesmo que entre gente nova com vontade de andar para a frente é muito difícil alterar o que lá está”. O resto — se é que assim se pode dizer — é perceber como lidar com as oportunidades, “porque a dificuldade é apenas outra palavra para definir oportunidades”. E Guy Villax deixa um alerta: “O empreendedor avança ou muda-se. Veja-se o que Portugal tem perdido de vantagens competitivas sobre outros países e como tem sido ultrapassado por outros que crescem mais.”

Custos de contexto

Vivemos “num país onde o sucesso não é devidamente valorizado e apreciado”, argumenta António Rios Amorim. O presidente do Conselho de Administração da Corticeira Amorim destaca as “dificuldades burocráticas” ou, por outras palavras, “os famosos custos de contexto que desmotivam” e que fazem com que conheçamos “os casos de sucesso” mas desconheçamos “aqueles que deixaram cair os seus sonhos”, porque “acabaram por desistir”. Distinguido em 2017, o empresário reforça que “quem deveria facilitar e contribuir é quem mais entraves cria” e que é importante estabelecer que “ninguém procura ajuda”, só a “eliminação dos obstáculos”. Com a certeza de que o “esforço” que os empreendedores têm de assumir “para colocar de pé as suas realizações vale a pena!” Mesmo com as dificuldades, “nada é mais nobre do que conseguir a felicidade através das suas realizações e o sucesso dos seus projetos. O impacto sobre todos os que nos rodeiam é gratificante”.

Vencedor do prémio Empreendedor do Ano em 2009, Carlos Moreira da Silva entende que “o empreendedor distingue-se dos outros porque está disposto a arriscar o seu trabalho e o seu capital sabendo que o pode perder”, e, mesmo assim, “nem sempre a sociedade lhe reconhece este contributo, porque a fraca literacia económica não ajuda a entender o risco e as suas contrapartidas positivas, como os lucros, e negativas, como o prejuízo e, no limite, a falência”. O agora fundador e CEO da Teak Capital até refere que “não é difícil levar para a frente uma ideia de negócio em Portugal, pelo menos não é mais difícil do que em qualquer outro país europeu”. A cultura é que muitas vezes faz a diferença, porque “nenhum empreendedor, nem mesmo os mais bem sucedidos, está isento de muitos fracassos”. Sem arrependimentos pelo caminho trilhado, pois, “se não abandonarmos a nossa zona de conforto, o declínio é inexorável”.

Em resumo, “desenvolver novos negócios implica necessariamente assumir riscos, e necessitamos de mais espírito inovador e empresarial em Portugal”, garante António Horta Osório. O presidente do júri da edição deste ano do EY Entrepreneur of the Year “acredita que, para Portugal crescer mais, impõe-se uma forte aposta na inovação”, o que obriga a “mais apoios públicos dirigidos à inovação, em detrimento de outros, sem aumentar o peso do Estado na economia”. Estamos perante o que “deve ser uma prioridade nacional”, sem esquecer que “a responsabilidade pela inovação não pode ser atribuí­da apenas ao Estado”. Ao “mundo empresarial” cabe um “papel fundamental a desempenhar na condução da inovação, na medida em que são as empresas que conhecem melhor os seus mercados”, o que “implica ter uma atitude de espírito de inovação permanente”.

Como funciona o prémio empreendedor do ano

O que é?

Programa Com arranque nos EUA em 1986, o EY Entrepreneur of the Year já se realizou em mais de 60 países, com um total aproximado de 10 mil candidaturas por ano em todo o mundo. Em Portugal, esta será a 9ª edição (pode conhecer os vencedores mais abaixo).

Quem já venceu internacionalmente?

Distinguidos Nomes como Jeff Bezos (Amazon) ou Serguei Brin e Larry Page (Google).

Quem pode participar?

Critérios A candidatura (que pode ser por iniciativa própria ou indicação de outrem) tem de cumprir requisitos como deter uma participação mínima de 10% no capital social da empresa e participar ativamente na gestão da empresa há pelo menos dois anos (com funções executivas ou de chairman ativo). Deve ter centro de decisão em Portugal, volume anual de negócios superior a €10 milhões e um mínimo de 10 colaboradores. Se a candidatura for de uma equipa de empreendedores, esta deve apresentar um máximo de três candidatos.

O que se procura?

Requisitos Capacidade de identificar oportunidades, construir e liderar equipas em torno de um objetivo comum ou tenacidade e resiliência perante a adversidade com apoio à criação de valor, além da atividade empresarial.

Como se faz a escolha?

Processo Os finalistas e posterior vencedor do EY Entrepreneur of the Year serão determinados por um júri presidido por António Horta Osório.

Quais são as datas?

Fases O período de candidaturas já arrancou a 17 de fevereiro e decorre até 12 de maio. O anúncio dos finalistas terá lugar a 26 de maio e a entrega do prémio será feita a 29 de junho de 2023. Pode candidatar-se ou nomear alguém AQUI.

Vencedores em Portugal

2021 Guy Villax, Hovione

2017 António Rios Amorim, Corticeira Amorim

2015 Bento Correia e Miguel Leitmann, Vision-Box

2013 Manuel de Mello, Nutrinveste

2011 Dionísio Pestana, Pestana Hotel Group

2009 Carlos Moreira da Silva, BA Glass

2007 Carlos e Jorge Martins, Martifer

2006 Belmiro de Azevedo, Sonae

Empreendedor do Ano

O Expresso associa-se ao prémio EY Entrepreneur of the Year — um dos mais cotados programas globais de empreendedorismo —, que, em Portugal, atinge a 9ª edição, isto depois de anteriormente ter distinguido gestores como António Rios de Amorim ou Dionísio Pestana. Acompanhe ao longo dos próximos meses.

Textos originalmente publicados no Expresso de 24 de fevereiro de 2023

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: toliveira@impresa.pt

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