Geração E

Portugal precisa de tempo. E o Ensino Superior também

Portugal precisa de tempo. E o Ensino Superior também

Gonçalo Osório de Castro

Presidente da Associação Académica da Universidade de Lisboa

Ora, como podemos nós reestruturar o nosso sistema de ação social, garantir aumentos exponenciais de residências públicas ou rever o Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior (RJIES), num país onde as últimas três legislaturas duraram, em média, 2 anos e 10 meses?

“O tempo é o único capital das pessoas que têm como fortuna apenas a sua inteligência”

Honoré de Balzac, escritor francês do Século XIX estava longe de saber que resumiria, numa frase, uma das maiores problemáticas da política portuguesa contemporânea.

O Ensino Superior português atravessa, hoje, uma crise sistémica. A multiplicidade de problemas que a nossa educação superior enfrenta, bem como a interligação destas problemáticas entre si requerem, necessariamente, uma visão integrada, completa e, acima de tudo, realista, do nosso sistema de ensino.

Ora, como podemos nós reestruturar o nosso sistema de ação social, garantir aumentos exponenciais de residências públicas ou rever o Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior (RJIES), num país onde as últimas três legislaturas duraram, em média, 2 anos e 10 meses? Como pode, um ministro ou até mesmo um grupo parlamentar estudar as pastas, auscultar os diversos stakeholders, desenvolver propostas, apresentá-las, aprová-las e aplicá-las no espaço de três anos?

A prática da política, em geral, e da governação, em específico, tornaram-se em exercícios de gestão a curto prazo. Hoje, os intervenientes políticos sabem que têm pouco tempo para, por um lado, expor as suas ideias e, por outro, pô-las em prática.

Efetivamente, os políticos em Portugal aprovam leis muitas vezes inconsequentes – em vez de desenvolverem projetos reformistas, pensados desde a sua conceptualização à sua operacionalização. Estabeleceu-se, em Portugal, uma espécie de “Manual da Quase-Reforma”. São múltiplos os casos em que são delineados estudos, analisadas as suas conclusões e, finalmente, as políticas públicas não se materializam. Uma espécie de “O Homem sonha, o partido quer, a obra esvai-se”.

Veja-se o exemplo, paradigmático, do Ensino Superior e de um dos seus problemas maiores – a Ação Social. Portugal é o segundo país da União Europeia onde as contribuições financeiras da família pesam mais no orçamento estudantil – constituem 68% do orçamento total. Como é possível um país em que o salário médio se fixa nos 1.100€ continuar a exigir um esforço financeiro tão desproporcional às famílias, sob pena de não conseguirem garantir à sua prole um futuro de sucesso? À partida, a resposta seria simples – não pode.

O subfinanciamento crónico da Ação Social portuguesa, bem como a sua configuração altamente complexa precisam, urgentemente, de uma reformulação. À data de publicação deste artigo, está em curso o estudo encomendado pelo anterior governo que pretende avaliar todo o sistema de ação social português. Encomendado o estudo, resta não o fadar ao que, com frequência, acontece – o esquecimento.

O tempo é, em Portugal, um recurso escasso no quotidiano político. Reformular o Ensino Superior português, seja através do RJIES, na Ação Social ou no alojamento estudantil exige tempo, coragem e, acima de tudo, estabilidade. A fragmentação partidária, a diminuição de bases eleitorais e o entrincheiramento dos partidos nas suas cúpulas ideológicas não permitem que essa estabilidade se materialize, muito menos em temas tão fraturantes e polarizadores como os que menciono ao longo deste artigo.

Portugal tem, atualmente, 448.000 estudantes no Ensino Superior dos quais necessita, liminarmente, para transformar o seu tecido económico e social. Não esqueçamos, contudo, que estes estudantes também precisam de respostas aos problemas que enfrentam todos os dias. Os estudantes precisam de Portugal. Portugal precisa de tempo.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: clubeexpresso@expresso.impresa.pt

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