Projetos Expresso

“Cada bairro é um fato à medida, não um pronto a vestir”

Comunidade. Há muitos portugueses que não escolheram o seu bairro, mas que encontraram ali a felicidade. Porque, mesmo sem todas as infraestruturas ou condições e com os mais variados desafios, há bairros felizes por Portugal fora

Na Baixa de Santo António, em Aveiro, não há bancos de jardim nem uma casa de banho pública, mas há um relvado onde os vizinhos combinam fazer piqueniques através de um grupo de WhatsApp chamado Amigos do Bairro. E há ainda uma rua, “mais ou menos um beco sem saída”, que é cortada ao trânsito ao fim de semana para as crianças brincarem e se organizarem jogos, conta ao Expresso Alexandra Monteiro, investigadora na área de ambiente na Universidade de Aveiro e moradora na Baixa de Santo António. E é por isto que, mesmo faltando algumas infraestruturas, considera “que mora num bairro feliz”. Porque, diz, “um bairro feliz não tem de ser onde toda a gente quer morar”. Nem tem de ser o mais bonito e com mais infraestruturas. Tem sim de ser o bairro onde quem lá mora se sinta bem, nota o psicólogo António Fonseca.

“Tudo começa nas pessoas. São elas que vão dizer o que precisam”, diz Ana Monteiro, professora catedrática do departamento de Geografia da Faculdade de Letras da Universidade do Porto. Por isso é que, “às vezes, pequenos jardins fazem maravilhas”. Porque são um “ponto de encontro”, diz a socióloga Luísa Schmidt, tal como são o café, o cabeleireiro e barbeiro, a farmácia, a mercearia, o pequeno comércio, o parque infantil, o campo de futebol ou a simples mesa para jogar às cartas. Mas também as iniciativas das associações, entidades oficiais como hortas urbanas, aulas de skate para crianças e jovens ou passeios para os mais velhos. Aliás, estes microprojetos e intervenções até podem ser mais importantes que um grande centro cultural, acrescenta António Fonseca, lembrando que “bairro é uma palavra genérica que significa comunidade”.

É, por isso, que tanto Luísa Schmidt como o também sociólogo João Teixeira Lopes sugerem a criação da figura do mediador, ou seja, alguém que faça o levantamento das necessidades dos moradores e que incentive e organize iniciativas que promovam o convívio e a participação dos moradores na melhoria do bairro, como acontece em algumas localidades com os orçamentos participativos. É que, diz Ana Monteiro, “cada bairro é um fato à medida, deve ser alta-costura e não pronto a vestir”.

Luísa Schmidt concorda e entende que há infraestruturas de base que um bairro deve ter como supermercados, serviços de saúde, escolas ou transportes. “O ideal de bairro é ter acesso a tudo a que tenho necessidade em 15 minutos, mas é a humanização que torna as pessoas mais felizes”, diz. Além disso, é preciso ter atenção à limpeza das ruas, à redução do ruído e à criação de zonas de sol e sombra. “Árvores nas ruas podem diminuir a temperatura até três graus”, repara.

Encontrar bairros felizes

Durante os próximos sete meses, o Expresso vai mostrar-lhe exemplos de bairros felizes em Portugal, sempre tentando seguir o conceito referido em cima. O mote é o projeto “Bairro Feliz” que tem como objetivo apoiar causas que melhorem os bairros e/ou a relação entre moradores e, consequentemente, contribuam para melhoria da qualidade de vida das pessoas (ver caixa ao lado).

No ano passado, a primeira vez que o projeto foi implementado no país, foram entregues 2 mil inscrições e apoiadas um total de 432 causas, cada uma delas até €1000, o que representa sensivelmente €400 mil. E entre os vencedores há projetos tão diferentes como a compra de equipamento de fisioterapia para a associação de pais de Mourisca do Vouga, em Águeda, a compra de material de construção para que a Associação Portuguesa de Pais e Amigos do Cidadão Deficiente Mental de Matosinhos possa plantar hortas urbanas. Ou como a criação de uma biblioteca de rua comunitária onde os moradores do Monte Formoso, em Coimbra, podem deixar e levar livros de forma livre e gratuita; ou, ainda, como a iniciativa da Vetmedis Sociedade Veterinária, que pretende retirar da rua da ilha da Madeira 15 animais abandonados para os esterilizar, vacinar e implantar microchips.

O que é o “Bairro Feliz”

O projeto

O “Bairro Feliz” é uma iniciativa do Pingo Doce, a que o Expresso se associa, e que tem como objetivo melhorar a qualidade de vida nos bairros portugueses. Para isso é lançado um desafio onde entidades locais ou grupos de vizinhos inscrevem projetos “que promovam um impacto positivo” nos seus bairros. As ideias são depois analisadas por um painel de jurados e levadas a votação popular nas lojas.

As ideias

Têm de se enquadrar em seis áreas: ambiente; apoio animal; apoio social e cidadania; cultura, património, turismo e lazer; educação; saúde, bem-estar e desporto.

As candidaturas

Podem inscrever-se associações, IPSS, fundações, cooperativas, entidades públicas ou privadas, e grupos de vizinhos com cinco pessoas. Cada vencedor ganha até €1000 para desenvolver o projeto.

Os prazos

As candidaturas arrancaram a 19 de abril e terminam a 2 de junho.

Inscrições e regulamento

Pode saber mais AQUI. E acompanhe no Expresso e na SIC.

Bairros mais felizes

O que pode tornar os nossos bairros melhores? Que ideias novas, que projetos? O que precisamos para melhorar a nossa qualidade de vida? No segundo ano consecutivo, o Expresso associa-se ao projeto “Bairro Feliz”, um desafio lançado pelo Pingo Doce a todos os bairros, a todos os vizinhos, para descobrirem e apostarem em novas ideias. Acompanhe a nossa viagem ao longo dos próximos seis meses, do Continente à Madeira e aos Açores. Sempre nas páginas do Expresso.

Textos originalmente publicados no Expresso de 22 de abril de 2022

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: clubeexpresso@expresso.impresa.pt

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