Procura-se agricultura mais competitiva

Modernização: num contexto de crise global, o sector primário português procura melhorar com alternativas inovadoras e mais sustentáveis e apela a políticas mais adequadas e estruturantes
Modernização: num contexto de crise global, o sector primário português procura melhorar com alternativas inovadoras e mais sustentáveis e apela a políticas mais adequadas e estruturantes
A produção agrícola em Portugal vive numa encruzilhada. Os pontos de tensão são vários e vão desde a crise climática à disrupção das cadeias de abastecimento, e o resultado é uma tempestade perfeita.
“Temos necessariamente de nos tornar mais competitivos, mas também temos de nos focar na questão da sustentabilidade”, resume Filipe Figueiredo, CEO da Quinoa Portuguesa, para quem parece claro que “temos de olhar para uma agricultura moderna com vista à introdução de mais-valias para a alimentação do nosso consumidor e apostar em diversidade e novidade”. O objetivo “passa por produzir mais, melhor e com a menor agressão ao ambiente possível”. Parece simples, certo? Não é, e se, na opinião de Filipe Figueiredo, “o agricultor ou empreendedor português é um especialista em criar soluções”, tal não basta.
O Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) reserva €994 milhões em apoios para a agricultura, ao passo que o Plano Estratégico da Política Agrícola Comum (PEPAC) para Portugal, que entra em vigor em janeiro de 2023, tem uma dotação de €6713 milhões com ligações à nova estratégia comunitária da União Europeia, que valoriza a produção sustentável e inovadora através de estratégias como a “Do prado ao prato”. Já o Orçamento do Estado deste ano viu a verba para a agricultura ser reforçada em €51 milhões, mas “os apoios têm de ser claramente para ajudar e não procurar complicar a tarefa do agricultor”, reflete Filipe Figueiredo.
Insatisfação
O presidente da Confederação dos Agricultores de Portugal, Eduardo Oliveira e Sousa, acusa o Ministério da Agricultura de estar “a entrar numa espécie de colapso, sem um rumo e sem dar apoio aos agricultores”. O dirigente revelou tentativas de “sensibilizar o Governo para haver medidas específicas dirigidas para o sector e proteger a produção numa altura particularmente sensível”. E não esconde alguma insatisfação. “É uma pena não termos de facto um momento de reconhecimento”, confessa, com um apelo à “necessidade” de fomentar políticas que “chamem os jovens com base em valorização económica”, algo que está a diminuir, “sobretudo nas regiões mais remotas, onde as infraestruturas escasseiam”. Contudo fica uma certeza: “A agricultura não parou nem nunca parará.”
“Estamos todos a sofrer com o aumento dos custos de produção” e com a “falta de confiança dos consumidores”, apontou Gonçalo Lobo Xavier na cerimónia de atribuição do Prémio Intermarché Produção Nacional (cujos vencedores pode conhecer melhor na coluna da direita). Perante a presença da ministra da Agricultura, Maria do Céu Antunes, e em resposta à anunciada contribuição extraordinária de 33% a aplicar sobre os lucros excedentários das grandes empresas de distribuição alimentar, o presidente da Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição (APED) garantiu que “punir empresas que tiveram um bom desempenho e não se aproveitaram da subida da inflação é manifestamente injusto”. Por seu turno, a governante falou da necessidade de desenvolver um esforço conjunto e prometeu “fazer face ao aumento brutal dos preços dos pesticidas e dos fertilizantes”, assim como o compromisso para que até 2030 metade do território nacional seja de “produção sustentável”.
Para o presidente do Conselho de Administração do Intermarché, Rui Pereira, “deparámo-nos com problemas gravíssimos”, com “aumentos de preços diários” e uma “produção mais cara”. Ou seja, “dadas as dificuldades que todas as instituições têm”, é cada vez mais difícil “manter a diferença entre a inflação real e o preço para o consumidor”. Perante os problemas, “apostar na produção nacional e em atividades que a valorizem” é talvez o único caminho possível, defende Paulo Vaz, coordenador do Portugal Sou Eu, até com o exemplo de que a “proximidade reduz a pegada carbónica” dos agricultores, algo essencial face a uma pressão ambiental maior.
