Geração E

“Não Fui Eu!”: Mas quem terá sido? Homicídio num hotel de charme é tema de uma comédia policial em cena em Lisboa

Peça de Teatro "Não Fui Eu!" - Margarida Moreira, António Camalier, Francisco Beatriz e Ricardo Barbosa
Peça de Teatro "Não Fui Eu!" - Margarida Moreira, António Camalier, Francisco Beatriz e Ricardo Barbosa
Cândida Castro

Um assassinato num hotel de charme é o ponto de partida da mais recente comédia policial de João Ascenso. O Expresso esteve à conversa com três dos quatro atores que dão corpo e voz às 12 personagens (e mais algumas) da peça que estará em cena até 31 de março no Teatro Turim, em Lisboa

Um palco, quatro cadeiras e quatro atores são suficientes para fazer rir, durante uma hora e meia, a plateia do Teatro Turim, na freguesia de Benfica, em Lisboa.

Hospedados num hotel de charme, uma cantora lírica em final de carreira (Margarida Moreira), um engenheiro de obras públicas e privadas (António Camelier), um príncipe italiano (Francisco Beatriz) e o fiel recepcionista do alojamento (Ricardo Barbosa), tornam-se os principais suspeitos de um crime que chocou o país e rapidamente se tornou mediático - o assassinato misterioso do duque de Ferragudo.

Escrita pelo encenador João Ascenso e produzida pela Associação Cultural - Meia Palavra Basta, a peça de teatro “Não Fui Eu!” é, não só uma comédia policial. mas também uma crítica a uma sociedade que não parece levar nada a sério. Desde a equipa de policías (pouco) profissionais que investigam o crime aos apresentadores e comentadores, que num programa de entretenimento matinal, tentam adivinhar quem é o verdadeiro assassino com base em “bitaites”.

Pode estar a acontecer um crime hediondo mas ao mesmo tempo está a ser comentado no programa da manhã. A peça no fundo é uma tentativa de nos rimos do que são estas situações e do que acontece nos dias de hoje."

Francisco Beatriz e Margarida Moreia na peça "Não Fui Eu!" de João Ascenso
Cândida Castro

Os quatro atores interpretam 12 personagens (e meia) que “em dia bom podem chegar às 18”, revela António Camelier, referindo-se à personagem ”Mestre Guru". Uma peça que exige alguma logística mas principalmente muito trabalho, muita dedicação e disponibilidade física e mental para arriscar".

"Acho que no início foi assustador. É um espetáculo com muitas mudanças tanto de figurinos como de personagens, entradas e saídas de palco. Mas o que era terror no início agora já fazemos com uma “perninha às costas”, confessa o ator Ricardo Barbosa.

As obras de renovação do Teatro Turim atrasaram a estreia da peça, que começou a ser preparada em fevereiro de 2023, mas estreou apenas em março do ano seguinte. “Quase que parece uma preparação à cinema, de Hollywood, a preparar com um ano de antecedência [risos]”, diz António. Mas a espera parece ter valido a pena pelo feedback positivo que têm recebido do público - e nem sempre é preciso ter casa cheia para fazer um bom espetáculo.

“Muitas vezes temos dias em que estão menos pessoas e por isso pensamos que a energia [do público] não vai ser tão boa, mas no final acaba por ser o contrário. Todos os dias somos surpreendidos, felizmente pela positiva”. Para os atores, a adesão que a peça tem tido “revela a qualidade do projeto” e acaba por ser uma “lufada de ar fresco" ao verem que "as pessoas ainda vêm ao Teatro e querem apoiar a cultura", reforça António.

Ser ator e fazer teatro na era digital não preocupa Francisco Beatriz. Acredita que o teatro em Portugal vive um dos seus melhores momentos: "Todos os números indicam que o público do teatro tem aumentado em Portugal. Quase todos os teatros em Lisboa estão sempre cheios, portanto, há de haver alguma necessidade que as pessoas não estão a encontrar nos telemóveis e que este mundo fechado em casa não está a satisfazer.”

O assassinato do duque de Ferragudo é investigado por uma equipa de polícias muito "profissionais"
Cândida Castro

Ao Expresso, os três atores destacam o carácter efémero do teatro enquanto fator que o distingue de outras áreas como a televisão ou o cinema. “O teatro tem uma magia. Podes estar assistir a uma peça de teatro em que o que estás a ver hoje, amanhã pode ser totalmente diferente, com uma energia diferente e um público diferente”, diz António. O teatro representa assim uma arte em que a reação instantânea do público é o combustível que faz mover os próprios atores e o desenrolar da peça.

“A relação aqui é feita a dois. Não existe teatro se não houver público. É um dar e receber. Ali em cima [palco] dependemos do que o público nos está a dar".

Ricardo Barbosa na peça "Não Fui Eu!" de João Ascenso
Cândida Castro

Ainda sem data prevista para a estreia, os atores da associação Meia Palavra Basta dizem já estar a preparar um próximo projeto para “depois do verão”, no Teatro Turim. Para além do teatro, António Camelier, Francisco Beatriz e Ricardo Barbosa têm outros projetos futuros na área do cinema e da televisão.

No entanto, num país em que "os artistas não têm nem sequer 1% de influência" (como afirma uma das personagens da peça), é difícil para os atores fazerem uma previsão do seu futuro profissional. António fala da importância de se ter um “plano B fora da representação”, uma profissão em que considera ser necessário ter uma grande capacidade de resiliência e persistência.

“Quando o problema é estrutural, numa sociedade que não vê a cultura como algo importante para o desenvolvimento de um país, nós enquanto atores temos que “nos saber virar”, reforça. "A meritocracia nesta profissão não é um argumento única e exclusivamente válido para teres trabalho.”

Depois da passagem pelo Teatro Turim que termina a 31 de março, o próximo passo da associação Meia Palavra Basta - fundada por Francisco Beatriz, Margarida Moreira e Ricardo Barbosa - é levar a peça para outros palcos do país.“A magia do teatro também é esta. A peça pode acontecer em vários sítios diferentes e este espetáculo foi feito e pensado para não ficar só aqui [no teatro Turim]", conta Ricardo.

Artigo de Mariana Jerónimo, editado por Pedro Miguel Coelho

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: clubeexpresso@expresso.impresa.pt

Comentários
Já é Subscritor?
Comprou o Expresso?Insira o código presente na Revista E para se juntar ao debate