A Polícia de Segurança Pública (PSP) recebeu 2019 denúncias por violência no namoro no ano passado. O número revelado ao Expresso dá conta de uma diminuição das queixas apresentadas, quer comparativamente a 2020 (2051) e 2021 (2215), quer também relativamente aos anos pré-pandemia (2185 queixas em 2019). É preciso recuar a 2018 para encontrar um número mais baixo (1920).
A tendência de redução mantém-se também entre os mais jovens. Também entre a faixa etária compreendida, entre os 13 e 25 anos, a diminuição é notada: 500 denúncias no ano passado (dados ainda provisórios). “Estamos em crer que para este decréscimo contribui também o trabalho de proatividade da PSP, nomeadamente através das ações de sensibilização junto da comunidade escolar”, refere fonte daquela força de segurança que vinca que a diminuição das queixas “é muito relevante. Nestas ações abordamos os tipos mais comuns de violência, desde a física, passando pela restrição ou proibição de contactos com outras pessoas do círculo de amigos da pessoa violentada, restrições à forma de vestir ou de conviver, etc.”.
Nos últimos cinco anos, entre os mais jovens, a PSP recebeu mais de 3 mil denúncias, sendo 2019 (845) o período com mais queixas. Em 2018 foram 703, em 2020 o registo foi de 688 e em 2021 de 733. “As vítimas, ou qualquer outra pessoa que seja testemunha, devem apresentar queixa nas esquadras ou procurar ajuda junto das equipas da Escola Segura ou das equipas de Proteção e Apoio à Vítima”, apela a PSP.
No âmbito do programa Escola Segura, no último ano letivo, a PSP fez 1297 ações de sensibilização relacionadas com a temática da violência no namoro e que contaram com a participação de 24 mil alunos.
Para a Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV) é essencial vincar que, tal como na violência doméstica, nestes casos há uma “cifra negra” que pode esconder uma realidade mais preocupante do que aquela que o número de denúncias revela. “Não podemos dizer face ao decréscimo de denúncias que há uma diminuição do tipo de crime”, diz Daniel Cotrim, psicólogo e o responsável pela área de violência doméstica e de género da APAV. “Acreditamos que o número negro pode ser mais elevado. Por outro lado, haver uma diminuição do número de denúncias é importante porque significa que as campanhas de prevenção e sensibilização estão a surtir efeito.”
"Nestas ações abordamos os tipos mais comuns de violência, desde a física, passando pela restrição ou proibição de contactos com outras pessoas do círculo de amigos da pessoa violentada, restrições à forma de vestir ou de conviver, etc.”.
Ciúme, pressão, ameaças, sexo
O fenómeno da violência no namoro, diz ainda o psicólogo, imita muitas vezes o da violência doméstica. Também aqui o controlo constante da vítima por parte do agressor dificulta a denúncia. “Há muitas jovens que nem dizem aos pais que namoram, quanto mais denunciar. Isto é mais uma barreira”, aponta Cotrim. “No século XXI continuamos a ouvir raparigas de 12, 13, 14 ou 15 anos a dizerem que os pais não as deixam namorar e, se souberem, ficam de castigo. Esta desigualdade e discurso patriarcal continua muito vincado nesta forma de violência. Temos de envolver as famílias e as comunidades nestes processos”, defende.
As vítimas são maioritariamente do género feminino e “raramente” são as próprias a pedir ajuda. À APAV os casos chegam por via de professores que se apercebem das relações violentas ou porque a vítima confidenciou.
O controlo é das formas mais comuns de agressão às vítimas de violência no namoro. “O controlo das redes sociais, na forma de vestir, nas amizades, com quem se pode falar. Depois há o ciúme, tolerado como uma manifestação romântica”, diz Cotrim. “No campo da violência sexual há a pressão para ter relações, forçar a vítima com a ameaça de, se não fizer, vai ser contado na escola e aos amigos”, continua. Há ainda a violência na internet. “Quando querem terminar, ameaçam divulgar fotos e conversas íntimas.”
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