Sem desanimar, Pedro Queiroz, diretor-geral da Federação das Indústrias Portuguesas Agro-Alimentares (FIPAA), lembra que “a agricultura nacional tem dado provas da sua capacidade de modernização, em particular no que toca à inovação e integração de novas tecnologias”. O mais importante “é compatibilizar o binómio tecnologia-sustentabilidade, ou seja, ter como meta a modernização tecnológica das explorações e o caminho de uma produção mais sustentável, em particular no que toca à boa gestão de recursos”, para não só sobreviver como competir com os melhores.
€55,5
milhões foi o volume de negócios do sector agrícola em 2021, segundo os dados do Banco de Portugal
12%
é a percentagem aproximada das emissões portuguesas de gases com efeito de estufa com origem na agricultura, fora das metas climáticas
Spirulina artesanal, Tomar Natural Trata-se de um superalimento com diminuto impacto ambiental e cuja oferta era apenas oriunda de importação de fora da União Europeia. A produção é sazonal e é realizada em tanques de pequeno volume, localizados dentro de uma estufa, que permite otimizar as condições de produção e evitar contaminações.
Salicórnia fresca biológica, Salivitae O projeto começou como uma resposta ao aumento da salinidade dos solos, do nível médio do mar e da escassez alimentar da população mundial, e redundou na criação de um produto gourmet com nutrientes naturais e que não é apenas um substituto do sal. A salicórnia permite preservar as espécies autóctones, bem como fomentar a sua utilização comercial e gastronómica.
Bretzel de maçã de Alcobaça, Europastry Trata-se de um produto de pastelaria em forma de laço inspirado no formato do pretzel e elaborado com base numa receita com mais de 20 anos. Tem uma grande componente artesanal com cada laço a ser formado e decorado manualmente com um perolado de açúcar e canela, tornando cada “peça” única.
Cozido D’Aldeia, Servipal Imagine um cozido à portuguesa em versão enchido. É o que acontece com este produto, composto por carne e gordura de suíno, arroz carolino, diversos enchidos e cheio em tripa de vaca. Elaborado a partir de matérias-primas selecionadas, é rápido e fácil de preparar, uma vez que já vem pré-cozinhado.
Cachaço fumado com queijo de cabra, Quinta dos Fumeiros A inovação neste novo produto reside em juntar cachaço, queijo de cabra e vinho Alvarinho numa fatia só, com o formato de um queijo de formato redondo, pasta dura, e revestido exteriormente por uma massa de pimentão que confere uma cor alaranjada, com o processo a ser implementado em duas etapas distintas.
Ruibarbo em doce extra, Planalto Dourado A plantação de ruibarbo é sobretudo comercializada em lojas de produtos biológicos, uma vez que o produto assim se encontra certificado. Nos doces, a combinação com frutos como o morango ou como a cereja dão sabores excecionais, uma vez que a acidez do ruibarbo equilibra a doçura do açúcar necessário à conservação.
Pão do Sabugueiro, Grande Forno É um pão único, em Portugal, que surgiu na Serra da Estrela a partir dos únicos cereais que existiam e que eram possíveis de cultivar no local mais alto de Portugal continental, e que se manteve vivo pela tradição dos moleiros e padeiros da região.
Bagas de Sabugueiro desidratadas, Inovfood Todo o conhecimento da planta, desde a colheita até às variedades que se encontram na zona de Tarouca (Viseu), mantém-se desde os monges cistercienses do séc. XII e são claras quanto às vantagens da desidratação ao sol das bagas de sabugueiro. E é essa versão que a Inovfood apresenta no mercado.
DISCUTIR O PAÍS
O Expresso associa-se ao Intermarché para a 8ª edição do prémio que distingue a excelência da produção nacional. Na cerimónia de atribuição, foram conhecidos os nomes dos projetos que melhor representam a agricultura portuguesa e, ao mesmo tempo, promovem a sustentabilidade e a inovação. No Momento Expresso debateram-se os “desafios da economia e o seu impacto na produção nacional”.
Textos originalmente publicados no Expresso de 25 de novembro de 2022
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