O futuro da transição energética passa por aqui

Academia. Melhores teses de mestrado para o Prémio REN 2022 foram entregues e mostram o foco na qualidade do sistema e da rede elétrica perante um aumento da produção renovável
Academia. Melhores teses de mestrado para o Prémio REN 2022 foram entregues e mostram o foco na qualidade do sistema e da rede elétrica perante um aumento da produção renovável
Antes de começar a fazer a tese de mestrado na Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP), José Bessa “não ligava muito” ao tema das previsões probabilísticas das energias renováveis. Mas à medida que foi fazendo o trabalho ficou “com o bichinho”, e agora é isso que está a fazer na empresa de renováveis onde está a trabalhar. “Para já, estou a fazer previsões determinísticas, mas quero evoluir para as probabilísticas, porque quando as empresas dão à REN a estimativa de quanto vão produzir, se em vez de darem um valor fixo derem intervalos de valor, há menos probabilidade de haver desvios, e com isso poupam dinheiro, porque são taxadas pelos desvios”, explica.
José Almeida, do Instituto Superior de Engenharia do Porto (ISEP), também desenvolveu um modelo para prever mais depressa o consumo de eletricidade tendo em conta uma maior introdução de painéis solares e carros elétricos, o que permite que as empresas giram melhor as redes de distribuição. Os resultados foram tão bons que vai continuar a estudar este tema no doutoramento que está a fazer na Universidade de Salamanca e alargar o seu âmbito, incluindo “os carros autónomos e o tráfego”.
Já Francisco Fernandes, também aluno da FEUP e que tem “gosto por tudo o que são engenharias renováveis desde miúdo”, apresentou uma tese sobre o impacto que o aumento da produção renovável até 2040 na Península Ibérica vai ter nas redes elétricas e concluiu que são precisas medidas mitigadoras “para evitar problemas de estabilidade de frequência, como um apagão ou terem de desligar as luzes dos consumidores”. Um trabalho que lhe valeu 20 valores e desafios suficientes para continuar a investigar o tema no INESC TEC, no Porto, e também no doutoramento que está a fazer agora sobre a “estabilidade da rede elétrica”.
Há ainda Ariel Neves, que na sua tese de mestrado na Universidade de Aberdeen, na Escócia, analisou o potencial de metano da matéria orgânica usada nas centrais de biomassa, porque está “envolvida numa startup nesta área, chamada Kiapembe Energy”.
E também Valdemar Armindo, que estudou, na Universidade de Coimbra, diferentes métodos para diagnosticar, de forma rápida e não-invasiva, avarias em motores de carros elétricos ou geradores eólicos, concluindo que “é melhor estudar os sinais de potência do que a tensão para prever estas avarias”, diz.
E, por fim, Rute Santos, cuja tese de mestrado — feita também na Universidade de Coimbra — analisou o impacto das correntes geomagnéticas provocadas por tempestades solares nas redes de eletricidade. Algo que fez não de uma, mas de duas formas: desenvolveu um sensor que detetou “algumas tempestades muito pequeninas desde agosto de 2021” e concluiu que a rede é suficientemente “robusta” para as suportar; e avaliou se os cabos de guarda — aqueles que estão por cima das redes para as proteger de relâmpagos — também protegiam das correntes geomagnéticas, concluindo que “na rede portuguesa estes cabos fazem com que essa corrente seja mais baixa”. Mas o trabalho que fez também a deixou com novas dúvidas, como deve fazer qualquer trabalho científico, e por isso é que diz, sem hesitar, que “este estudo não está finalizado”. “Gostaria de melhorar o sensor, de conseguir prever quando ocorrem as tempestades, quais as subestações que podem ser afetadas ou qual o risco de uma grande tempestade”, conta. Algo que está a fazer no doutoramento e em dois centros de investigação.
José Bessa, José Almeida, Francisco Fernandes, Ariel Neves, Valdemar Armindo e Rute Santos têm em comum serem vencedores do Prémio REN 2022, que todos os anos distingue as melhores teses de mestrado na área da energia, e das Medalhas de Mérito, que há dois anos premeia trabalhos de investigação de estudantes de países africanos de língua oficial portuguesa (PALOP). Mas têm também em comum serem agentes futuros da transição energética e climática, que, segundo o CEO da REN, Rodrigo Costa, “é o maior desafio que temos pela frente”.
De facto, repara o presidente do júri do Prémio REN, o professor João Peças Lopes, as teses vencedoras “são o reflexo da trajetória que estamos a seguir da eletrificação suportada pelas energias renováveis”. E os temas abordados este ano abrangem outras vertentes da transição energética, como a gestão das redes, a relação com a indústria ou a procura de soluções para reduzir os custos dos equipamentos e das empresas. E não só mostram como a transição energética e climática está “bem entregue”, como diz Rodrigo Costa, como são “uma demonstração de que Portugal está muito bem servido por uma comunidade académica dinâmica”, repara o ministro do Ambiente, Duarte Cordeiro, também ele presente na entrega dos prémios esta semana.
FRASE MINISTERIAL
“Os trabalhos premiados são uma demonstração de que Portugal está muito bem servido de uma comunidade académica dinâmica”, Duarte Cordeiro, Ministro do Ambiente e da Ação Climática
Na 27ª edição dos Prémios REN foram distinguidas as habituais cinco teses de mestrado, uma vez que o prémio de melhor doutoramento só é entregue de dois em dois anos. Além disso, foram entregues duas medalhas de mérito científico a mulheres e estudantes de países africanos de língua portuguesa, um prémio que nasceu em 2021 no âmbito de uma parceria entre a REN, o Centro Ciência LP e a Fundação para a Ciência e Tecnologia.
PRÉMIOS REN
Melhor Tese de Mestrado
Medalhas de Mérito Científico REN-Ciência LP
Categoria Mulheres Investigadoras
Categoria Estudantes
Prémio REN
Já são conhecidos os vencedores da 27ª edição do Prémio REN — que todos os anos distingue as melhores teses de mestrado na área da energia — e os eleitos com as Medalhas de Mérito Científico, destinadas a estudantes e investigadores dos PALOP. A cerimónia, organizada pela REN, o Centro Ciência LP e a Fundação para a Ciência e Tecnologia, contou, mais uma vez, com a parceria do Expresso.
Textos originalmente publicados no Expresso de 2 de dezembro de 2022
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